Por Madeleine Carlisle
Quais são as origens dos termos políticos ‘esquerda’ e ‘direita’?
A história começa na França, no verão de 1789, explica Patrice Higonnet, um professor emérito de História Francesa na Universidade de Harvard. Como a Revolução Francesa ganhou força, a Assembleia Nacional se montou para agir como governo da revolução. E a assembleia tinha um objetivo: escrever uma nova Constituição.
Uma das principais questões que a assembleia debateu foi quanto poder o rei podia ter, diz David A. Bell, um professor da França do início da era moderna na Universidade de Princeton. Ele teria o direito a um veto absoluto? Como o debate continuou, aqueles que pensavam que o rei podia ter um veto absoluto se sentaram à direita do presidente da assembleia, e aqueles que pensavam que ele não podia – a visão mais radical – se sentaram à esquerda do presidente da assembleia. Em outras palavras, aqueles que queriam se aproximar da tradição estavam à direita, e aqueles que queriam mais mudanças estavam à esquerda.
“Então esses grupos se tornaram conhecidos como a esquerda e a direita, e é onde nós traçamos as origens,” Bell conta à TIME.
O padrão de se sentar se repetiu em subsequentes legislaturas e parlamentos. “Entrou no vernáculo popular bem rápido,” ele diz. “Esses termos foram usados nas reportagens dos jornais sobre a assembleia nacional”.
Como ‘ala esquerda’ e ‘ala direita’ se espalhou?
O mundo todo estava assistindo a Revolução Francesa, e seu jargão eventualmente começou a fazer seu caminho ao redor do mundo – mas não de um dia para o outro. De acordo com o ensaio “Direita e Esquerda”, do historiador francês Marcel Gauchet, o processo de direita e esquerda se tornando categorias primárias de identidade política foi “um prolongado processo, que durou mais do que três quartos de um século, até a primeira década do século XX.”
A prevalência de esquerda e direita na Rússia Bolchevique e nos primeiros anos da União Soviética exemplifica o alcance dos termos.
“Os Bolcheviques eram fascinados pela Revolução Francesa. Eles eram intensamente deliberados em defender seu legado – e eleva-lo para um nível mais alto”, contou a TIME Marci Shore, uma professora de história cultural e intelectual da Europa na Universidade de Yale. Eles viam isso como um passo necessário no processo histórico que eventualmente levaria ao comunismo.
Para eles, esquerda e direita assumiram novos significados específicos. Pessoas que romperam com a linha do Partido Comunista eram descritas pelos oponentes como ala esquerda ou desvios da ala direita, especialmente durante a era Stalinista. Inclinar-se para a esquerda geralmente significava abraçar uma revolução radical dos trabalhadores internacionais, e inclinar-se para a direita geralmente significava adotar algum tipo de sentimento nacional. Mas as definições eram fluídas, sempre inconstantes em relação a linha do partido em constante mudança.
Nos anos do período entre guerras, os termos esquerda e direita foram usados por toda a Europa como pessoas lutando a política de nação e classe. “É muito difícil falar sobre os anos de 1920 e 1930 na Europa sem continuamente invocar ‘Direita’ e ‘Esquerda’,” escreve Shore. “Isso é especialmente verdade porque os anos do período entre guerras foram um tempo de um espectro político polarizado: a Direita se tornou mais radical, a Esquerda se tornou mais radical; o centro liberal ‘se derreteu no ar’ (para usar frase de Marx)”.
Como ‘esquerda’ e ‘direita’ entraram na política americana?
De acordo com Michael Kazin, um professor de política americana e movimentos sociais na Universidade de Georgetown, os termos apenas tomaram posse no vernáculo americano no século XX – e uma busca no Google NGram revela que os termos “ala esquerda” e “ala direita” apenas começaram a ser largamente usados em livros de língua inglesa nos anos de 1920.
Mas, assim como os termos foram se tornando mais comuns, aqueles que podiam usa-los mais começaram a coibi-los. Havia “genuínos” comunistas e socialistas ativos nos Estados Unidos nos anos de 1920 e 1930, diz Brent Cebul, um professor de história dos Estados Unidos do século XX na Universidade da Pensilvânia, mas eles se tornaram menos prováveis de chamar a si mesmos de “esquerdistas” por múltiplas razões.
Primeiro, quando o Presidente Franklin D. Roosevelt estabeleceu o New Deal nos anos de 1930, ele inaugurou uma era de liberalismo que fez as pazes com as empresas privadas. Muitas pessoas que tinham sido socialistas ativos escolheram apoiar o New Deal, sacrificando suas ideologias mais radicais em nome de progredir nos principais partidos e política.
Então, nos anos de 1940 e 1950, a Guerra Fria aumentaram as apostas para a esquerda. “Você perderia seu emprego no governo se você ativamente falasse de inclinações socialistas ou comunistas,” diz Cebul. “Então tem uma implicação maior em termos de quem verdadeiramente se auto identifica como esquerdista.” Enquanto isso, pensadores conservadores começaram a ligar o crescimento do estado liberal a aquilo que eles chamaram esquerdismo, com suas associações comunistas. “Então realmente, é a direita que mantém essa ideia da esquerda viva [em política dominante],” ele argumenta.
Contudo, as pessoas começaram a recuperar o termo por volta dos anos de 1960, diz Jennifer Burns, uma professora de história americana do século XX na Universidade de Stanford e pesquisadora na Hoover Institution.
O que causou a mudança? Primeiro, partidos políticos – no passado frequentemente conduzidos por regiões e interesses econômicos – começaram a se solidificar em torno de crenças ideológicas centrais. Em segundo lugar, as pessoas tanto na direita como na esquerda começaram a rejeitar o velho consenso político. Conservadores trabalharam para defender um novo conjunto de ideias, discordando dos fundamentos filosóficos do governo expandido. E do outro lado, estudantes ativistas protestaram contra o que eles viam como “liberalismo hegemônico”, como Burns coloca, e a Guerra do Vietnam.
Esse momento foi chave: esquerda e direita se tornaram novamente úteis na política americana, quando as pessoas precisaram de um modo de expressar suas discordâncias com outros no que pode ter parecido ser seu próprio lado das coisas.
“De repente, você tem mais de uma definida esquerda e direita, porque ambos os lados pensam que o meio – o establishment, os poderes que são – estão bagunçando as coisas e não estão fazendo um bom trabalho,” diz Burns. “Essa pode ser uma razão porque esquerda se torna mais definido como um ponto no espectro político, porque as pessoas que discordam do liberalismo que não são conservadoras precisam de uma palavra, então elas chamam a si mesmas de esquerdistas… [E] quando as pessoas estão lutando para se diferenciar do movimento conservador de seus dias, ainda assim eles sentem claramente que eles não estão chamando por um governo expandido ou intervenção expandida na vida econômica, social ou política, eles recorrem a este termo da direita.
O que ‘esquerda’ e ‘direita’ significam hoje?
Como Sophia Rosenfeld da Pensilvânia explica, os termos são situacionais, e se tornaram ferramentas que mudam baseado no contexto. Eles significaram alguma coisa específica na Revolução Francesa, algo específico na ascensão do socialismo e nacionalismo na Europa, e algo específico no nascimento dos movimentos estudantis nos Estados Unidos.
Uma tendência realmente tende a manter a verdade: esquerda e direita se tornam alinhamentos políticos mais fortes quando o centro cai fora. Alguns argumentam que é exatamente o que está acontecendo em 2019.
“Eu acho que o termo direita está voltando ao uso hoje,” diz Burns, “porque nós estamos vendo muita diversidade entre pessoas que têm claramente a visão de que não são liberais.”
Os termos também estão sendo cada vez mais usados em combate político, diz Kazin. Políticos hoje frequentemente descrevem seus oponentes como sendo de extrema esquerda ou extrema direita, em um esforço de deslegitimar suas políticas.
E os significados de esquerda e direita podem ainda mudar mais uma vez.
Fonte: Time
Tradução: Luciana Cristina Ruy
Rita Gava
Eu sempre achei que esquerda é o pensamento voltado ao bem de todos
Enquanto direita acredita que elite é necessária para6o desenvolvimento