PUBLICADO EM 28 de maio de 2018
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História: Greves de estudantes mudaram a história dos EUA

Em Farmville, a marcha – liderada pela pioneira dos direitos civis de 16 anos de idade Barbara Johns – foi conduzida pelas abismais condições de aprendizagem na escola para negros. Na R.R. Moton High School, havia mais de 450 estudantes que tinham que preencher um campus originalmente construído para acomodar 180.

Como adultos no governo dos Estados Unidos continuam a debater qual é a melhor resposta para o tiroteio de fevereiro na Marjory Stoneman Douglas High School, em Parkland, Flórida, muitos adolescentes, que apoiam leis de controle de armas mais fortes, estão ajudando a conduzir a conversa. Embora eles possam não ter idade suficiente para votar, eles estão fazendo suas vozes serem ouvidas fora das escolas da nação – em alguns casos fisicamente levantando e saindo.

A revista TIME alcançou três participantes das maiores greves de estudantes do século XX. John Stokes, 86, um diretor aposentado das Escolas Públicas da Cidade de Baltimore, era um estudante de 19 anos na R.R. Moton High School, em Farmville, quando ajudou a organizar uma greve na qual os estudantes marcharam para o tribunal local, em 23 de abril de 1951. Janice W. Kelsey, 70,

Cartaz escrito à mão reivindica uma nova escola. Abril de1951. Foto: Richmond News Leader.

uma diretora de escola primária aposentada, que tinha 16 anos de idade quando passou quatro dias na cadeia, por participar da Cruzada Infantil, em Birminghan, Ala, em 2 de maio de 1963. Paula Crisostomo, uma administradora de faculdade aposentada, e Luís Torres, um ex-jornalista, ambos 67, foram dois dos mais de 10.000 estudantes que fizeram greve em cinco escolas secundárias de Los Angeles em março de 1968, que ficou conhecida como greves de escolas do leste de LA, ou “explosões”.

Aqui estão as lições que eles oferecem para aqueles que vão seguir seus passos:

Saber quando você precisa ser ouvido

As precisas circunstâncias atrás de cada uma dessas greves do passado eram únicas. Mas em cada caso, os participantes disseram à TIME que a decisão de deixar os prédios de suas escolas indicavam que os tempos estavam desesperados. Entrar em greve acontecia quando outras tentativas para conseguir atenção falhavam.

Em Farmville, a marcha – liderada pela pioneira dos direitos civis de 16 anos de idade Barbara Johns – foi conduzida pelas abismais condições de aprendizagem na escola para negros. Na R.R. Moton High School, havia mais de 450 estudantes que tinham que preencher um campus originalmente construído para acomodar 180. Três barracas de papel alcatrão haviam sido colocadas para acomodar os excedentes. Pais haviam ido para o quadro escolar, e líderes locais disseram para eles serem pacientes. Stokes disse que se o distrito escolar tivesse construído prédios permanentes para acomodar o excedente, ao invés de barracas de papel alcatrão, que “deixavam a chuva entrar”, então “eu não estaria falando com você agora”, porque os adultos poderiam apenas continuar esperando a mudança chegar. Ao invés disso, com todas as outras avenidas esgotadas, os estudantes marcharam.

Em Los Angeles, enquanto isso, estudantes haviam compilado uma longa lista de queixas sobre as escolas que serviam à comunidade Latina, variando de livros texto que não cobriam a História de seu povo, a um currículo centrado em afunilar crianças em trabalhos braçais, ao invés de irem para a faculdade, a banheiros trancados, que faziam os estudantes terem que se aliviar nos arbustos. Eles tentaram ir através dos protocolos para tratar dessas questões, trazendo a lista para o quadro escolar e oficiais locais. “Eles nos ignoravam, ou nos tratavam com condescendência, riam de nós, [perguntando] onde nós iríamos conseguir o dinheiro”, disse Crisostomo. “Eles nos definiam como a próxima geração do trabalho barato”.

Protesto de estudantes em Prince Edward Country, 1963.

Adultos podem ajudar

Embora as greves fossem lideradas por adolescentes, alguns adultos lançavam as bases ou providenciavam suporte crítico.

Por exemplo, em 1951, Stokes disse que os grevistas de Farmville contavam com membros da comunidade, especialmente veteranos locais da Segunda Guerra Mundial, emprestando carros a eles para assegurar que todos chegassem à greve, e depois seguramente voltassem para casa.

Kelsey foi inspirada em entrar em greve em sua escola depois de comparecer a uma série de reuniões de massa em Birmingham, lideradas por James Bevel, um diretor organizador de greves de escolas. Embora estudantes possam ter sido influenciados por canções de protesto e “todos os garotos bonitinhos que vinham”, disse Kelsey, era naquelas reuniões que diziam a eles que eles eram a melhor esperança do movimento. “Eu nasci numa sociedade segregada, mas era naquelas reuniões que eu ficava ciente das inequidades”, ela disse. “Nós queríamos fazer algo sobre isso, e nos diziam ‘bem, você pode’”.

E participantes das greves do Leste de L.A. diziam que os estudantes eram motivados pela orientação constante de um professor de Estudos Sociais que trabalhava na Lincoln High School e na Belmont High School, que completava a história mexicana-americana que faltava dos livros de texto e empoderava estudantes a aprender mais sobre sua herança. Era um tempo em que a comunidade Latina estava lutando por reconhecimento e respeito dos seus vizinhos e a mídia nacional (incluindo a TIME).

