PUBLICADO EM 26 de jun de 2022
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O enclave ideológico da extrema direita no Estado ou a nova direita brasileira

                                                                       

 Decorrente de motivos variados, nas últimas décadas ocorreu no Brasil um ressurgimento de ideários de direita, autodenominado de “liberalismo conservador”, que empolga segmentos de classe média, setores do empresariado e com repercussões importantes no estamento militar. No que se refere à sociedade civil é frágil, ou mesmo escassa, a produção intelectual/acadêmica mais aprofundada ou relevante sobre o tema, por outro lado, no setor militar tem sido importante as discussões e publicações na linha do liberalismo conservador, o que traz à baila uma tradição dos militares brasileiros de envolvimento na política no sentido mais amplo do termo. São exemplos, o Instituto Sagres, Instituto Villas Boas e Instituto Federalista.

O período mais recente da vida política brasileira se caracteriza por confluências reacionárias que possuem distintos vetores. No plano nacional, há uma continuidade surpreendente do pensamento político autoritário em uma das instituições mais antigas do Estado brasileiro, as Forças Armadas e o exército em particular. Diferentemente dos nossos países vizinhos na América do Sul que atravessaram regimes ditatoriais, o Brasil não teve uma justiça de transição entre o final da ditadura militar e o regime democrático. A canhestra ‘Anistia ampla, geral e irrestrita’ gestada ainda na ditadura civil e militar neutralizou quaisquer tentativas de apuração e punição dos crimes do terrorismo de Estado, bem como não permitiu qualquer esforço sistemático de mudança doutrinária no exército brasileiro.

Apesar de esforços mais recentes das últimas décadas com os governos de Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma, a doutrina militar da época da guerra fria com seus fundamentos ideológicos expressos na guerra contra o comunismo permaneceu praticamente inalterada. Um visitante mais observador do Forte de Copacabana no Rio de Janeiro verá que o período da ditadura militar não é problematizado em espaço dedicado aos presidentes entre 1964 e 1984. Mesmo os presidentes associados com os momentos mais duros da ditadura militar como Costa e Silva e Garrastazu Médici são tratados como competentes e honrados chefes de Estado. É como se, na vizinha Argentina, os generais da junta militar Galtieri, Videla e Massera fossem ainda ovacionados em espaço público e turístico sob a manutenção do exército argentino.

A ausência de uma justiça de transição e de um esforço sistemático das Forças Armadas do Estado brasileiro no reconhecimento e elaboração crítica do período da ditadura militar não apenas permitiu a reprodução social do pensamento autoritário em símbolos, homenagens, rituais internos, mas também um estranho e perturbador revisionismo histórico do que foi e do que significou a ditadura militar para a sociedade e nação brasileiras.

No plano internacional, há uma ascensão da extrema direita muito bem capturada no trabalho de Norris e Inglehart (2019) sobre a teoria do ‘rebote’ (backlash). Após décadas de uma revolução silenciosa nos valores sociais resultante da prolongada experiência de bem-estar social com aumento da renda e maior igualdade social, há uma reação conservadora aos chamados valores de auto-expressão. Inglehart (2005) define os valores de auto-expressão como crenças típicas das sociedades pós-industriais, com maior ênfase no respeito ao meio ambiente, à diversidade étnica, cultural e sexual. São valores que estão fortemente correlacionados com outros indicadores de desenvolvimento sócio-econômico como o Índice de Desenvolvimento Humano, maior igualdade medida pelo coeficiente Gini, maior PIB per capita entre outros.

A reação conservadora mistura o desencanto com a democracia liberal fortemente associada com o neoliberalismo e a globalização com seus efeitos negativos sobre as classes médias trabalhadores dos países desenvolvidos e a perda relativa de status e prestígio dos grupos sociais historicamente integrados na sociedade de classes frente a uma maior diversidade étnica, cultural e sexual e a uma maior presença das mulheres no mercado de trabalho e em outras esferas da vida social.

Mesmo em um contexto de brutal desigualdade e de profunda discriminação racial no Brasil, as parcas conquistas das classes trabalhadoras ao longo dos últimos vinte anos com a valorização real do salário mínimo, a democratização do acesso às universidades públicas e privadas (REUNI e PROUNI) e a expansão do consumo de bens e serviços antes restritos às classes médias foram capazes de produzir um ‘rebote’ das classes médias tradicionais. Elas desenvolveram então uma percepção de perda de status frente a outros grupos sociais, tornando-se solo fértil para as ideias de extrema direita.

