“O Itamaraty acabou de emitir uma nota reconhecendo Juan Guaidó como presidente da Venezuela, e o Brasil, juntamente com os demais países do Grupo de Lima, que estão reconhecendo um a um esse fato, nós daremos todo o apoio político necessário para que esse processo siga seu destino”, disse o presidente Jair Bolsonaro em Davos, na Suíça.
A decisão de passar a tratar o presidente da Assembleia Nacional da Venezuela como líder interino do país em substituição a Nicolás Maduro, no poder desde a morte de Hugo Chávez (1954-2013), foi tomada em uma reunião que durou 90 minutos com os presidentes Iván Duque (Colômbia) e Lenín Moreno (Equador), a vice-presidente peruana, Mercedes Aráoz, e a ministra das Relações Exteriores do Canadá, Chrystia Freeland.
Também participaram do encontro às margens do Fórum Econômico Mundial em Davos, onde estão Bolsonaro e Duque, acadêmicos como o venezuelano Ricardo Hausmann, que leciona em Harvard e já defendeu em artigo a derrubada do regime, e Filippo Grandi, alto comissário da ONU para refugiados.
A reunião para tratar de Venezuela já estava marcada pelo menos desde o início da semana, mas os fatos acabaram se sobrepondo ao debate.
Pouco antes do encontro, Guaidó se colocou como presidente. Enquanto Bolsonaro, Duque e os demais alinhavavam uma posição conjunta, o americano Donald Trump declarou que os EUA reconheciam em Guaidó o presidente interino da Venezuela, dando início a um efeito dominó. Equador, Costa Rica, Argentina, Chile, Paraguai e Guatemala emitiram comunicados em seguida.
Dos 14 países que compõem o Grupo de Lima, criado para buscar uma solução para a crise venezuelana, apenas Guiana, Santa Lúcia e o México de Andrés Manuel López Obrador não apoiaram Guaidó. Bolívia, Cuba e Rússia reafirmaram seu apoio a Maduro.
Em nota em redes sociais emitida logo após sua declaração com Duque, Bolsonaro explicou que o Brasil dará apoio econômico e político ao processo de transição para que a democracia e a paz voltem à Venezuela.
O Grupo de Lima já havia declarado que não reconhecia o novo mandato de Maduro, iniciado no dia 10 e resultante de eleições sob suspeita de fraude em maio passado, das quais grande parte da oposição foi impedida de participar e que não teve monitoramento internacional.
Mas a solução para o dilema parecia pouco clara. Trump e membros do governo colombiano chegaram a aventar uma ação militar, descartada pelos demais países e pelos militares americanos.
A crise política, econômica e humanitária da Venezuela, agravada em 2017, já produziu um êxodo de mais de 3 milhões de pessoas que fugiram para países da região.
Com a decisão da Assembleia da Venezuela e de Guaidó, um deputado de 35 anos empossado no dia 11, de assumir interinamente o governo e convocar eleições, o roteiro da transição ficou mais claro.
O Brasil já ensaiava declarar seu apoio, mas aguardou os protestos de rua nesta quarta na Venezuela para calibrar sua decisão. Um membro do governo Bolsonaro, em conversa com a reportagem, ressaltou que Brasília se preocupava em encontrar uma saída institucional para o dilema, e que o presidente já debatera a questão com o homólogo argentino Mauricio Macri.
O presidente interino, general Hamilton Mourão, descartou a possibilidade de o Brasil participar de uma intervenção armada no país vizinho.
“O Brasil não participa de intervenção. Não é da nossa política externa intervir nos assuntos internos dos outros países”, disse nesta quarta.
Apesar do caminho institucional escolhido, porém, a via pacífica ainda não está garantida. Trump declarou que usará “todo o peso do poder econômico e diplomático dos EUA para pressionar pelo restabelecimento da democracia venezuelana” e não descartou novas ações contra o regime. “Todas as opções estão na mesa”, voltou a dizer.
A prevalência de Maduro depende sobretudo da posição dos militares venezuelanos, que até então vinham se mantendo como fiadores do regime mas que já começavam a dar sinais de rachaduras em suas fileiras.
Fonte: Folha SP