PUBLICADO EM 27 de fev de 2019
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Debates no Whatsapp e no Facebook

Dia desses li em um grupo de Whatsapp uma mensagem que ressaltava as vantagens de um grupo que se destina apenas a sugerir notícias sobre um assunto, em detrimento da aporrinhação de grupos onde as pessoas debatem. São “brigas de torcida”, dizia a mensagem. Respondi que embora aquele grupo tivesse uma finalidade específica, debates também são importantes porque nos ajudam a amadurecer ideias.

Já ouvi muitas pessoas, que acho que apreciam uma boa conversa, desdenhar de debates em grupos de Whatsapp e de discussões em redes sociais. Uma observação muito comum neste sentido é o anúncio de que vai “sair da rede” para viver a “vida real”.

Espantam-me essas observações e o desprezo pelo debate vindo de pessoas prestensamente esclarecidas e bem informadas.

Nas eleições de 2018, que levou Bolsonaro à presidência da República e seus três filhos à mandatos importantes no legislativo, observamos na prática o quanto as redes sociais interferem e são capazes de direcionar nossas vidas.

Sabe-se que a campanha bolsonarista usou e abusou do Whatsapp e afins, inclusive de forma irregular. Sua equipe foi eficiente e certeira em um marketing que atingiu em cheio uma massa de eleitores pouco acostumada a discussões aprofundadas sobre temas políticos, sociais e econômicos.

Ainda assim, há quem continue desdenhando da importância de aprofundar debates e emitir opiniões com bons embasamentos nas redes. Ainda assim, há quem vire as costas para isso e diz que vai viver a vida real no melhor estilo propaganda de margarina.

Amigos, tudo é vida real. Tudo isso faz parte. E as construções de opiniões e pensamentos são armas contra a manipulação, a doutrinação, a repetição impensada de deliberações alheias, sejam da igreja, do partido, do sindicato, sejam de uma empresa. É também papel dos movimentos sociais fomentar um ambiente de debates onde diferentes pontos de vista são confrontados. Um ambiente onde conhecemos opiniões alheias e somos provocados a buscar argumentos para defender opiniões que, de tão cristalizadas, temos como incontestáveis.

Já entrei em muitas discussões virtuais. Debates sobre homofobia, aborto, pena de morte, sobre o pensamento da filósofa Judith Butler, sobre a legitimidade da grande comoção social acerca da morte da cadela Manchinha, sobre partidos de esquerda apoiarem a candidatura do deputado Rodrigo Maia para presidência da Câmara, sobre a postura do Ciro Gomes no segundo turno das eleições, sobre o projeto político do Jair Bolsonaro, enfim… Quase todas essas discussões foram muito acirradas e cansativas, ao ponto de me deixar com uma dor de cabeça real, não virtual. E elas não se encerram quando desligamos o celular. Ficam martelando em nossas mentes.

Você pode pensar que essas discussões são improdutivas uma vez que não chegam a nenhuma conclusão. Entretanto, por mais que não consigamos convencer o interlocutor das nossas ideias, e por mais que não sejamos convencidos das ideias dele, conseguimos expor nosso pensamento. Demonstramos e aprendemos que convicções não são incontestáveis. Semear raciocínios é o mais importante, e isso já é uma grande coisa. O exercício intelectual, a capacidade de abstrair nos engrandece e nos faz mais humanos, nos diferenciando dos outros animais.

Hostilidades podem acontecer. Mas lidar com isso é parte do aprendizado. Nada é mais nocivo para o ambiente social do que o desprezo, a ridicularização e a postura soberba com relação às ideias alheias. O hábito de se mostrar indisposto ao debate, em larga escala, é um dos pilares que sustenta a ignorância de um povo e todo o mal que dela se desdobra.

O escritor Umberto Eco disse que “as redes sociais deram voz a uma legião de imbecis”. Acho que não preciso dizer quanta discriminação há nesta sentença. Ela se assemelha à frase do nosso fanfarrônico ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodriguez que diz: ” A ideia de universidade para todos não existe. (…) As universidades devem ficar reservadas para uma elite intelectual, que não é a mesma elite econômica”.

É preocupante quando um intelectual renomado e, pior ainda, um ministro da educação defendem que a inteligência é atributo de poucos. Infelizmente posturas como estas tem amesquinhado o debate justamente quando mais precisamos dele. Quanto menos conseguirmos refletir conjuntamente sobre nosso país e nosso mundo, menos amadureceremos essa prática e mais os debates, que porventura surgirem, parecerão brigas de torcida.

Carolina Maria Ruy é jornalista e coordenadora do Centro de Memória Sindical

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  • Terezinha Parra

    Sou mulher, feminista e esquerdista, hoje não podemos mas ter nossa liberdade de expressão nas redes sociais, é bem complicado com esse atual conjunto política que vivemos. Triste realidade.

  • Eliana Ferreira

    Acredito na liberdade de expressão, mas hoje é muito, mas muito arriscado você se posicionar via rede social, a intolerância chegou a um ponto tão extremo, que uma simples opinião pode causaruma avalanche de insultos e ate ameaças.

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