Criança ou adolescente sofre acidente de trabalho a cada três horas e quase 16 mil crianças e adolescentes brasileiros de até 18 anos se acidentaram enquanto trabalhavam entre 2012 e 2017, segundo dados do Observatório Digital de Saúde e Segurança do Trabalho, do MPT (Ministério Público do Trabalho) e da OIT (Organização Internacional do Trabalho).
Em outras palavras, a cada três horas e meia uma criança ou adolescente foi vítima de acidente de trabalho no Brasil.
O MPT destaca que se trata de uma exploração que deixa sequelas e também mata.
“Temos que trabalhar a prevenção porque lugar de criança é na escola e não no trabalho”, diz Neuza Barbosa de Lima, secretária nacional da Criança e do Adolescente da Força, ao observar que hoje é 12 de Junho, Dia Mundial de Combate ao TRabalho Infantil.
Levantamento do órgão aponta que 187 crianças e adolescentes morreram em decorrência do trabalho entre 2007 e 2015 –dado mais recente disponível–, segundo o Sinan (Sistema de Informação de Agravos de Notificação), do Ministério da Saúde. No mesmo período, 518 perderam uma das mãos.
Os números embasam campanhas de erradicação iniciadas pelo MPT, que neste ano destacou a Copa do Mundo, e que ganham força nesta terça-feira (12), quando se celebra o Dia de Combate ao Trabalho Infantil. Os dados podem conter subnotificação, uma vez que nem todas as ocorrências são registradas.
“Só se toma conhecimento disso no infortúnio, quando o caso chega ao hospital. Os dados são alarmantes, mas são subnotificados. Imagine a realidade”, afirma Raulino Maracajá, procurador do trabalho de Campina Grande (PB), onde a mensagem escolhida para a campanha foi a de que, “quando a infância é perdida, não tem jogo ganho”.
Desde 2013, o órgão concentra esforços de combate durante o São João de Campina Grande, uma das maiores festas juninas do país. Neste ano, o evento coincide com a Copa, redobrando a atenção da fiscalização, em que participam Ministério do Trabalho, polícia e secretarias de assistência social, saúde e educação.
“Grandes aglomerações de pessoas fazem com que as famílias busquem uma espécie de ’13º’. As crianças pedem dinheiro, limpam para-brisas, vendem coisas. O aumento é assustador nessa época”, afirma Maracajá.
Aglomerações também propiciam casos de exploração sexual, quando uma quantidade grande de homens se reúnem em bares para assistir aos jogos, alerta Henriqueta Cavalcante, coordenadora da Comissão de Justiça e Paz da CNBB e uma das lideranças no combate à exploração de crianças no Norte do país.
“O agravante que precisa ser considerado pelos governos omissos é a miséria que deixa crianças vulneráveis à exploração sexual. Essa é uma forma de trabalho infantil que escapa das estatísticas porque é um crime cometido na sombra”, afirma Cavalcante.
A exploração tende a se aprofundar em momentos de crise econômica, quando a produção da criança passa a ser vista como alternativa de renda em atividades como o comércio ambulante nas ruas, segundo Mayra Palópoli, especialista em direito do trabalho, sócia do Palópoli e Albrecht Advogados.
Em 2016, o trabalho infantil irregular atingiu 1,8 milhão de crianças e adolescentes no país, sendo 998 mil em situação irregular, segundo a Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua), divulgada em novembro pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
A pesquisa não tem histórico para comparações porque foi a primeira vez que a Pnad Contínua divulgou o módulo de trabalho infantil após o IBGE alterar o levantamento das informações.
O estudo não capta explorações como prostituição infantil ou tráfico de drogas.
Pela lei brasileira, a idade mínima para entrar no mercado de trabalho é 16 anos. Antes disso, com 14 ou 15 anos, é permitida a condição de aprendiz. Com 16 ou 17, o adolescente pode trabalhar desde que esteja registrado e não seja exposto a abusos físicos, psicológicos e sexuais.
A lei não permite que menores de 18 anos exerçam atividades com equipamentos perigosos ou em meio insalubre.
Qualquer forma de trabalho realizado entre 5 e 13 anos é irregular e deve ser abolida, segundo a legislação.
Segundo Flavia Vinhaes, economista do IBGE responsável pela pesquisa, as atividades exercidas por essa faixa etária têm características muito diferentes das praticadas por jovens entre 14 e 17 anos.
Entre os pequenos de até 13 anos, quase 50% estão na agricultura. A maior parte deles ajuda membros da casa no trabalho produtivo e não recebe remuneração. O maiores de 13 anos atuam mais em atividades como comércio e serviço, segundo Vinhaes.
Para Denise Cesario, gerente-executiva da Fundação Abrinq, existe no Brasil uma cultura de que trabalhar não prejudica o desenvolvimento das crianças, e essa mentalidade atrasa o combate.
“O trabalho infantil atrapalha a escolaridade e o desenvolvimento físico. Pode trazer danos morais às crianças, que não são maduras o suficiente para lidar com certas situações e pode afastá-las dos estudos”, afirma Vinhaes.
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