Por Carolina Maria Ruy
Embora o comércio exista em São Paulo desde a fundação da cidade, a atividade se aprimorou após o desenvolvimento impulsionado pela economia cafeeira, e se sofisticou após a formação de um mercado consumidor verificado depois da Revolução de 1930 e, mais ainda, depois da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), quando, na esteira do plano de Metas de Juscelino Kubitschek (1956 a 1961), São Paulo foi o polo de atração para empresas nacionais e multinacionais.
O Sindicato dos Comerciários de São Paulo nasce justamente no bojo do progresso industrial, no auge da 2ª Guerra (1939 a 1945) e na fase autoritária de Getúlio Vargas. Nasce da fusão de duas entidades representantes dos comerciários: Sindicato dos Comerciários de São Paulo e Sindicato União dos Comerciários, sendo reconhecida como entidade sindical no dia 15 de maio de 1941, quando se comemora o seu aniversário. Nasce ainda, na esteira do Decreto nº 19.770, de 19 de março de 1931, que regulamentou a sindicalização das classes patronais e operárias, tornando-se obrigatória a aprovação dos estatutos dos sindicatos trabalhistas e patronais pelo Ministério do Trabalho.
Em sua história mais recente, o enfrentamento à perda de direitos dos funcionários do antigo Mappin, em 1999, tornou-se um marco para a cidade. Símbolo do estilo de vida capitalista, da classe média paulistana, a imponente loja do Mappin, inaugurada em 1939, começou a se endividar e a decair na década de 1980 e acabou falindo 1999. As manifestações do Sindicato para garantir indenização aos trabalhadores demitidos foi vitoriosa.
Quatro anos após aquela campanha, o paulistano Ricardo Patah, que encabeçou as manifestações do Mappin, foi eleito presidente do Sindicato, em 2003. Funcionário do antigo Bazar 13, hoje Pão de Açúcar, da zona oeste da cidade, Patah assumiu, segundo ele (em depoimento a Centro de Memória Sindical, em 2015) com a ideia de modernizar o Sindicato:
“Eu vim com uma ideia de atualizar o nosso Sindicato do ponto de vista administrativo. Implementei toda a estrutura de controle através da informática. Me formei em administração de empresas em 1977, e aproveitei todo o instrumental aprendido, além da expertise adquirida nos 20 anos do Bazar 13, para iniciar um processo na área administrativa. O sindicato era extremamente conservador. Grande, mas não tinha essa, vamos dizer, essa compreensão de uma vocação mais política. De colocar para fora uma série de questões que os comerciários, como uma categoria enorme, sempre desejaram”.
Na presidência, Patah comandou a campanha que se opôs a abertura e à falta de regulamentação do comércio aos domingos. Uma campanha que, após muitas discussões, conquistou que a abertura aos domingos fosse regulamentada por lei com base em acordo entre a representação sindical dos trabalhadores e as empresas.
E, dando vazão à ideia de um caráter mais político do Sindicato, investiu na realização do mutirão do emprego desde 16 de julho de 2018.
O evento mostrou que não apenas a categoria cresceu e evoluiu em diversas ramificações, acompanhando a complexidade urbana de São Paulo, como avançou para além de seu nicho, assumindo uma concepção do trabalhador em suas diferentes funções.
O Mutirão do emprego no Anhangabaú, em frente à sede do Sindicato dos Comerciários de SP, foi criado com base em uma demanda de milhões de desempregados. Uma demanda que explodiu logo após a reforma trabalhista de 2017, que, com seu viés antissocial, tirou grande parcela de brasileiros da classe média, até então sustentada pela segurança de um trabalho registrado. As imensas filas de desempregados no Vale do Anhangabaú escancaram um problema nacional e tornaram-se a triste imagem dos efeitos nefastos das políticas de austeridade implementadas nos governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro.
Com esse mesmo perfil maduro e politizado, o Sindicato dos Comerciários de São Paulo, atravessou uma de suas piores fases, com o fechamento compulsório de lojas para conter o avanço do coronavírus.
No artigo “Para onde vamos?”, de dezembro de 2020, Patah afirmou que: “O projeto político a ser construído tem que levar em conta a proteção social, a inclusão das minorias e a proteção da democracia. Como chegar a esse objetivo é um caminho complicado. Até porque a covid-19 tem um repique e não há projeto do governo federal de como essa situação deve ser resolvida”.
A situação inusitada e grave exigiu atitudes rápida e efetivas. E o Sindicato chega aos 80 anos frente a tais desafios. Algumas das principais ações dos Comerciários no combate à crise, segundo matéria da Agência Sindical, foram: o fornecimento de máscaras, álcool gel e divisórias de acrílico nos supermercados e estabelecimentos congêneres; mais treinamento e formação aos trabalhadores; a luta pelo auxílio emergencial, e pela ajuda às empresas bem como a complementação das verbas aos trabalhadores cujas empresas optaram pela redução ou suspensão salarial, a luta pela vacina e para priorizar o comerciário na vacinação.
Se em seu surgimento o Sindicato representava trabalhadores de uma atividade ainda em crescimento, de um comércio de rua, de vendas pontuais, destinado às classes mais abastadas, hoje, 80 anos depois, a categoria é tão diversificada que chega a ser indefinível. Ela já atravessou as fronteiras dos shoppings centers e hipermercados, e hoje se debate com a imposição de novas relações como o e commerce.
A ideia de modernizar e conferir um caráter mais politizado ao Sindicato deu as ferramentas para que os comerciários paulistanos, que hoje tem aproximadamente 500 mil trabalhadores na base, atravessassem os últimos anos com a criatividade e a seriedade que as crises sanitária e social exigiu dos trabalhadores. Afinal, é nos momentos mais difíceis que os movimentos em defesa das parcelas mais vulneráveis da sociedade precisam mostra seu valor.
Carolina Maria Ruy é coordenadora do Centro de Memória Sindical
Veja aqui o vídeo institucional em comemoração aos 80 anos do Sindicato: