A seguir, listaremos tópicos que podem ajudar a compreender a situação trabalhista durante este período de quarentena e que são mais sensíveis aos trabalhadores e empresários. O texto da MP na íntegra pode ser lido aqui.
A possibilidade de férias antecipadas pela MP
O artigo 6º da medida indica como as empresas poderão convocar férias antecipadas individualmente ou coletivas. A lei trabalhista prevê que o empregador possui o direito de escolher quando o funcionário sairá de férias, podendo haver concordância das partes caso o empregado queira indicar um período mais confortável e que esteja alinhado ao planejamento pessoal.
Durante o período de calamidade pública, as empresas poderão antecipar essas férias em caráter emergencial, desde que respeitem antecedência mínima e avisem formalmente o trabalhador em até 48 horas.
Ao trabalhador, será dado o direito de negociar férias futuras, por meio de um contrato escrito. Por isso é importante planejar os próximos passos com cautela.
As autoridades se empenharam em conscientizar a população de que estar em quarentena não significa tirar férias, apesar do dispositivo reconhecido pela MP. Ainda assim, foi o meio encontrado para evitar o colapso financeiro das empresas e resguardar a população de acabar infectada ao sair de casa.
É preciso observar que o pagamento dessas férias poderá ser realizado até o quinto dia útil do mês seguinte ao início do período de saída laboral, diferente do que acontece normalmente, onde o salário cai na conta até a data marcada para o exercício das férias.
A opção de venda de 10 dias do período de férias segue ativa, mas ficará a critério da empresa pagar essa parte junto do que o trabalhador vai receber pelas férias, ou com o décimo terceiro salário, no final do ano.
A antecipação dos feriados não religiosos
Outro item da MP é a possibilidade de as empresas adotarem os feriados como dias de trabalho normal e recuperarem os dias parados pela quarentena. Feriados não religiosos federais, estaduais, distritais e municipais entrarão na conta como dias a serem trabalhados, desde que avisados formalmente pelas empresas.
Aos religiosos que optarem por seguir sua orientação eclesiástica, será preciso comunicar individualmente à empresa por meio de um acordo individual. “O trabalhador tem direito a ficar em casa nos dias dos feriados religiosos. Se for obrigado a trabalhar, ele pode entrar com uma ação. Não adianta antecipar a páscoa se ele quiser celebrar a páscoa”, indica Claudia Ayabe, coordenadora da área de Direito do Trabalho do Tess Advogados.
Uso do banco de horas “negativo”
O artigo 14º da MP permite que o empregador suspenda as atividades trabalhistas na empresa e adote, ao fim do período de quarentena, um “regime especial de compensação de jornada”, através de um banco de horas. Essa compensação deverá acontecer dentro de 18 meses após o fim do estado de calamidade e deverá ser acordado entre as partes.
A medida provisória explicita que essas horas adicionais não poderão ultrapassar duas horas diárias e nem romper o limite estabelecido por lei da jornada de trabalho de 10 horas por dia.
O empregado pode apresentar justificativas para não cumprir com o acordo proposto pelo patrão, indicando impeditivos como a existência de uma jornada dupla, a existência de filhos pequenos para cuidar ou a participação em atividade estudantil. É preciso apresentar, na negociação, qual a alternativa para quitar essas horas acumuladas no banco.
O professor de Direito do Trabalho das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) Ricardo Calcini aponta que a modalidade funcionará como um “banco de horas negativo”, já que vai na contramão do que seria o banco de horas convencional, onde há benefício por horas extra trabalhadas.
“Se essa compensação não puder ser exercitada, vai gerar um saldo negativo e na rescisão do contrato poderá ser abatida, tal como já acontecia no sistema anterior” argumenta Calcini.
Fui infectado durante o período em que estive trabalhando. E agora?
Um ponto polêmico da MP e que prejudica o trabalhador é a necessidade em se estabelecer o chamado “nexo de causalidade” para indicar que a pessoa foi infectada pelo coronavírus enquanto trabalhava. Muitas empresas demoraram para aderir a quarentena, ou suspender as atividades laborais para evitar o contágio da população que trabalha fora de casa, dividindo tempo no transporte público cheio, por exemplo.
Como é difícil se estabelecer onde e como ocorreu o contágio pessoal, o governo usou o artigo 29º para retirar das empresas possíveis questionamentos jurídicos sobre o atraso na tomada de decisões. Com isso, o trabalhador terá de provar como foi infectado dentro do trabalho, tornando remota a possibilidade de se tornar um “doente ocupacional”, o que garante estabilidades e garantias na volta do período de afastamento médico.
Por isso as empresas precisam tomar medidas de higiene dos locais de trabalho se quiserem evitar problemas jurídicos futuros. “É muito difícil que haja comprovação do nexo causal. Ela depende de perícia médica e em situação de pandemia é quase impossível indicar que a infecção aconteceu no trabalho, não na padaria, ou no mercado”, diz a sócia do escritório Andrade Maia Advogados Larissa Athayde .
Preciso fazer trabalho remoto, mas não tenho o material necessário em casa. Esse dinheiro vai sair do meu bolso?
A resposta é sim e não. A medida provisória obriga as empresas a darem toda a infraestrutura necessária para que os trabalhadores realizem suas funções fora do posto de trabalho. Caso as empresas não sigam a orientação, dois caminhos poderão ser adotados:
1 – o trabalhador poderá arcar com os custos da compra de equipamentos e serviços como internet e luz e negociar o reembolso através de um contrato escrito, firmado previamente ou no prazo de trinta dias da mudança do regime de trabalho.
2 – o trabalhador ficará ocioso em casa, sem trabalhar por falta de material e discordância no fornecimento de meios para o seu trabalho e isso será compreendido como hora trabalhada regularmente. Por isso setores onde não existe a possibilidade do trabalho remoto, como o automotivo, estão adotando férias coletivas.
Fonte: Revista Veja