PUBLICADO EM 20 de out de 2023
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Um mundo melhor para que todos vivam 100 anos, ou mais

Por Carolina Maria Ruy

Reza a lenda que nossos ancestrais viviam menos que nós. E muitos acreditam que podemos ir mais longe, vivendo 100 anos, ou mais.

Foi para entender o segredo da longevidade, que o pesquisador americano Dan Buettner viajou pelo mundo durante duas décadas.

O que ele viu e aprendeu está registrado em seu livro “The Blue Zone: 9 Lessons of Living Longer from the People Who’ve Lived the Longest”, e agora em uma série produzida pela Netflix: Como Viver até os 100: Os Segredos das Zonas Azuis.

Um registro poético

Assisti a série contemplando lugares bucólicos e povos que parecem ter atingido o estado de nirvana. Ela mostra que a vida se prolonga através de uma receita conhecida: alimentação natural, equilibrada e diversificada, o hábito de movimentar-se constantemente, o cultivo de boas relações, a cooperação (inclusive financeira) e o exercício mental e intelectual.

Não é um documentário do tipo utilitário.  Está mais para o programa “Viagem e gastronomia”, que era apresentado pelo chef Anthony Bourdain, ou até para o simpático “Avisa Lá Que Eu Vou”, de Paulo Vieira. É um registro poético de culturas e sociedades.

Desafios da vida moderna

Mas a fórmula que combina simplicidade, naturalidade e estado de espírito para chegar ao centenário está sendo atropelada pelo modelo de sociedade industrial capitalista.

A reflexão de Dan Buettner sobre a morte lenta das tradições nos distritos de Okinawa, no Japão, e Nicoya, na Costa Rica, com a chegada de redes de fast food e todo o pacote comportamental que as acompanha, é desoladora. A padronização urbana que ganha espaço, engolindo a paisagem original, corrompe as bases para a vida longa. Comida ultraprocessada, poluição, sedentarismo, solidão, vício, uso de medicamentos e de drogas contribuem para a disseminação de diabetes, doenças respiratórias e infecciosas, obesidade, câncer, depressão, ansiedade, demências e todos os problemas da chamada vida moderna.

Buettner sugere uma saída ao implementar na pequena cidade de Albert Lea, em Minnesota (EUA), um conjunto de medidas pró longevidade que ele levantou em suas pesquisas. Pode ser um bom programa para prefeituras. Mas em um mundo projetado em escala industrial, a questão é mais complexa.

Reflexão social e existencial

Até mesmo o bem intencionado Buettner está tão inserido no contexto da produção em série que o que ele fez ao viajar para absorver outras culturas foi medir, contabilizar, classificar, criar gráficos, aplicar em um experimento e transformar em livro e série, para consumo de pessoas como você e eu.

Um consumo com qualidade, é verdade, que inspira, mas que apresenta uma ideia quase exótica. A essência da longevidade dos povos das Zonas Azuis está além do esquema criado pelo viajante explorador. Embora a série reforce a importância dos hábitos para uma boa saúde, os fundamentos que produziram populações propensas ao centenário estão fatalmente sujeitas a uma cultura dominante que se impõe dia após dia. A projeção global, ou nacional, de uma expectativa de vida maior demanda não apenas um levantamento empírico, mas uma crítica social e uma reflexão existencial mais profundas sobre para qual modelo de sociedade caminhamos com o grau de evolução que a humanidade atingiu.

Carolina Maria Ruy é jornalista e coordenadora do Centro de Memória Sindical

Assista aqui o trailer da série:

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