PUBLICADO EM 05 de ago de 2019
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Boris Johnson adaptou seus velhos e estranhos hábitos para a era do Brexit

O líder britânico tem um registro irregular em seus trabalhos anteriores no alto escalão.

Por Benjamin Mueller e Stephen Castle

Maio de 2018. Foto Matt Cardy/Getty Images.

Era 2009, e Johnson era novo no cargo de Prefeito de Londres. Para estudar a idéia do aeroporto, ele tentou recrutar um cientista de destaque, o professor David King. Mas o professor King havia alertado sobre o aumento dos níveis de água no rio Tâmisa. Condições difíceis para um aeroporto, disse ele ao prefeito, recusando-se ao projeto enquanto, ao invés disso, se oferece para investigar outros usos da hidrovia.

Então o professor foi pego de surpresa, quando Johnson publicamente o nomeou presidente de uma equipe investigando um aeroporto do estuário do rio Tâmisa. O professor King confrontou o Prefeito.

“Ele disse, ‘oh bobinho eu, bobinho eu’, ou algo assim, e afofou seu cabelo,” o professor King recorda. O Prefeito continuou: “Ah, David, vai ficar tudo certo”.

Não estava tudo certo. Como vários dos projetos de letreiro de Johnson, o plano do aeroporto da ilha sugou milhões de libras em taxas de planejamento, mas nunca foi a lugar algum contra quase unânimes oposições e obstáculos práticos, tais como, como por um aeroporto em um internacionalmente protegido habitat de pássaros.

Virando Primeiro Ministro, Johnson está implantando a bonomia e trapalhadas, personalidade confeccionada que o fez Prefeito de Londres. Ele é o querido dos soldados rasos do Partido Conservador, determinados a conseguir o Brexit a todo custo. Ele é a escolha do Presidente Trump. Ele é o senhor dos anéis de uma campanha espetaculosa que apresentou Johnson socando o ar com um arenque defumado embalado à vácuo.

Mas, apesar do seu charme, muitos dos seus colegas, assim como analistas políticos, questionam sua competência. Durante seus dois mandatos como Prefeito de Londres, ele leu o humor do público e mirou milhões de libras da mesma maneira, quaisquer avisos terríveis que seus documentos informativos continham. Seu mais recente trabalho de alto perfil, Ministro do Exterior, encontrou-o pouco à vontade em um papel que requeria mais solenidade do que grandiloquência.

O próximo Primeiro Ministro vai encarar talvez maior crise da Grã-Bretanha em tempos de paz, o Brexit, aquela que liga o tipo de detalhes labirínticos que Johnson evita tanto. Sua promessa de extrair a Grã-Bretanha da União Europeia pelo fim de outubro deixou muitos britânicos preocupados de que ele vá mandar o país correndo para um potencialmente calamitoso não acordo de Brexit.

Até aliados reconhecem que Johnson vê a si mesmo como alguém focado no quadro maior, ao invés de detalhes de governança. Ele é intuitivo e improvisador, dizem aliados, frequentemente abandonando sem cerimônia um texto preparado quando está fazendo um discurso.

“O que ele faz é pegar a vibração do momento, do dia, e então ele compreende qual caminho a tomar”, disse Ray Lewis, um conselheiro de Johnson na Prefeitura de Londres. Johnson pega uma visão ampla, disse Lewis, de uma maneira que o lembrava como é sonhar acordado sobre resgatar um amor de um castelo encantado. As tecnicidades não são o ponto.

“Eu nunca pensei sobre de onde eu pegaria o cavalo, ou o capacete”, disse Lewis. “Eu apenas tinha o quadro maior. E Boris vai ter o quadro maior”.

Depois de uma carreira como jornalista, Johnson foi eleito para o Parlamento em 2001, onde estava enredado em alguma controvérsia, e foi despedido da equipe de liderança da oposição, depois de negar falsamente relatos de um caso extraconjugal. Ele foi eleito Prefeito de Londres em 2008, o primeiro de dois mandatos, e prometeu acabar com o crime e reduzir gastos extravagantes. Uma escolha incomum para uma cidade que normalmente inclina-se para a esquerda, ele foi o seguinte como um Conservador com visões heterodoxas em questões como imigração.

O trabalho de Prefeito, criado em 2000, tem poderes limitados. Mas seu recorde na Prefeitura oferece uma dica de seu estilo descuidado, e do charme que distraiu muitos britânicos de seus erros perdulários.

“Não há desastres”, ele brincou depois da controvérsia envolvendo seu caso, “apenas oportunidades. E, de fato, oportunidades para desastres novos”.

Seu mandato como Prefeito produziu algumas falhas dispendiosas, como o “ônibus Boris”. Ken Livingstone, o predecessor de Johnson como Prefeito de Londres, tinha desfeito um amado modelo de ônibus de dois andares (equipados com uma porta traseira ao ar livre) e o substituído por “ônibus flexíveis”, que eram mais longos e espaçosos. Alguns londrinos os consideraram modernas monstruosidades sem alma, nas ruas estreitas da cidade.

Batendo nessa raiva, Johnson prometeu reavivar o modelo clássico e até trazer de volta vendedores de bilhetes a bordo, apesar dos avisos dos oficiais de transporte de que esse plano não era economicamente viável.

