PUBLICADO EM 07 de jun de 2018
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A mobilização, a política errada e o transporte irracional

Ainda sem deixar claro de onde viriam os recursos, o governo federal anunciou, na noite de 27 de maio último, medidas para atender às reivindicações dos caminhoneiros, que se mantinham paralisados há sete dias. O protesto, obviamente justo, visava a redução do preço do diesel, cuja variação tornou inviável a atividade, especialmente para a maioria de autônomos sem condições de forçar a elevação do preço do frete para acompanhar o custo de seu principal insumo. A solução encontrada pelo Planalto – o corte de impostos sobre o combustível –, ainda que restabeleça a normalidade do abastecimento, está longe de contemplar os interesses da sociedade brasileira, a quem sobrará a conta da renúncia fiscal.

Ou seja, entre repensar a política de preços da Petrobras – hoje alinhada à flutuação internacional e à cotação do dólar –, desagradando acionistas internacionais, e repassar a fatura ao povo, parece não ter havido dúvidas para se tomar a decisão.

Conforme aponta a nova edição do projeto “Cresce Brasil + Engenharia + Desenvolvimento”, a ser lançada neste mês de junho, nada justifica a paridade adotada: “Tal política somente favorece as grandes distribuidoras privadas, importadores de derivados e fornecedores estrangeiros, notadamente os norte-americanos, pois cerca de 82% das importações brasileiras de diesel são provenientes dos Estados Unidos. Em 2017, foram nada menos de 127 alterações nos preços nas refinarias, desorganizando o mercado, confundindo revendedores e consumidores”.

O resultado dessa lógica, também afirma o documento, é prejuízo para a sociedade e para as contas nacionais. Houve farta importação de diesel e gasolina, somando 200 milhões de barris no período entre janeiro e novembro de 2017 e atingindo a cifra de US$ 8 bilhões em 12 meses.

Se há equívocos graves na administração dos preços da Petrobras, há problema mais antigo e estrutural sobre o qual a mobilização dos caminhoneiros também lança luz: a fragilidade logística brasileira e sua irracional matriz de transportes, majoritariamente dependente do modal rodoviário, exatamente o mais caro, perigoso, poluente e ineficiente. Segundo artigo divulgado pela Associação Fluminense de Preservação Ferroviária (AFPF), em 2015 o Brasil movimentou 1,6 bilhão de toneladas/km. Desse total, 1 bilhão trafegou pelas rodovias e o restante por outros modos; pelos trilhos passaram apenas cerca de 20%.

Não se trata de abolir o transporte pelas estradas, que teria papel importante sobretudo na integração modal, cobrindo distâncias menores. Um modelo racional, além de incrementar a participação da ferrovia, lançaria mão do potencial hoje subutilizado do transporte aquaviário, tendo em vista a disponibilidade de rede fluvial navegável da ordem de 40 mil km.

Ou seja, ainda que as medidas tomadas representem solução momentânea aos caminhoneiros, estão longe de resolver os problemas de fundo que o Brasil precisa enfrentar. Para que isso seja feito, é necessário que se adote um projeto que tenha conexão com a ideia de nação e vise o bem-estar do povo brasileiro.

Murilo Celso de Campos Pinheiro é presidente  da Confederação Nacional dos Trabalhadores Liberais Universitários Regulamentados (CNTU) e do Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo

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