Nesse momento em que diversas iniciativas e propostas, no mínimo, polêmicas têm sido defendidas e colocadas em prática no País, a sociedade precisa se unir e se concentrar para defender o que existe e funciona, mesmo que aquém do necessário.
Na área de Educação, em 2020, entre tantas outras questões, será preciso focar no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), principal instrumento de financiamento da educação básica no País. Tramitam no Congresso Nacional vários projetos sobre o Fundo, mas, por enquanto, o certo é que ele tem data para acabar: 31 de dezembro de 2020.
Criado em 2006, o Fundeb substituiu o Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério), que vigorou de 1997 a 2006. É constituído por parte dos tributos coletados em todas as unidades da Federação (26 Estados e o DF). A União acrescenta ainda 10% ao total reunido, toda vez que o valor médio ponderado por aluno ou o custo-estudante/ano é inferior ao valor anual mínimo definido nacionalmente.
Os recursos são repassados para todas as modalidades de educação básica (creche, pré-escola, ensino fundamental e ensino médio; ensino indígena e quilombola; ensino de jovens e adultos; educação especial; e vagas em creches conveniadas com os municípios), de acordo com o número de matrículas nos Estados e outros critérios que levam em conta, por exemplo, se as escolas são rurais ou de período integral. Anualmente, é realizado um censo para verificar e atualizar as informações sobre as escolas.
Os valores só podem ser usados para pagamento de salários de professores, diretores, orientadores pedagógicos e outros funcionários. Também cabe o uso para formação continuada de professores, transporte escolar, construção e manutenção de prédios escolares e compra de equipamentos e materiais didáticos.
Nota Técnica recentemente divulgada pelo Dieese analisou 5.198 cidades, que representam cerca de 93% do total de municípios no País e concentram 97% das matrículas da rede municipal da educação básica, mostrando o que aconteceria se o Fundeb acabasse hoje. Segundo o trabalho, mais de 3.700 municípios teriam os investimentos em educação básica reduzidos e 20,7 milhões de estudantes em escolas municipais seriam prejudicados (94% dos alunos das escolas municipais examinadas). O Nordeste seria a região mais afetada, pois 98% dos municípios perderiam recursos. No Norte, 93% das cidades também deixariam de receber investimentos, seguido pela região Centro-Oeste (57%), Sudeste (56%) e Sul (50%).
Dos cerca de R$ 160 bilhões aplicados em educação pelos municípios brasileiros em 2018, R$ 89 bilhões, ou seja, 56% foram de recursos do Fundeb. Está em jogo, portanto, a garantia de mais da metade do (pouco) que se investe em educação hoje nas redes municipais.
Nos debates no Congresso, há vários tipos de propostas: aumento da participação do governo federal no Fundo; transformação do Fundeb em política permanente, incluída na Constituição; permissão para que estados e municípios convertam parte dos recursos para financiar o ensino público em instituições privadas, entre outras.
A sociedade precisa compreender o que é o Fundo e a importância que ele tem para a educação brasileira. Ao conseguir transformar o Fundeb em um instrumento permanente, o Brasil pode continuar no processo de melhoria do ensino. Caso ele seja extinto, o que virá é a desestruturação da educação básica no País.
Muita gente aposta que o Fundo não chegará ao fim, ainda que passe por muitas mudanças, mas a realidade tem mostrado que este momento é de queda de investimento, redução da responsabilidade do Estado e desmonte geral. Reforma trabalhista, reforma da Previdência, fim da política de valorização do salário mínimo, entre outras medidas, são a prova disso.
A educação é um direito fundamental da sociedade. A Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional (LDB) afirma que “é direito de todo ser humano o acesso à educação básica”. A premissa é que a educação tem caráter essencial no desenvolvimento do cidadão e, por consequência, da nação. O indivíduo com nível educacional mais alto consegue se adaptar às inovações tecnológicas do trabalho e ter participação mais ativa na vida política, estando mais apto a reconhecer os direitos e deveres da vida democrática.
É dever do Estado brasileiro garantir educação básica, pública e de qualidade a todos os cidadãos, de modo a estimular o desenvolvimento do País. Para isso, é importante garantir o investimento necessário, não só preservando os mecanismos atuais, como o Fundeb, mas ampliando-os.
Fausto Augusto Junior é cientista social e diretor técnico do Dieese.