Desde 2013, houve uma expansão na atuação dos Think Tanks de direita e extrema direita. Surge também um fenômeno novo no período histórico recente. A direita se organiza de forma militante com ações de mobilização de massas mais intensas do que as tradicionais mobilizações de centrais sindicais, partidos de esquerda e movimentos sociais. De forma bastante contemporânea, as forças de direita constroem uma forte capacidade de atuação em redes sociais, grupos informais, institutos, movimentos suprapartidários, fundações, e várias iniciativas de mobilização social e formação política. Trata-se de um contexto que permite o despertar de ideias e valores que estavam em hibernação. No caso das Forças Armadas e de outras instituições do Estado brasileiro, são valores e ideias de uma herança autoritária que nunca foi passada a limpo.

A reprodução social do pensamento de direita no Brasil constitui um enclave no Estado brasileiro em que pese a moderna e social-democrata constituição de 1988 e o avigoramento dos movimentos sociais e sindicais depois do fim do regime militar. Embora a ascensão da extrema direita em nível internacional corrobora para a difusão e legitimação do pensamento de direito no país, a continuidade de valores autoritários encrustados nas instituições políticas é ainda mais forte.

Desde a Proclamação da República, passando pelo Tenentismo, a Revolução de 1930 e o governo militar pós-1964, a influência militar foi decisiva na vida do país. Após a II Guerra Mundial, no contexto da Guerra Fria, o país ficou alinhado aos EUA, no período o anticomunismo foi predominante nas Forças Armadas. Ressalte-se que esses períodos não foram homogêneos ocorrendo ênfases diversificadas em premissas sobre a gestão economia, é o caso do “nacional desenvolvimentismo” no governo do General Geisel.

A publicação do Instituto Sagres “Projeto de Nação: o Brasil em 2035”, é uma proposta para construir um cenário para o Brasil no ano referido. A publicação é coordenada por general da reserva (R1) e se constitui em um texto que discorre sobre ideias e propostas para o país focando em período de 13 anos o que possibilita aos autores desenvolverem suas perspectivas político-ideológicas (Sagres, 2021). Ao construir um cenário de futuro projeta-se no mesmo invariavelmente as concepções do presente, coloca-se no futuro as expectativas, interesses, desejos e temores do presente. Nesse sentido as ideias sobre o futuro são legitimadas por uma retórica argumentativa para dar foros de credibilidade, o futuro representa uma ideologia do presente.

Com um verniz de modernização gerencial e aparente sintonia com os novos tempos, é marcante observar o anacronismo do documento ‘Projeto de Nação’. É como se estivéssemos diante de ideias renitentes que só sobrevivem porque encontram forças sociais e materiais dispostas a leva-las adiante. O documento traz a embolorada noção de civismo dos materiais da Educação Moral e Cívica dos anos de 1960 e 1970. A ideia de nação segue sendo a simplificação homogênea de massas amorfas e indiferenciadas. Ou seja, uma nação sem rosto, sem capacidade de agir coletivamente, sem as suas organizações sociais, especialmente os sindicatos e os movimentos sociais. Surpreende que, no início do século XXI, com os enormes avanços na produção de conhecimento social, político sobre a realidade brasileira, o ‘Projeto de Nação’ revela uma indiferença no reconhecimento de problemas centrais da sociedade brasileira como os problemas raciais, a desigualdade em suas várias dimensões, a extrema pobreza e outras questões relacionadas à desigualdade de gênero e aos problemas já bem conhecidos dos grupos sociais vulneráveis.

O documento ignora a existência dos sindicatos, dos movimentos sociais e da sociedade civil organizada. Ele reforça questões já bastante superadas pelas ciências sociais e econômicas como o caso da clivagem entre crescimento econômico e desenvolvimento social. A nação ao qual o documento faz referência é uma caricatura e uma abstração. Nisso, vale lembrar o instigante livro de Bendix (1969) sobre a construção da nação.  A nação não se reduz ao território, ao Estado e às suas elites. A constituição do moderno Estado nação é a fonte dos direitos da cidadania, a política torna-se nacional e as classes mais baixas possuem agora uma oportunidade de participação ativa (Bendix, 1969). É no contexto da nação que surgem as contradições entre a igualdade legal formal e a desigualdade econômica e substantiva. Essa contradição constitui o motor da extensão dos direitos sociais e econômicos para o conjunto da comunidade diversa que constitui a nação.

Os militares brasileiros não entenderam o sentido de nação e o confundem com território e Estado. As experiências autoritárias modernizadoras do Leste Asiático (Taiwan, Singapura e Coréia do Sul) tiveram clareza do sentido de nação. Estas experiências fizeram uma reforma agrária para apoiar o desenvolvimento industrial e ajudar na integração social. Elas também reduziram desigualdade social com aumento de escolaridade, produtividade e consequente aumento da massa salarial.  O líder militar Park Chung Hee da Coréia do Sul sempre associava nação com a integração de todos e elevação do bem-estar social.

