O colegiado – sob relatoria da ministra Kátia Magalhães Arruda – concluiu que existem os elementos caracterizados do vínculo, quais sejam pessoalidade, onerosidade, habitualidade e o pleno exercício do poder disciplinar.
Em seu voto, a relatora destacou que para verificar a configuração de vínculo empregatício deve-se aferir a presença dos elementos caracterizadores do vínculo de emprego, como prestação de trabalho por pessoa física, com pessoalidade pelo trabalhador, não eventualidade (ou habitualidade), com subordinação e onerosidade.
A ministra afirma que quando se trata de trabalho efetuado com a intermediação de plataformas digitais, é simples a aferição dos critérios da prestação de trabalho por pessoa física e com onerosidade.
No que tange à pessoalidade, faz-se necessário verificar se o trabalhador, em relação à plataforma digital, é infungível ou se há autorização para que se faça substituir livremente por outra pessoa.
A magistrada salientou que para que o labor por meio de plataformas digitais seja considerado eventual – logo, sem habitualidade -, é imprescindível que o trabalho seja prestado como consequência de circunstâncias incertas ou imprevistas.
“Se, ao contrário, o trabalho é prestado como resultado de cenários previstos contratualmente pelas partes, que previamente acordaram a prestação do serviço sem expectativa de que ela cesse definitivamente, conclui-se que tal trabalho é exercido de forma não eventual. Afinal, a habitualidade não é definida somente pelo tempo de duração do trabalho ou pela quantidade de dias laborados ao longo da vigência do contrato, mas, sim, pela causa do trabalho, a qual resulta do interesse das partes pactuantes. Nessa linha, o art. 452-A, §§ 1° e 2°, da CLT faculta ao empregador definir os períodos de atividade do empregado intermitente, o que lhe outorga flexibilidade para organizar os fatores de produção de sua atividade empresária, sem que isso lhe enquadre como trabalhador eventual.”
No que diz respeito à subordinação, a magistrada ressaltou que é irrelevante, para a configuração, que o trabalho realizado seja controlado ou supervisionado pela pessoa física do empregador ou de seus prepostos.
“Com a evolução tecnológica e a possibilidade de realização do trabalho fora da sede do empregador, a CLT passou a prever expressamente a subordinação jurídica verificada por meio de meios telemáticos ou informatizados de controle e supervisão (art. 6º, parágrafo único, da CLT).”
Como os algoritmos de aplicativos de entrega de mercadorias destinam-se, por natureza e finalidade próprias, a atender a instruções previamente definidas pelo gestor do modelo de inteligência artificial que os processará, é inequívoco o exercício, das empresas que realizam a gestão de trabalho por meio de plataformas digitais, do poder de organização, já que predefine as variáveis relevantes à execução dos serviços de entrega de mercadorias, pontua a ministra.
“Não afasta a subordinação jurídica a possibilidade de o empregado recusar determinadas entregas, ou cancelar entregas inicialmente aceitar por ele por meio da plataforma digital. Afinal, o ordenamento jurídico vigente contém previsão expressa, direcionada ao trabalho intermitente (que é formalizado mediante relação de emprego), no art. 452-A, § 3°, da CLT, de que a recusa de determinado serviço não descaracteriza, por si só, a subordinação. Logo, se a recusa de uma oferta diretamente oriunda do empregador não é suficiente a descaracterizar o requisito da subordinação, de acordo com a lei, no caso da recusa se direcionar à plataforma digital tampouco afasta a subordinação, especialmente quando os algoritmos programados pelo próprio empregador já admitem e preveem a possibilidade de recusa ou cancelamento de um serviço pelo entregador.”
Ademais, a relatora notou que a possibilidade do trabalhador se vincular a mais de uma plataforma digital para exercer a mesma atividade ou de realizar outra atividade econômica, paralelamente à prestação de serviços por meio de aplicativos, não afasta a subordinação jurídica, uma vez que a exclusividade não é um requisito da relação de emprego, tampouco da subordinação.
A controvérsia sobre o vínculo de emprego de trabalhadores que prestam serviços por meio de plataformas digitais não é um debate observado tão somente no Brasil, citando o caso de outros países.
Por fim, a magistrada anotou que no TST já há julgados reconhecendo o vínculo de emprego no serviço prestado por meio de plataformas digitais na 3ª, 6ª e 8ª turmas.
Para a ministra, ficaram provados os requisitos da pessoalidade, onerosidade, habitualidade e o pleno exercício do poder disciplinar. Assim sendo, a 6ª turma deu provimento ao recurso para reconhecer o vínculo entre o entregador e a Rappi.
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