Completam-se na segunda-feira, 1º de abril (famoso Dia da Mentira), 60 anos do golpe militar que tantas infelicidades produziu em nosso Brasil. Inaugurado em 1964, o regime autoritário liderado pelos generais só saiu de cena 21 anos depois, em 1985, quando o civil Tancredo Neves, ex-governador de Minas Gerais pelo PMDB, foi eleito presidente num pleito indireto realizado através de um Colégio Eleitoral imposto pelos próprios golpistas em substituição ao sufrágio universal.
O regime sucumbiu depois de uma árdua luta da oposição, do sindicalismo e dos movimentos sociais, que culminou na memorável campanha das Diretas Já, um movimento de massas que levou milhões de brasileiros e brasileiras às ruas.
Um balanço trágico
O balanço dos anos de chumbo que marcaram a ditadura fardada é doloroso e trágico.
Os generais saíram da cena política a contragosto, desmoralizados e mergulhados na lama da corrupção que prometeram combater.
A economia em frangalhos, abatida pela dívida externa, foi submetida ao monitoramento e às receitas recessivas do Fundo Monetário Internacional (FMI), o que resultou na primeira década perdida da história do capitalismo brasileiro. Entre 1980-1990 a renda per capita do país cresceu como rabo de cavalo. Em outras palavras, recuou 9%.
Milhares de brasileiras e brasileiros foram perseguidos, presos injustamente e torturados impiedosamente pelo regime militar por defenderem a democracia, a soberania nacional e os direitos do povo brasileiro. Centenas dessas vítimas foram assassinadas, depois de barbaramente torturadas.
O golpe envolveu forças poderosas e, como em 2016, também teve na geopolítica um fator determinante.
Prevalecia no mundo a chamada bipolaridade, opondo os EUA à União Soviética.
Através da chamada operação Brother Sam, os EUA mobilizaram Marinha e Força Aérea em apoio aos golpistas, fato que atesta o caráter antinacional do regime instalado pelos generais, que obcecados pelo anticomunismo se revelaram vassalos infames do imperialismo.
Golpe de classes com apoio militar
A ditadura foi instalada com forte apoio das classes dominantes nativas, burguesia e latifundiários, e notadamente da mídia burguesa, que faz questão de se apresentar ao distinto público com a máscara de paladina da democracia e das liberdades.
Conforme assinalou o teólogo e filósofo Leonardo Boff, no Dia da Mentira de 1964 ocorreu um “golpe de classes com apoio militar”.
A classe trabalhadora foi, de longe, sua principal vítima. Os sindicatos foram amordaçados, tendo dirigentes legitimamente eleitos pela base afastados e substituídos por interventores nomeados pelo regime.
A estabilidade no emprego acabou. O salário mínimo foi arrochado. Até o índice de inflação foi manipulado por um IBGE à época vigiado e orientado pelos militares.
A liberdade de expressão e de imprensa foi suprimida, cedendo lugar a uma censura prévia estúpida e nefasta para nossa fértil cultura.
Em contrapartida, para aumentar os lucros do imperialismo, a lei que elevou o imposto sobre remessas de lucros e dividendos, proposta e promulgada por João Goulart, mas contestada pelas multinacionais, foi revogada. Em 1995 o governo neoliberal de FHC completou a obra da ditadura isentando de impostos as remessas às matrizes de empresas com sedes no exterior.
Golpistas não merecem anistia
A economia nacional, dependente do capital estrangeiro e afinal entregue aos humores voláteis do imperialismo, naufragou no pântano da estagnação.
Falida, desacreditada e esgotada, a ditadura militar não resistiu à força das manifestações populares.
Mas, os crimes praticados pelo regime ficaram impunes e o acerto de contas da democracia brasileira com seus algozes ainda não foi concluído. Isto ficou muito evidente no fatídico 8 de Janeiro de 2023, quando bolsonaristas extremistas clamaram frente aos quartéis pela intervenção das Forças Armadas para depor, e talvez assassinar, o presidente Lula.
Pelo bem da democracia, e do povo brasileiro, a nova empreitada golpista protagonizada por Jair Bolsonaro e seu fanático rebanho não pode ficar impune.
Golpistas que querem destruir o Estado Democrático de Direito não merecem anistia.
A punição dos bolsonaristas envolvidos na empreitada golpista e, principalmente, de Jair Bolsonaro é fundamental para fortalecer e consolidar nossa ainda frágil democracia.
Nesses tempos obscuros, é bom recordar uma velha lição expressa numa frase já famosa: “o preço da liberdade (e da democracia) é a eterna vigilância”.
Adilson Araújo, presidente da CTB (Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil)