PUBLICADO EM 16 de maio de 2018
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Porque a Coreia do Norte e a Coreia do Sul estão tecnicamente ainda em guerra

O líder norte-coreano Kim Jong Un e o Presidente sul-coreano Moon Jae-in podem ter se encontrado pela primeira vez em abril, mas há um senso de déjà vu no ar. Eles se encontraram em Panmunjom, na Zona Desmilitarizada na fronteira dos dois países, o mesmo lugar onde um armistício foi assinado – pelo General Tenente do Exército Americano Willian K. Harrison Jr., da Delegação de Comando das Nações Unidas e o General Norte-Coreano Nam Il, que também representava a China – em 27 de julho de 1953, pondo um fim para cerca de três anos de luta da Guerra da Coreia de 1950-1953.

Olivia B. Waxman

Mas o armistício foi um cessar fogo, não um tratado de paz permanente. Isso significa que os países ainda estão tecnicamente em guerra, em um “conflito sem hostilidades”, que dura décadas, disse o historiador Charles K. Armstrong, um especialista em Estudos da Coreia. Isso é um fato sobre o qual o Presidente dos Estados Unidos Donald Trump expressou surpresa esse mês. “As pessoas não percebem que a Guerra da Coreia não terminou”, disse ele.

Então porque um tratado de paz permanente não foi assinado lá atrás? E porque a Coreia do Sul não estava a bordo em primeiro lugar?

“Os comandantes principais, como todo mundo, estavam felizes que o derramamento de sangue havia acabado, mas eles não tinham orgulho de sua conquista, e eles não se sentiam satisfeitos com a armistício que tiveram ordens de assinar”, TIME reportou na semana depois da assinatura. “Eles sabiam o argumento de que nessa guerra liberdade havia sido defendida, e agressão repelida, mas o correspondente de TIME Dwight Martin enviou por cabo, ‘eles pareciam preocupados de que algum dia fossem chamados para explicar porque assinaram o presente armistício. Muitos com quem conversei especificamente pensavam em termos de comitês investigativos demandando saber se era um fato que eles venderam a Coreia. Eles francamente admitiam que complexas justificativas e explicações, na época aceitáveis, poderiam parecer muito mancas em um ano ou mais’”. (De fato, havia medo de uma guerra nuclear então, como agora).

A Coreia do Sul nem assinou o armistício, embora a nação tenha recentemente confirmado que discutiu assinar um tratado de paz com a Coreia do Norte.

Mesmo assim, os partidos que assinaram o armistício certamente não planejavam que o conflito continuasse não resolvido por mais de meio século. Eles planejavam alcançar um acordo de paz no ano seguinte, numa conferência em Genebra. De fato, a promessa de tal conferência – talvez reveladoramente – foi um passo crucial em permitir ambos lados em concordar em assinar o acordo de armistício mesmo sem ter todas as suas questões atendidas nessa ocasião.

Aquela conferência, que também tratou de um número de outras questões globais, reuniu precisamente 64 anos atrás na quinta, 26 de abril de 1954. Mas, quando chegou a hora de definir os termos finais lá, os líderes não concordaram o melhor caminho a seguir.

“A ideia da conferência de Genebra era de que haveria um novo governo unificado na Coreia, estabelecido depois de uma nova eleição, mas os delegados não concordaram sobre o processo de como isso aconteceria”, disse Armstrong. “Então a conferência de Genebra desabou e nós estamos na mesma situação desde então. Houveram discussões periódicas, mas a situação de conflito nunca foi resolvida”.

A Coreia do Sul não assinou o armistício, porque seu Presidente, Syngman Rhee, pensou que “os Estados Unidos poderiam ter feito mais para entender o controle da Coreia do Sul sobre a península”, disse Armstrong. Outro obstáculo foi a recusa da América em reconhecer a República Popular da China como um governo legítimo, simbolizada pela recusa do Secretário de Estado John Doster Dulles de apertar as mãos do Premie Chinês Zhou Enlai, durante a conferência de Genebra.

A Coreia do Norte e a Coreia do Sul mais tarde assinaram um pacto prometendo evitar agressão. Em dezembro de 1991, mantendo o espírito de paz do fim da Guerra Fria e colapso da União Soviética, os dois lados prometeram trabalhar no sentido da reconciliação, seguindo um juramento dos Estados Unidos para retirar as armas nucleares da Coreia do Sul. Os Estados Unidos anunciaram que suspenderiam os exercícios das juntas militares com a Coreia do Sul um mês depois. O pacto não foi muito eficaz, mas “aquele acordo também não foi abandonado”, Armstrong adicionou. “Mas então em 1992 os Estados Unidos começaram a acusar a Coreia do Norte de possivelmente desenvolver um programa secreto de armas nucleares, então não fomos muito longe depois disso”.

O armistício sempre esteve em terreno instável. “Houveram numerosas violações do acordo de armistício desde 1953, e as coisas pareceram intensificar-se por volta de 2010”, disse Armstrong. Ele aponta para o afundamento do navio de guerra Cheonan, que matou 46 marinheiros em março de 2010, e pelo qual a Coreia do Sul culpa a do Norte, e o disparo de projéteis de artilharia do Norte em direção a ilha da Coreia do Sul Yeonpyeong, em novembro do mesmo ano, matando dois fuzileiros navais e dois trabalhadores de construção, e ferindo mais de uma dúzia de outros. Em 2013, a Coreia do Norte até declarou o armistício inválido.

“A linha entre um estado de conflito e efetivas hostilidades é muito fina, e não há muito a conter cada lado de ir à guerra se eles quiserem fazer isso”, disse Armstrong. “Eu não espero uma grande barganha, mas eu sinto que há muito potencial que nós não vimos em décadas. Todos os três lados parecem realmente interessados em fazer algo funcionar. Vamos ver o que acontece”.

Adaptado para o português por Luciana Cristina Ruy

Fonte: Time.com

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