Uma enorme diferença entre os protestos de hoje e aqueles de 50 anos atrás é a nova tecnologia. Os ativistas de hoje têm que falar diretamente para o público e fazer suas demandas serem ouvidas.

Crisostomo argumenta que ela tinha que abordar as pessoas pessoalmente para convencê-las a juntar-se à greve, e também passar cópias de jornais alternativos dos organizadores, produzidos para educar os estudantes sobre as questões. Seu maior conselho para os ativistas de hoje é abordar o maior número possível de pessoas na escola; de fato, seu maior arrependimento sobre 1968 é não “ter alcançado mais” aqueles estudantes imigrantes mexicanos e chineses que não falavam inglês.

E a mídia social pode fazer mais do que espalhar a palavra. Stokes argumenta que, graças à visibilidade da mídia social, as ações dos estudantes de Parkland tem solicitado mudança imediata de algumas maneiras, como o fim da venda de armas no Walmart para pessoas com menos de 21 anos de idade, e o fim da venda de armas de assalto pela Dick’s Sporting Goods.

Mas, mesmo quando os ativistas têm que esperar pelos resultados – anos ou mesmo décadas – eles sabem que fizeram a diferença.

O caso de Farmville se tornaria mais tarde um dos cinco arrolados no marco 1954 Brown versus Quadro de Educação, na decisão de não segregação. Imagens de crianças de frente para mangueiras de incêndio e cachorros de polícia contribuíram para colocar Birmingham como um ponto de virada no movimento pelos direitos civis. E as greves do Leste de L.A. são agora vistas como um momento chave na história da local comunidade Chicana.

E não deve ser surpresa que muitos dos estudantes que marcharam uma vez persigam carreiras como professores e administradores de escolas.

“Eu sempre tive fé nos estudantes, porque eu sabia o que fazíamos como estudantes”, disse Stokes. “Quando as pessoas diziam que não poderia ser feito, nós fizemos”.

“Essa noção de que todos os estudantes secundaristas decidiram sozinhos organizar uma greve de estudantes, que fizeram tudo sozinhos, não é verdade”, disse Luís Torres, que era o editor do jornal da Lincoln High School durante a greve. O professor de estudos sociais Sal Castro era “o homem por trás da cortina”, que “sempre deu aos estudantes o crédito por fazer o que eles fizeram. Levou os alunos a realizar as coisas, mas ele era o organizador, ele era o estrategista. Se não fosse pelas mãos de Castro na orientação, não teria sido do jeito que foi”. Estudantes da Universidade de Los Angeles, como Moctesuma Esparza, foram para frente e para trás no campus para ajudar os secundaristas a se organizar.

Eles também se beneficiaram dos esforços de elevar a consciência, depois dos Tumultos de Watts, a ascensão dos Panteras Negras, e os protestos anti-guerra, porque muitos mexicanos-americanos lutavam na Guerra do Vietnam.

Faça sua lição de casa sobre os riscos

Apesar de a Constituição proteger estudantes que se manifestam durante as horas de escola, se eles não interrompem as aulas – as greves não necessariamente caíram nessa proteção – e levar os protestos às ruas significava que sempre havia uma chance de castigo além dos administradores das escolas.

“Nós não podíamos fazer o que os garotos da Flórida estão fazendo”, disse Stokes, em termos de falar sobre planos para greves nas mídias sociais. “Nós poderíamos ter sido assassinados”.

Kelsey ecoa essa ideia. Quando ela entrou em greve na escola em Birmingham, ela carregava uma bolsa já preparada para uma estadia na cadeia, com uma escova de dentes, creme dental, uma troca de roupas íntimas, um pente e a jaqueta de couro de sua irmã. Alguns pais também tinham medo de que a Ku Klux Kan viria atrás deles, por causa da participação de seus filhos.

O nível de causticidade é algo que os estudantes que protestam hoje não têm com que se preocupar.

“Parkland é uma comunidade predominantemente branca, enquanto nós somos, no Leste de Los Angeles, predominantemente mexicanos. É uma grande diferença, especialmente quanto a como o resto do país os vê e a sua luta”, argumentou Crisostomo. Os participantes das greves do Leste de Los Angeles eram chamados de “encrenqueiros”, e “enganados dos Comunistas”, como Torres colocou. (Chicanos urbanos foram agrupados com os Chicanos trabalhadores das fazendas, que foram mobilizados por Cesar Chavez na mesma época).

Mas, mesmo que as coisas possam parecer mais fáceis para aqueles que participam de greves de estudantes, do que para seus predecessores, há sempre algum risco envolvido. Crisostomo disse que quando os estudantes protestaram no campus da Occidental College, da qual ela se aposentou recentemente como uma Reitora Assistente de Estudantes para Assuntos Interculturais, ela frequentemente lembra seus alunos daquele fato. “Eu os ajudo a pensar nisso”, ela disse. “Qual é o risco? Há sempre um risco. E vale a pena?”.

Adaptado do artigo de Olivia B. Waxman para time.com

Traduzido por Luciana Cristina Ruy

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