“Comecei a transição no final da faculdade quando tive tempo para me dedicar a mim, entender que era uma pessoa trans e já no estágio obrigatório senti como o mercado de trabalho é elitista, racista e transfóbico”, desabafa.
Sol relata ter feito uma dezena de entrevistas sem sucesso: “Em uma delas pediram só para mim que desse um plantão de 12 horas, no fim do dia perguntei para profissional que deveria me avaliar e ela falou que nem prestou atenção porque achou que eu era uma enfermeira”, conta.
O emprego na área até veio, mas como representante comercial técnica de uma marca de ração de cachorros. “Era uma trabalho CLT, uma vitória para uma mulher trans preta”, lembra, porém não durou muito: “A empresa se recusava a usar meu nome social e nem sequer queria falar sobre isso, então acabei saindo”, explica.
Sem perspectiva de trabalho, Sol então acabou buscando uma outra área de atuação e participou do curso profissionalizante de maquiagem de um projeto LGBT chamado Casa 1, em São Paulo. No entanto, mesmo realizando o curso a entrada na nova profissão não foi rápida a levando a recorrer à prostituição, prática comum entre mulheres trans para sobreviverem.
“Fiz um mês de pista e foi horrível, o medo, a exposição ainda maior à violência, não consegui continuar”, conta se referindo ao trabalho como profissional do sexo. Segundo a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), 90% das mulheres transgênero vivem da prostituição.
EMPREGO E EDUCAÇÃO NA POPULAÇÃO TRANS
E quando se fala em empregabilidade e educação da população os números são sempre alarmantes.
Uma pesquisa conduzida pelo defensor público João Paulo Carvalho Dias, presidente da Comissão de Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seccional Mato Grosso. (OAB-MT) em 2016, estima que o indíce de evasão escolar de travestis e transexuais é de 82%.
Já a V Pesquisa do Perfil Socioeconômico e Cultural de Estudantes de Graduação, publicada pela Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) em 2018, aponta que apenas 0,2% dos alunos e alunas das Instituições Federais de Ensino Superior são trans.
Essa equação de exclusão escolar — afinal mais do que abandonarem as escolas, as pessoas trans são impulsionadas para fora por conta da violência que sofrem — somada à falta de oportunidades e ao preconceito levou o empresário Ariel Nobre a pensar em formas de auxiliar outras pessoas trans como ele a se estabelecerem no mercado de trabalho.
“Entre 2017 e 2019 trabalhei com muitas marcas no campo da comunicação e da publicidade e ao longo desse tempo percebi o quanto ainda as empresas precisam se preparar para questões LGBT. Eu sempre era a única pessoa trans e isso se deve ao fato de sermos expulsos sistematicamente dos espaços de convivência: casa, escola, igreja e consequentemente das empresas”, declara o também diretor de cinema.
Foi então que Ariel elaborou uma mentoria para pessoas trans. “Montei uma grade de um dia sobre finanças pessoais e comunicação e a ideia era que cada pessoas trans se entendesse como uma pessoa do mercado, falamos sobre dinheiro, em como colocar o mercado ao nosso favor”, explica.
A primeira edição no começo deste ano contou com quinze participantes e, mesmo durante a quarentena, seguiu online com novos e novas alunas.
O consultor de diversidade e pesquisador na Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP), Ricardo Salles explica: ” A maior dificuldade que uma pessoa trans enfrenta no mercado é a própria transfobia. Existem algumas ideias que são equivocadas mas que circulam inclusive no meio empresarial, como a que você não encontra pessoas trans com formação ou que tenham traquejo para o mundo corporativo. Tudo isso é fruto de ideia preconceituosa.
Fonte: yahoo.com