A multinacional estadunidense Ford anunciou dia 19 de fevereiro que fechará a sua fábrica em São Bernardo do Campo, no ABC paulista. A abrupta decisão faz parte do projeto da empresa de encerrar a produção de caminhões nas unidades instaladas na América do Sul.
A previsão é de que até o final do ano a “reestruturação” resultará na demissão de 2,7 mil metalúrgicos ─ além do corte nos empregos indiretos das firmas que fornecem peças e prestam serviços. Com certeza, a mídia burguesa ─ nutrida com milhões em publicidade ─ tentará abrandar o impacto do fechamento da fábrica. Até porque seus colunistas de aluguel vinham jurando que a economia, sob o comando do rentista Paulo Guedes com o seu plano ultraliberal e entreguista, já estava em plena retomada. Baita recuperação!
Recentemente, outra multinacional ianque, a GM, também ameaçou abandonar a produção no Brasil. Há vários fatores que explicam essa possível fuga, como a prolongada crise da economia capitalista no mundo, o aparente esgotamento do modelo de negócios das montadoras de veículos e ─ na hipótese mais sacana ─ a tentativa de chantagear o frágil governo de Jair Bolsonaro, obtendo vantagens como o corte de direitos dos trabalhadores e outros subsídios.
No comunicado lacônico e cínico divulgado à imprensa, a empresa apenas disse que o fechamento da unidade visa recompor a lucratividade, “com um modelo de negócios ágil, compacto e eficiente, fortalecendo a sua oferta de produtos e parcerias globais. A Ford prevê o impacto de aproximadamente US$ 460 milhões em despesas não recorrentes como consequência dessa ação”.
Para se contrapor à sacanagem da multinacional, o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC está em plena mobilização. Conforme relata o jornalista Vitor Nuzzi, da Rede Brasil Atual, “com a notícia do fechamento, os trabalhadores na Ford decidiram não voltar à fábrica amanhã (20), nem na quinta-feira…
O presidente do sindicato, Wagner Santana, o Wagnão, conta que a reunião com a direção da empresa não foi propriamente uma negociação, mas um comunicado. ‘Não houve nem um processo de conversa. Foi lacônico’, descreveu. Segundo ele, a direção da Ford informou que dali a 40 minutos comunicaria a imprensa sobre sua decisão, surpreendendo os representantes dos trabalhadores”.
Ainda segundo a reportagem, os trabalhadores também avaliam que “a montadora pode estar tentando ‘chantagear’ os metalúrgicos, anunciando o fechamento para conseguir uma maior flexibilização de direitos. Vários lembraram do ocorrido recentemente na General Motors em São José dos Campos, interior paulista, onde um acordo foi aprovado em troca de garantia de investimentos naquela fábrica. ‘Se for chantagem, não vai funcionar’, diz Wagnão. ‘Também há limites para as condições às quais temos de nos submeter no trabalho. Estamos abertos à negociação. Vamos insistir na reversão dessa decisão’, afirma o dirigente. Ele também pretende conversar com representantes dos governos. ‘Vamos buscar todas as instâncias. Não temos preconceito. Para nós, os trabalhadores estão acima dos interesses políticos'”.
Citando cálculos da Anfavea, a associação nacional dos fabricantes de veículos, Wagnão lembra que a decisão do fechamento da fábrica pode atingir até 27 mil pessoas, considerando, além da Ford, toda a cadeia produtiva. “O anúncio acontece exatamente 100 anos depois que a diretoria da Ford Motor Company, nos EUA, aprovou a criação de uma filial brasileira. Foi a primeira fabricante de automóveis instalada no País. Em 1967, a montadora produziu seu primeiro veículo brasileiro, o Galaxie. Naquele mesmo ano, a Ford assumiu o controle da Willys-Overland e passou a operar na unidade do bairro do Taboão, em São Bernardo, que produz o modelo Fiesta, além de caminhões. A empresa também tem unidades em Camaçari (BA), onde é fabricado o Ka, e em Taubaté (SP), que produz motores”.
Altamiro Borges é jornalista e presidente do Centro de Estudos de Mídia Alternativa Barão de Itararé