PUBLICADO EM 10 de mar de 2025

EUA: Pessoas trans lideram a própria defesa

Descubra como a comunidade trans se uniu em Nova York para protestar contra decisões que afetam os direitos das pessoas trans.

Manifestação pelos direitos trans em Nova York. Foto: People´s World

Manifestação pelos direitos trans em Nova York. Foto: People´s World

Por Olivia Conway 

“A ideia de que a NYU [Universidade de Nova Iorque] retiraria esse atendimento que salva vidas por causa de intimidações é inimaginável”, disse um indignado manifestante ao People’s World, enquanto uma multidão de quase 1.500 pessoas se reunia no frio na noite de 3 de fevereiro de 2025. Massas de pessoas trans, queer e seus aliados se juntaram para protestar contra a decisão do NYU Langone Health, um sistema de saúde acadêmico integrado, de cancelar consultas para seus pacientes trans com menos de dezenove anos, poucos dias após o segundo governo Trump emitir mais uma ordem executiva anti-trans em 28 de janeiro de 2025, intitulada “Protegendo Crianças da Mutilação Química e Cirúrgica”.

Algumas centenas de quilômetros dali, poucos dias antes, manifestantes se reuniram em frente ao UVa Medical Center, em Charlottesville, Virgínia, e ao Children’s National Hospital, em Washington, D.C., destacando as consequências de vida ou morte das decisões desses hospitais de interromper o atendimento de afirmação de gênero para jovens trans.

Manifestantes em D.C. protestaram na calçada em frente ao Children’s National, entoando frases como “Protejam os jovens trans” e “Doutores, doutores, tenham coragem; a vida das crianças trans está em jogo”.

Palestrantes denunciaram a covardia do conselho do hospital ao cumprir antecipadamente uma ordem executiva ilegal. Outros compararam as condições políticas em desenvolvimento e a conformidade do hospital com os estágios iniciais de um genocídio.

Uma, entre várias ordens

Essa Ordem Executiva foi uma de uma série de medidas do governo Trump para restringir as liberdades das pessoas trans e erradicar a chamada “ideologia de gênero”, que a nova administração deixou claro ser uma de suas prioridades. O documento apresenta várias diretrizes e reverte políticas da era Biden relacionadas às liberdades civis das pessoas trans.

A ordem começa tentando redefinir legalmente crianças como “indivíduos com menos de 19 anos [sic] de idade”. Em seguida, rotula o tratamento da disforia de gênero em crianças e adultos dessa faixa etária como “mutilação química e cirúrgica” e classifica as diretrizes da Associação Profissional Mundial para a Saúde Transgênero (WPATH, na sigla em inglês), principal organização mundial de pesquisa, assistência e defesa dos direitos trans, como “pseudociência”, determinando que o Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos EUA (HHS) passe a ignorá-las.

A medida deixa claro para hospitais e prestadores de serviços de saúde: cessem todo atendimento a pacientes trans menores de dezenove anos ou perderão financiamento federal. Diante dessa ameaça ilegal, vários hospitais e clínicas começaram a ceder.

Em 28 de janeiro, o Denver Health anunciou que obedeceria. Em 30 de janeiro, correspondentes do People’s World receberam relatos de que a NYU Langone estava cancelando consultas para jovens trans, mas não conseguiram obter um comentário da instituição. O Mt. Sinai Hospital, em Nova York, e o VCU Hospital, em Richmond, também seguiram a ordem ilegal do governo Trump. Em 3 de fevereiro, Trump publicou um “boletim informativo” listando hospitais adicionais em Illinois e Pensilvânia que estavam colaborando com seus objetivos de restringir o atendimento a jovens trans.

A resposta da comunidade trans

Diante desses ataques, pessoas trans e seus aliados reagiram. Caelyn, um homem trans, contou ao People’s World sua motivação para protestar contra a decisão da NYU:

“Eu nunca tinha ouvido falar sobre pessoas trans na minha infância… Aos 14 anos, lembro de desejar ter câncer de mama só para poder remover meus seios, porque não sabia que existiam outras opções… Não quero que mais crianças trans sofram como eu sofri. Não quero que crianças pensem que estão loucas, e parte disso é não legislar contra a possibilidade de crianças se identificarem como trans… acho que as pessoas trans são um alvo fácil. Os fascistas sempre começam com os alvos mais fáceis. Eles estão vindo atrás das pessoas trans… imigrantes, pessoas negras e pardas, porque são alvos fáceis e há comunidades que outras pessoas não necessariamente vão defender.”

Alguns participantes do protesto em frente à NYU Langone criticaram a ineficácia dos democratas diante da situação política. Naomi, moradora de Park Slope, disse:

“É chocante o quão pouco ouvimos dos democratas enquanto um golpe acontece diante de nossos olhos… Acho isso horrível e assustador… Os democratas estão agindo como se estivéssemos em tempos normais. Não estamos. Estamos vendo um golpe acontecer, e eles continuam seguindo regras parlamentares como se isso estivesse funcionando.”

Procuradores-gerais de quatorze estados, incluindo Nova York e Colorado, emitiram uma declaração afirmando que “continuarão a fazer valer as leis estaduais que garantem acesso ao atendimento de afirmação de gênero, nos estados onde essa autoridade existe, e desafiarão qualquer esforço ilegal do governo Trump para restringir esse acesso em nossas jurisdições”. Essa declaração foi feita em meio a relatos de que mais hospitais estão cedendo à pressão do governo federal.

Enquanto isso, pessoas trans seguem na linha de frente dessa luta contra tentativas fascistas de restringir a autonomia corporal e o acesso à saúde. Em Washington, protestos pressionam o procurador-geral do distrito, Brian Schwalb, a se juntar à declaração dos outros procuradores-gerais estaduais.

Em Nova York, manifestações continuam pressionando sistemas de saúde que desrespeitam leis estaduais ao negar atendimento a pessoas trans. Relatos indicam que protestos de ativistas trans em hospitais de Washington e Michigan já conseguiram reverter algumas dessas decisões.

Está claro que as pessoas trans não recuarão sem lutar.

Olivia Conway escreve de Nova York.

Artigo traduzido do People´s World por Luciana Cristina Ruy

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