Dentro de poucos anos, os vendedores de bilhetes foram dispensados, as portas ao ar livre foram fechadas, e o “ônibus Boris” ficou mais conhecido por seu interior tórrido como uma sauna, para não mencionar os 300 milhões de libras, ou quase $375 milhões que queimou dos cofres públicos.

“Ele gostava de voar pelo assento de suas calças em coisas como essas, e ele era mais do que feliz em blefar ou mentir”, disse Jenny Jones, uma integrante da Assembleia de Londres pelo Partido Verde, na época.

Johnson, naquela época já sendo discutido como futuro Primeiro Ministro, parecia enamorado pelo status e poder da Prefeitura, mas “entediado com todo o conceito da política e assumir responsabilidades”, disse Jones.

Nada poliu mais a marca de Johnson como as Olimpíadas de Londres, em 2012. Ele se divertiu com a chance de vender os londrinos em sua cidade, ou vender a si mesmo ao mundo. Mas depois, sua decisão de converter o Estádio Olímpico para acomodar um time de futebol da Primeira Liga deixou um legado exorbitante – custa 8 milhões todos os verões mudar os assentos de atletismo para futebol.

Ele também perseguiu um plano de construir uma “ponte jardim” sobre o Tâmisa, que acabou custando 50 milhões de libras, sem um tijolo jamais sendo colocado. Quando Caroline Pidgeon, uma integrante da Assembleia pelos Liberais Democratas, o interrogou sobre o projeto, Johnson tentou repreende-la. “Eu acho isso muito deprimente”, ele disse, “que você insiste nesse ódio talibanesco por objetos de beleza”.

E então houve os três canhões de água alemães de 25 anos, que ele comprou em nome de dispersar possíveis desordeiros. Ele se ofereceu para ser atingido por um ele mesmo, para mostrar que era seguro, e continuou com as compras, apesar dos avisos dos especialistas de que eles eram inapropriados para Londres.

Theresa May, então Secretária de Estado, logo os proibiu, e eles foram finalmente vendidos último ano como sucata, numa perda de 300 mil libras.

Johnson realmente viu alguns sucessos, como a expansão do ciclismo em Londres, uma ideia nascida sob seu predecessor, Livingstone, que o novo prefeito percebeu como um programa de locação, que se tornou conhecido como as “bicicletas de Boris”. Mas enquanto as bicicletas deveriam pagar a si mesmas, contribuintes foram deixados no gancho para subsídios pesados.

“Ele vai andar em cima de tudo e espero que seja entregue”, disse Andrew Boff, um integrante Conservador da Assembleia de Londres. “Às vezes isso soa bem, mas às vezes você tem que cuidar um pouco mais. Você tem que realmente cuidar sobre algumas coisas que está entregando”.

Mas para Johnson, os erros raramente ficam presos.

“Seus enganos ou erros percebidos são sempre vistos como evidências de sua autenticidade”, disse Tony Travers, um professor de governo na Escola de Economia de Londres. Muitos estavam à espera de caos e foram agradavelmente surpreendidos quando os ônibus continuaram correndo e, depois de um começo turbulento na Prefeitura, Johnson se provou adepto de delegar e escolher um competente Chefe de Gabinete.

Em 2016, não mais prefeito, Johnson foi o arquiteto da vitória do Brexit, e um favorito a se tornar Primeiro Ministro. Mas o trabalho foi para May, e, para surpresa de muitos, ela o apontou como Ministro do Exterior, em parte para mantê-lo longe da política doméstica.

Devido a seu papel na campanha do Brexit, sua recepção entre seus parceiros europeus era indiferente, e sua linguagem se provou nada além de diplomática. Ele comparou o ex-Presidente francês, François Hollande, a um oficial da Segunda Guerra Mundial prisioneiro em um campo de guerra; sugeriu que empresários deveriam investir na Líbia, uma vez que os mortos haviam liberado o caminho; e recitou um poema da Era Colonial, em um templo em Myanmar.

Talvez seu maior erro foi em um Comitê Parlamentar em 2017, quando ele incorretamente disse a legisladores que uma mulher anglo-iraniana retida em Teerã, Nazanin Zaghari-Ratcliffe, estava ensinando jornalismo para estudantes. Essa declaração foi usada pelo governo iraniano para justificar suas reivindicações de que ela estava espionando.

Ele durou dois anos como Ministro do Exterior, e então pediu demissão do gabinete em julho de 2018, depois de debilitar a estratégia de May para o Brexit e afirmar que a Grã-Bretanha estava “verdadeiramente dirigindo-se para o status de colônia”.

Em sua busca para se tornar Primeiro Ministro, Johnson adaptou seus velhos hábitos – a teatralidade, as humilhações polissilábicas, os planos estranhos – para a era do Brexit. Assim como ele usava ideias espetaculosas como Prefeito de Londres para pôr um brilho em circunstâncias difíceis, então ele tentou desviar de algumas das complexidades do Brexit, também.

Entre outras sugestões, ele flutuou a ideia de construir outra ponte, não através do Tâmisa, mas da Grã-Bretanha para a França.

Fonte: New York Times

Tradução: Luciana Cristina Ruy

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