Por Jose M. Bastos
Em 1947, Frank Capra era uma das grandes figuras do cinema norte-americano. Na década anterior ‘só’ tinha conquistado cinco ‘Oscars’ – dois do melhor filme e três de melhor realizador e em 1943 o ‘Oscar’ para o Melhor Documentário – Prelude to War – um dos vários retratos que fez da 2ª Guerra Mundial. A abordagem que fez do conflito valeu-lhe as mais altas distinções americanas e britânicas. Italiano, nasceu na Sicília no final do século XIX, no seio de uma família pobre, analfabeta e numerosa, que no início do século passado emigrou para os Estados Unidos. Naturalizado norte-americano, ao mesmo tempo que trabalhava em empregos precários formou-se em Engenharia Química e, em 1922, realizou o seu primeiro filme.
Seguiu para Hollywood na altura já a ‘Meca’ do cinema… ainda mudo. Aí foi ‘pau para toda obra’. Escritor de argumentos trabalhou com Mack Sennet e para a ‘Columbia’, uma produtora quase desconhecida. Em 1934 ganhou dois ‘Oscars’ com It Happened One Night. Em 1936 o de melhor realizador com ‘Mr. Deeds Goes to Town’ e em 1938 outros dois, com You Can’t Take It With You. Depois da guerra fundou, com William Wyler e Georges Stevens a sua própria produtora: a ‘Liberty Films’. Foi aí que fez It’s a Wonderful Life/ A felicidade não se compra, ‘Globo de Ouro’ de 1947 para o melhor realizador. Frank Capra morreu em 1991 com 94 anos.
A felicidade não se compra é a história de um homem, George Bailey, representado por James Stewart, que numa pequena cidade americana se vê à frente de uma empresa fundada pelo pai. Uma espécie de cooperativa na qual as pessoas colocavam as suas economias que serviam para financiar a construção das suas próprias casas. Assim escapavam ao raio de influência de Henry Potter o magnata que dominava a terra e que também construía casas que as pessoas habitavam, mas em troca de rendas exorbitantes.
A oposição entre estas duas figuras, e afinal entre duas concepções do mundo e da vida, é o tema central desta obra, que tem ainda uma componente transcendental ou religiosa: a presença de um anjo caído do céu que vem à terra salvar, na noite de Natal, um George Bailey mergulhado em dificuldades e à beira do suicídio. Mas nem os ateus ou agnósticos mais empedernidos deixarão de sorrir perante a figura de um anjo que tem que cumprir satisfatoriamente a missão que lhe foi confiada e assim e, finalmente, ganhar as asas que espera há duzentos anos.
A felicidade não se compra, eleito em 2006 como o filme americano mais inspirador da História, em votação promovida pelo American Film Institute, é, nos nossos dias, um filme contra a corrente e contra os discursos dominantes. Com setenta anos de antecipação um filme ‘anti-trumpista’. Um hino ao humanismo e à solidariedade e um libelo contra a usura, a especulação e a obsessão pelo lucro. E, ainda por cima feito por um emigrante… Mas não foram emigrantes os grandes nomes do cinema norte-americano durante boa parte do século XX?
Fonte: Tornado; adaptado para o português do Brasil por José Carlos Ruy
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