As novas regras para o Imposto de Renda aprovadas pela Câmara dos Deputados (PL 2.337/2021) na quarta-feira, 1º de setembro trazem mais um ônus para a já sacrificada classe trabalhadora brasileira: quem recebe acima de R$ 4.375,00 por mês vai pagar mais!
Esse ônus decorre da redução do desconto-padrão, uma dedução que pode ser feita quando é elaborada a declaração anual de rendimentos.
O valor da dedução permitida é de até 20% dos rendimentos brutos, antes limitada a R$ 16.754, 34 e, face ao que foi aprovado na Câmara, caiu para apenas R$ 10,5 mil.
Esse desconto-padrão é utilizado pela maioria dos declarantes e substitui a dedução das despesas autorizadas na lei, que dependeriam de comprovação: despesas médicas, de educação e dependentes.
A perda não é pequena e atinge em cheio a classe média, que tem papel importante na movimentação da economia, e que já vem acumulando inúmeras perdas de direitos. Por isso, é inaceitável imputar mais esse ônus à classe média baixa, atingindo até quem recebe menos que o valor estipulado como salário mínimo pelo Dieese, de R$ 5.315,00.
Entre as modificações positivas que foram aprovadas no mesmo projeto está a atualização parcial da tabela do imposto de renda das pessoas físicas, elevando-se o patamar de isenção de R$ 1.903,98 para R$ 2,5 mil por mês.
Apesar de positiva, essa atualização está muito aquém da que seria devida, tendo em vista que desde 1996 o governo federal passou a se omitir em relação à atualização da tabela do imposto de renda, autorizando apenas algumas atualizações esporádicas e insuficientes.
Para retornarmos ao patamar de faixa de isenção praticada em 1996, em valores corrigidos pelo IPCA (anual até 2020 de 346,9%), a faixa de isenção deveria ser atualizada para R$ 4.022,00, e não apenas R$ 2,5 mil, como votado na Câmara.
Essa distorção precisa ser corrigida, pois, na prática, caracteriza um confisco contra a classe trabalhadora. Em decorrência de mero reajuste inflacionário de salário, trabalhadores mudam de faixa e passam a pagar mais imposto de renda, sem que tenham tido aumento real de sua capacidade contributiva.
Outro ponto positivo do PL 2.337/2021 foi o retorno da tributação de lucros e dividendos distribuídos aos sócios de grandes empresas. Esses rendimentos têm sido considerados isentos no Brasil desde 1996 e privilegiavam de forma injustificada a parcela mais rica da população, como tratamos em recente artigo: Ganham acima de 320 salários mínimos ao mês e quase não pagam impostos.
Injustiça tributária
A tributação voltará a acontecer a partir do ano que vem, porém à alíquota de apenas 15%, conforme destaque aprovado que reduziu a proposta aprovada inicialmente de tributação à alíquota de 20%. Enquanto isso, trabalhadores que recebem acima de R$ 5,3 mil (já considerando a nova atualização aprovada na Câmara) são tributados à alíquota de 27,5%.
O peso colocado sobre a classe trabalhadora no Brasil fica evidenciado quando comparamos a disparidade entre a alíquota de 27,5% de imposto de renda cobrada de trabalhadores que recebem salário mensal acima de R$ 5,3 mil, com a alíquota de apenas 15% a ser cobrada de sócios de grandes empresas e bancos que poderão receber até centenas de milhões de reais ao mês!
O projeto ainda reduz o imposto de renda das pessoas jurídicas (IRPJ) praticamente à metade: a alíquota de 15% caiu para apenas 8%! A contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL) de empresas e bancos também foi reduzida.
O fim da dedução dos juros sobre o capital próprio também é uma medida positiva, pois essa dedução é absurda, fictícia, e ainda por cima o valor era distribuído aos sócios, reduzindo o imposto devido pelas grandes empresas que possuem capital próprio e seus sócios.
Esses itens comentados demonstram que o PL 2.337/2021, apesar de alguns passos no sentido de enfrentar privilégios indecentes da isenção de lucros e dividendos distribuídos e dos juros sobre o capital próprio, ainda mantém a imensa injustiça tributária existente no Brasil, trazendo mais uma penalização aos trabalhadores e trabalhadoras que recebem acima de R$ 4.375,00 que precisa ser reparada. O projeto ainda está tendo destaques votados na Câmara dos Deputados e em seguida será apreciado pelo Senado.
Maria Lúcia Fattorelli é coordenadora nacional da Auditoria Cidadã da Dívida e integra a Comissão Brasileira Justiça e Paz, organismo da CNBB. Escreve mensalmente para o jornal Extra Classe