PUBLICADO EM 02 de jan de 2021
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2021: se ligue, ainda estamos na pandemia e sob Bolsonaro

O ano acabou, mas a única coisa que mudou de fato foi o ano. O resto, bem, o resto continua o mesmo — pandemia, mortes, sem vacina, com Bolsonaro fingindo que dirige o País. É bom não confundir senso de realidade com outros sentimentos ou percepções. Bem-vindo a 2021!

Vencemos o trágico ano pandêmico de 2020. Estamos vivos! Mas, por qualquer ângulo que se queira enxergar o ano que finda, foi trágico. O ano acabou — foi muito rápido — e começa um novo, mas isso não quer dizer que vai tudo melhorar. Não vai. Isso nada tem a ver com pessimismo ou otimismo. É apenas senso de realidade. Ou para ironizar, é como se estivéssemos acordado em “32 de dezembro de 2020”. Ou ainda uma espécie de “2020, o ano que não acabou”.

Pandemia, mortes, agravamento da crise econômica, desemprego crescente, governo Bolsonaro e eleições 2022. Vamos analisar brevemente cada 1 destes tópicos para tentar entender que este novo ano que começa vai ser muito duro. Não cabem festas. Mas também não precisa de tristezas. Apenas sejamos céticos; duvidemos. Essa “alegria” da passagem é falsa!

Era para o País estar de luto, em razão das quase 200 mil mortes por Covid-19. Mas a impressão é que a média do Brasil “descaralhou”, para usar expressão de um velho amigo baiano de Irará, já falecido. Não se trata de estimular a tristeza, mas a reflexão e a introspecção para um salto seguro adiante.

Esse “descaralhamento” parece loucura de quem não quer encarar ou enfrentar de frente a realidade. Uma espécie de transe estimulado ou induzido. E aqui entre nós, sob transe não se vai longe!

Pandemia e mortes
Já são quase 200 mil mortes e milhões de infectados. O Brasil é o segundo no ranking, só perdemos para os EEUU. Isso não é coincidência, afinal lá como aqui, o chamado negacionismo tomou conta. Essa atitude de Bolsonaro nada tem de loucura ou alienação. É algo calculado. Trata-se, pois, de um governo perdido em meio às “loucuras” de um sociopata. Assim, precisa de muitas “cortinas de fumaça” — quase que diariamente — para ir tocando um governo cujo leme está quebrado.

Ao invés de liderar o País no caminho da superação da pandemia, com testagem em massa, compra de vacinas e todo o planejamento em torno da vacinação em massa dos brasileiros, o presidente perde tempo tentando impor sua pauta de “costumes”. Não é surrealismo. É um projeto, se colar, colou!

Cuidemos, pois antes do início do 2º conflito mundial houve uma sucessão de crises, que começou com os acordos erráticos para o termino do 1º (1918)1, seguido pela pandemia da Gripe Espanhola (1918-1923), a crise de 1929 (depressão econômica) e as ascensões do nazismo (1929-1933) e de Hitler (1933). Tudo isso desaguou na 2ª Guerra Mundial (1939-1945).

Profunda crise econômica
Essa crise — agravada pela pandemia — deriva de vários fatores. Passa pela política e o fim do ciclo de alta dos preços das commodities no mercado externo, que afetou as exportações brasileiras e diminuiu a entrada de capital estrangeiro no País. Não se pode esquecer, ainda, que em 2019, portanto antes da pandemia, o País cresceu apenas 1%. Ou seja, o Brasil já estava em crise econômica antes da Covid-19.

A variação do PIB (Produto Interno Bruto) foi decrescendo, com oscilações, depois da Era Lula, que fechou 2010, com 7,5%. Sob Dilma 1: 2011 (4%), 2012 (1,9%), 2013 (3,0%) e 2014 (0,5%). Sob Dilma 2**: 2015 (-3,5%) e 2016 (-3,3%). Sob Temer: 2017 (1,3%) e 2018 (1,8%). Sob Bolsonaro: 2019 (1,1%)2.

O FMI, por exemplo, agora prevê queda de 5,8% em 2020, frente aos 9,1% antecipados no relatório anterior, de julho3. Por outro lado, a recuperação deverá ser mais lenta que o esperado. Para 2021, a projeção agora é de avanço de 2,8% no PIB brasileiro, frente aos 3,6% anteriores. Mas, sob Bolsonaro/Guedes não dá para essa projeção a sério.

Desemprego crescente
Sobre desemprego, informalidade e desalento tomo emprestado os dados veiculados pela revista eletrônica Rede Brasil Atual4.

“São 14,1 milhões de pessoas que estiveram em busca de trabalho no 3º trimestre, informou o IBGE no período, segundo dados da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua Mensal).”

Junte-se aos desempregados, os que “estão fora do mercado de trabalho”, os desocupados. Essa massa de gente já chega a 79,141 milhões. Mais um recorde que agrava o problema do desemprego. Crescimento de 5,6% num trimestre (4,177 milhões) e de 21,9% (14,213 milhões) em 1 ano.

“Assim, o número de empregados com carteira assinada no setor privado (29,067 milhões) também foi o menor da série. A queda é de 6,5% em relação ao trimestre anterior (menos 2,036 milhões de pessoas) e de 12% (menos 3,975 milhões) ante agosto de 2019.”

Informalidade e desalento
A informalidade também não escapou da crise que draga o País. Estimado em 8,755 milhões, os empregos sem carteira caíram 5% (menos 463 mil pessoas) no trimestre e 25,8% (menos 3,041 milhões) ante igual período do ano passado. E o total de trabalhadores, respectivamente, por conta própria (21,521 milhões) caiu 4% (menos 894 mil) e -11,4% (2,773 milhões). Além disso, o número de trabalhadores domésticos (4,597 milhões) também chegou ao menor nível. Caiu, em 12 meses, 27,5% (menos 1,745 milhão).

Outro recorde está no contingente de desalentados, pessoas que desistiram de procurar trabalho. Esses agora somam 5,9 milhões. Crescimento de 8,1% em 3 meses (440 mil) e de 24,2% em 12 meses (1,1 milhão). Em relação à força de trabalho, os desalentados representam 5,8% — mais um recorde. Estes números todos vão aumentar entre janeiro e fevereiro. E mostram, portanto, que o governo precisa mudar a orientação econômica, pois o neoliberalismo só tem agravado esse quadro.

Governo Bolsonaro e eleições 2022
Diante do quadro econômico descrito acima, o que fez o governo? Diminuiu pela metade o auxílio emergencial, que caiu de R$ 600 para R$ 300. E agora no início do ano encerra o repasse. O que vai acontecer com as famílias que estão sobrevivendo exclusivamente com essa ajuda?

Vai ser o caos! Vai ser uma tragédia social!

Trata-se de governo com visão social distorcida e rarefeita da realidade, guiado por projeto econômico trágico que infelicita a maioria do povo.

Pelas pesquisas mais recentes indica-se que se a eleição fosse hoje, Bolsonaro seria reeleito5. Seria? Ainda bem que não é. Talvez esse dado explique o transe que ora vive a sociedade brasileira.

Bolsonaro (sem partido), Doria (PSDB) e Huck (sem partido). Lula (PT) (ainda inelegível), Ciro (PDT), Dino (PCdoB) e Boulos (PSol). Nomes, à direita e à esquerda, não faltam. Faltam projetos. Qual o projeto? Qual a novidade?

A esquerda não o tem ainda. A única novidade na cena política nacional pós-2018, até o momento, é o livro de Ciro Gomes — Projeto Nacional: o dever da esperança6, que recomendo a leitura. Nesse, o pedetista abre-o assim na introdução: “Este livro é um apelo ao debate racional a respeito da questão nacional. Um debate verdadeiro sustentado em dados e ideias sobre nossos problemas e possibilidade, um diálogo entre cidadãos e cidadãs que querem o bem do Brasil, que têm opiniões distintas sobre seus rumos, problemas e projetos.”

Mais que nomes, o debate político-eleitoral precisa girar em torno de projetos. O da direita já é conhecido e está em curso. Trata-se do projeto neoliberal, com privatizações e “reformas” do tipo da Trabalhista e previdenciária. Os resultados estão todos à vista. A Reforma Trabalhista7 completou em novembro 3 anos. Por que ninguém comemorou?8

A previdenciária9, reduziu aposentadorias, pensões e outros benefícios. As regras para percepção dos benefícios previdenciários pós-“reforma” são draconianas. Aposentar-se depois da EC 103 não será fácil.

A Reforma Administrativa (PEC 32/20) — ainda em discussão no Congresso — está para o setor público o que a Trabalhista10 foi e está para o setor privado. Em nada vai melhorar a prestação dos serviços públicos, ao contrário. Se for levada a cabo vai reduzir o tamanho e o papel do Estado brasileiro, com precarização de serviços e servidores.

Infelizmente, como se vê, a passagem de ano por si não mudou nada. Ainda estamos sob Bolsonaro e a pandemia, cujos números crescem. E o governo nada de concreto apresenta para tranquilizar a população. Ainda não temos vacinas, faltam seringas e agulhas. Bem-vindo a 2021.

Marcos Verlaine,  jornalista, analista político e assessor parlamentar licenciado do Diap

(*) A bem da verdade, o 2º mandato de Dilma não ocorreu de fato. A gestão foi bloqueada pelo mercado, que lhe impôs uma pauta que não foi a vencedora no pleito. Sem falar nas “pautas bombas” que pululavam na Câmara, sob a gestão do então presidente Eduardo Cunha (MDB-RJ). No livro O lulismo em crise – um quebra-cabeça do período Dilma (2011-2016), de André Singer, isso fica bem claro.

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