O excesso de clivagens e precária coesão social da sociedade brasileira foi aprofundado durante a ditadura militar. Como lembra Kersting (2011), as clivagens tornam difícil a construção de uma nação e pode até mesmo destruir o contrato social entre os cidadãos e o Estado. Nação supõe atores soberanos como expressão de poder coletivo. A nação requer legitimidade da sociedade com seus atores e organizações próprias separadas do Estado e das elites. Uma dominação essencialmente baseada na coerção para controle das contradições sociais carece da legitimidade de nação.

Ainda educados e formados na doutrina da segurança nacional, do inimigo interno e da ameaça comunista, muitos militares reforçam a ideia de interesse nacional com uma posição que coloca o Brasil alinhado automaticamente com os EUA e contrários a países que perseguem uma ordem global multipolar.

O período do regime militar caracterizado por uma relativa autonomia frente às orientações e política externa norte-americana ocorreu em momentos desenvolvimentistas como a defesa das 200 milhas de território marítimo, a busca pela energia nuclear, a busca pela autonomia energética em combustíveis e a construção da indústria de bens de capital.

No plano geopolítico, o ‘Projeto de Nação’, coerente com a visão da extrema direita brasileira, ainda defende uma ideia de alinhamento com os EUA. Desde o fim do Governo Geisel (1974-1978), o pensamento econômico hegemônico no Exército e, em menor grau, na Aeronáutica e na Marinha é o do liberalismo econômico. Os think tanks vinculados a militares da ativa e da reserva e responsáveis pela elaboração do documento ‘Projeto de Nação’ deixam isso muito claro em vários trechos.

Tão ciosos de uma suposta ideologização da educação e da ‘ideologia’ das agendas dos valores de auto-expressão do século XXI, o pensamento de extrema direita dentro e fora das Forças Armadas trata a geopolítica como alinhamento ideológico e não como projeção e proteção dos interesses de um Brasil emergente e em desenvolvimento.

Um projeto de nação não é um receituário estático de mentes iluminadas empenhadas em elucubrações de engenharia social. Projeto de nação só tem sentido com a participação dos sindicatos, dos mais variados movimentos sociais, pois o ideal de nação é construído coletivamente. Neste sentido, o documento ‘Projeto de Nação’ carece do essencial; um entendimento do que é nação e da dimensão política e social do que se entende por projeto coletivo.

Em uma primeira análise de conteúdo do documento, ele chama atenção pela ausência de palavras chaves que expressam a realidade brasileira. O documento não faz menção a inclusão social, pobreza, desigualdade, problemas raciais, sindicatos. No plano dos problemas econômicos, não há uma menção ao processo de desindustrialização e como revertê-lo.

Consoante com a colonização da luta contra a corrupção pela extrema direita, a única menção objetiva a movimentos sociais no documento é o incentivo aos movimentos sociais de combate à corrupção.

A palavra ‘desigualdade’ aparece uma única vez no documento e ainda sim referida como desigualdade nacional. Da mesma forma, a expressão ‘desenvolvimento tecnológico’ aparece uma única vez como parte de uma consideração genérica relacionando com capital humano (‘buscando ampla atuação nos campos da ciência, do desenvolvimento tecnológico e da inovação’). As duas palavras mais frequentes no documento são ‘educação’ (58 referências) e ‘Estado’ (44 referências)

Nos trechos sobre educação, a fraseologia da extrema direita prevalece fortemente. Há excertos que se assemelham a um documento do ‘Escola Sem Partido’ como “uma parcela de nossas crianças e adolescentes sofria com a ideologização do sistema educacional, com a doutrinação facciosa efetuada por professores militantes de correntes ideológicas utópicas e radicais, com prejuízo da qualidade do ensino”.

Sem citar qualquer evidência empírica, até porque a tese da educação pública ideologizada pela esquerda não se sustenta em estudos empíricos, o documento menciona uma relação de causalidade entre ‘ideologização’ e má qualidade da educação básica aferida pelo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB). Mais adiante, o documento coloca como objetivo a coibição da pregação ideológica nos três níveis de ensino – fundamental, médio e superior.

