PUBLICADO EM 28 de jun de 2021
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Apontamentos sobre homeschooling, escolas cívico militares e a luta pela educação – segunda parte

A questão empregatícia, laboral, trabalhista, o Mundo da Educação e o Mundo do Trabalho em Educação. Dados alguns apontamentos no texto anterior, especialmente no que tange as concepções pedagógicas, sociológicas, filosóficas e políticas que envolvem a educação domiciliar e “cívico-militar”, ambas de amplo espectro, pretendo arriscar breves anotações acerca do impacto dessas duas “modalidades” junto aos profissionais da educação.

Inicio com uma pergunta talvez ingênua, mas que me ocorre e me preocupa: sob o manto da educação domiciliar não estaria aberto um caminho para a generalização do formato uberizado de educação e ensino? Não seria possível através das TICs ofertar pacotes e plataformas de suporte aos pais que decidirem educar seus filhos fora dos estabelecimentos de ensino? Tal hipótese – considerando a precarização acentuada do trabalho – não criaria uma multidão de educadores desempregados pela redução do número de matrículas, turmas e escolas e os jogaria na selvageria da prestação de serviço economicamente aviltado e desprotegido?

Aliás – se e somente se – o dito modelo vingar, qual impacto no quadro funcional das escolas? A adesão em número razoável certamente levaria a demissões, afetando emprego e empregabilidade de professores, funcionários, pedagogos especialistas e gestores. Mais: com a espada sob suas cabeças, a tendência seria a de recusar o ensino problematizante e aceitar a educação pré-fabricada pelos institutos, fundações e congêneres. Também desapareceria o associativismo sindical e a capacidade de organização e mobilização do corpo profissional.

E os riscos do charlatanismo pedagógico? A transferência da responsabilidade e dever para com a educação às famílias daria margem para que muitas optassem pelo domicílio por conta de pressões, manipulações, engodos, abrindo vaga para o ensino doutrinário, demagógico e anticientífico conduzido por leigos, inaptos e rufiões cujo único interesse – além da fatura comercial – está em deformar, alijar e corromper qualquer senso crítico da realidade, substituindo profissionais capacitados e comprometidos por todo tipo de espertalhão, oportunista e charlatão.

Do ponto de vista laboral e trabalhista, portanto, a introdução da educação domiciliar impacta num grave atentado ao sentido corporativo da profissão, pode acarretar extinção definitiva de postos de trabalho, agravar a questão salarial e de direitos e produzir uma desqualificação dos fazeres escolares próprios de quem tem formação para o mesmo.

A situação se repete no caso da implantação das escolas cívico militares. A escola não é – ou não deveria ser – uma fábrica, uma prisão ou um quartel. Qualquer relação ou aproximação com quaisquer dessas instituições representa equívoco completo. Mas no que tange particularmente ao modelo militarizado, mais do que a simples aplicação de práticas doutrinárias e supostamente rigorosas e inflexíveis, há também o problema das desprofissionalização da atividade educacional e pedagógica, a troca sumária de educadores (professores, funcionários, orientadores, supervisores e diretores) por efetivo militar e a criação de duas classes de trabalhadores – hierárquica e salarial – que degradaria as funções e dispensaria mão-de-obra.

Ao propugnar a militarização se traz também a ideia de que os educadores não têm condições de aplicar aa diretrizes previstas, logo nada mais natural do que dispensá-los do emprego. O excepcionalismo do experimento, carregado de discurso e narrativa favoráveis e probatórias de sua superioridade e benefícios, não demoraria a incentivar políticas massivas e abrangentes que consagrariam a farda em lugar do tapa-pó.

Em termos de emprego e trabalho, salário e renda, profissionalismo e aperfeiçoamento, concurso e carreira, tanto a educação domiciliar quanto a escola cívico militar significam menos oportunidades, condições e perspectivas para quem já está ou pretende ingressar na Educação, sobretudo nas redes públicas. Partes de um processo e projeto de maior magnitude, pretensão e alcance, essas duas questões precisam ser debatidas e firmemente rebatidas através de argumentos e lutas. Seja em favor do Direito à Educação, seja em defesa de nosso Trabalho, é hora de dar respostas, mobilizando a categoria, esclarecendo a sociedade e disputando a política. Avante, educadores.

Alex Saratt é professor de História nas redes públicas municipal e estadual em Taquara/RS, vice-diretor do 32º núcleo do Cpers-Sindicato

Leia aqui a primeira parte do artigo Apontamentos sobre homeschooling, escolas cívico militares e a luta pela educação

 

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