Ainda sobre educação, o documento possui uma série de afirmações falaciosas que expressam um profundo desconhecimento da realidade educacional, especialmente do ensino superior público e privado. Um exemplo é o de que ‘a educação superior possui baixa qualidade de gestão’. Nenhuma evidência é apresentada e vale recordar que as universidades públicas brasileiras possuem várias métricas de desempenho, especialmente os seus cursos de pós-graduação.  Mais adiante, o documento chama atenção para a necessidade de uma gestão que valorize resultados. São frases genéricas que expressam o senso comum de quem desconhece a realidade da educação superior no Brasil. Ora, as universidades públicas possuem os seus planos de desenvolvimento institucional em geral acompanhados por indicadores de resultado e de gestão. O ensino superior possui vários problemas, mas estes passam ao largo do documento.

Requentando a experiência fracassada da educação moral e cívica do regime militar, o ‘Projeto de Nação’ associa uma ‘educação para a cidadania’ com a retomada da educação moral e cívica.

O documento fala em liberalismo econômico ‘em oposição ao coletivismo involuntário imposto pelo Estado’, o que já se sabe ser distinto do pensamento desenvolvimentista ainda vigente nos países que superaram a armadilha da renda média como Coréia do Sul, Taiwan e Singapura. Além disso, está ali a quimera do coletivismo imposto pelo Estado associado aos governos de centro-esquerda e de centro. Novamente, a surrada fraseologia anti-comunista totalmente fora do lugar.

Por outro lado, o documento possui uma contradição em termos quando quer juntar liberalismo econômico com regulação das relações de mercado e atuação do Estado em áreas estratégicas essenciais para a soberania nacional.

Curiosamente, o documento menciona processos que já ocorreram no Brasil desde os anos noventa como o caso da descentralização do Estado brasileiro empreendida pelo Governo Fernando Henrique Cardoso e, de certa forma, continuada pelos governos Lula e Dilma. Em relação às políticas sociais de combate à pobreza, também iniciadas nos anos noventa e continuadas nas primeiras décadas do século XXI, o documento repete o bordão ideológico da extrema direita “alto percentual de cidadãos dependentes do Estado para sua sobrevivência”. Novamente, revela-se a ignorância sobre a sociedade brasileira, seus problemas e o desconhecimento da vasta literatura nacional e internacional sobre as políticas sociais de erradicação da pobreza extrema.

No âmbito da gestão do Estado, o documento ignora as várias iniciativas de reformas administrativas, em especial a reforma gerencial conduzida pelo ex-ministro Bresser-Pereira, bem como outras iniciativas de fortalecimento das capacidades estatais. O desconhecimento do tema se traduz na repetição de platitudes sobre a gestão pública, caindo na armadilha acaciana de propor o óbvio sem explicar o como.

É feita uma crítica ao Estado patrimonialista e economicamente dirigista, mas sem problematizar a persistência do patrimonialismo que hoje se revela claramente nas prebendas recebidas pelos comandos das corporações militares e policiais.

Mesmo após o fracasso rotundo do modelo da operação Lava Jato, o ‘Projeto de Nação’ recomenda a ‘criação de Forças Tarefas especiais entre a Polícia Federal, a PGR e Judiciário Federal com foco em combate à corrupção de grande porte nos governos estaduais e municipais’. Essa diretriz do documento é bastante congruente com a instrumentalização política e ideológica do combate à corrupção pela extrema direita.

Na mélange ideológica do documento não faltam referência aos discursos ideológicos da extrema direita de outras partes do globo. O texto menciona o globalismo como uma das barreiras para a realização das aspirações nacionais.

O argumento genérico é que existe uma conspiração em nível mundial de uma elite ultracapitalista e seus aliados internos no país. Essa elite conta com apoio de órgãos internacionais, da grande mídia, de personagens do meio artístico-cultural, de meios intelectuais e acadêmicos, de sindicatos e movimentos sociais e de defensores de minorias e do meio ambiente. Seria uma conspiração concertada bancada por governos e pelo grande capital. O liberalismo conservador combateria o ultracapitalismo em nome da liberdade individual e das tradições conservadoras.

O globalismo é definido como movimento internacionalista cujo objetivo é determinar, dirigir e controlar as relações entre as nações e entre os próprios cidadãos, por meio de posições, atitudes, intervenções e imposições de caráter autoritário, porém disfarçados como socialmente corretos e necessá­rios. No centro desse movimento está a elite financeira mundial, ator não estatal constituído por megainvestidores, bancos, conglomerados transnacionais e outros representantes do ultracapitalismo, com extraordinários recursos financeiros e econômicos. (Sagres, 2021, p.9).

Associando globalismo com redução da soberania nacional, o texto afirma que:

“O argumento central do globalismo é que problemas cada vez mais complexos — como crises econômicas, proteção do meio ambiente e os direitos das minorias — requerem um processo centralizado de tomada de decisões, em nível mundial. Eventualmente e em casos específicos, essa elite tem se aliado a países centrais, organismos internacionais, or­ganizações não governamentais (ONGs) e governos nacionais de quaisquer ideologias, com vistas a projetar seus interesses em escala global. (Sagres, 2021, p.10).

Em consonância com a teoria do ‘rebote’ (backlash), o globalismo é claramente associado aos valores de auto-expressão mencionados por Inglehart e a crítica a ele como ponto chave da reação conservadora.

“No Brasil, atualmente, é visível a união de esforços entre determinadas entidades nacionais e o movimento globalista, inclusive com o apoio de relevantes atores internacio­nais, visando a interferir nas decisões de governantes e legisladores, especialmente em pautas destinadas a conceder benesses a determinadas minorias, em detrimento da maioria da população, a exercer ingerência em nosso desenvolvimento econômico, usando pautas ambientalistas a reboque de seus interesses e não pela necessária preservação da natureza, e a provocar crises que enfraquecem a Nação em sua busca pelo desenvolvimento. (Sagres, 2021, p.10).

As teorias conspiratórias são comuns na história, entre essas as que combatem “o grande capital apátrida”. A fase inicial do Nazismo na Alemanha tinha um discurso contra magnatas e banqueiros, especialmente os de origem judia, defesa das tradições do país, dos costumes, da família e, ao mesmo tempo, xenofobia e hostilidade aos intelectuais e minorias. Atualmente no Brasil são resgatados lemas do integralismo brasileiro e do fascismo espanhol do período da Guerra Civil (1936-1939): “Deus, Pátria e Família”, sem dúvida o recrudescimento do um pensamento de extrema direita. A novidade é o envolvimento de segmentos de militares em um ambiente distinto do período do Regime Militar, então no contexto da Guerra Fria, que tinha como antípoda o comunismo soviético ou chinês.

Conclusão

Embora tenha nascido sob a sombra do National War College, é curioso lembrar que a Escola Superior de Guerra (ESG) no Brasil não almejava ser uma cópia daquela organização estadunidense. Enquanto a similar estadunidense apresentava como escopo a dedicação aos assuntos ligados à guerra, no Brasil, a prioridade era formar elites pensadoras para encontrar soluções relativas aos problemas gerais do País, em tempos de paz ou de guerra (ESG, 2019, p. 6).

Criada em 1949, já sob os auspícios da nascente doutrina da guerra ao comunismo e de alinhamento com os EUA, a ESG surge no Governo do general Eurico Gaspar Dutra coincidindo com a virada ideológica à direita das Forças Armadas brasileiras.

A continuidade de doutrinas anacrônicas nas Forças Armadas e em seus think tanks privados é característica marcante de países capitalistas em desenvolvimento. Tais países condensam vários tempos históricos que se imbricam e tornam mais complexa as mudanças sociais e institucionais.

Um aspecto fundamental que a crítica ao ‘Projeto de Nação’ evidencia é a necessidade de superar a reprodução social do pensamento reacionário no interior do Estado brasileiro. Em uma democracia ou para um país que busca uma democracia sólida, não é possível a existência de enclaves no Estado que fogem do espírito da Constituição do país e que exaltam doutrinas contrárias ao Estado democrático de direito. Há críticas públicas aos procedimentos constitucionais, atribuindo uma espécie de poder moderador das Forças Armadas para intervir na vida política que não existe na Carta Magna brasileira.

Assim, é urgente um aggiornamento doutrinário e institucional de todo o Estado brasileiro para fazer frente aos enclaves do pensamento de extrema direita que atentam contra a nossa democracia e a nossa constituição.

As Forças Armadas são parte do Estado democrático de direito e constituem uma instituição de extrema importância na emergência de um mundo multipolar com imensos e complexos desafios para garantir a defesa da soberania nacional. Como as demais instituições do Estado brasileiro, elas merecem atenção do poder democraticamente eleito para que cumpram plenamente a sua vocação em uma nação soberana e democrática.

O movimento sindical possui um papel relevante na formação da cidadania e na agenda política e econômica da reconstrução na nação brasileira depois da nefasta experiência com um governo de extrema direita. Oriundo de uma demanda da União Geral dos Trabalhadores, este documento já revela a busca de protagonismo dos sindicatos na busca de solução aos problemas do país.

Ricardo Patah, presidente Nacional da UGT (União Geral dos Trabalhadores)

Enilson Simões de Moura (Alemão), Vice-presidente Nacional da UGT (União Geral dos Trabalhadores)

 

 

 

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