PUBLICADO EM 27 de nov de 2019
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AI-5: saiba mais sobre o Ato Institucional que sustentou as maiores atrocidades do regime militar

O AI-5 fechou o Congresso Nacional, dando plenos poderes ao presidente ditador e inaugurou uma série de Atos Institucionais que encastelaram cada vez mais o governo.

Ilustração Abacrombie Ink

Como a Constituição Brasileira de 1946 não contemplava nenhum artigo que viabilizasse medidas autoritárias, de exceção, foi necessário que, em 1964, os golpistas lançassem mão dos Atos Institucionais como forma de driblar a Constituição e legitimar seus atos.

Desta forma, após o golpe de 31 de março de 1964, no dia 9 de abril daquele ano o Ato Institucional Número Um, ou AI-1, instituiu a ditadura, suspendeu por dez anos os direitos políticos de todos aqueles que eram ou poderiam ser contrários ao regime, ameaçando com cassações, prisões, enquadramentos como subversivos e expulsões do País. Entre os opositores encontravam-se sindicalistas, políticos, jornalistas, intelectuais, estudantes etc. A situação instigou grupos de oposição a se organizarem para combater o golpe e suas mazelas.

No contexto da Guerra Fria o golpe militar de impôs um regime alinhado politicamente aos Estados Unidos acarretando uma situação de atraso político, desigualdade social, censura aos meios de comunicação e de violenta repressão, que duraria duas décadas.

É consenso entre políticos, jornalistas, intelectuais e demais interessados na história do nosso país que o quinto Ato Institucional marcou o período mais duro do regime militar.

O AI-5 fechou o Congresso Nacional, dando plenos poderes ao presidente ditador e inaugurou uma série de Atos Institucionais que encastelaram cada vez mais o governo.

Para chegar a esta conclusão basta ver que os quatro primeiros Atos – que viabilizaram a instituição do regime militar, promoveram a perseguição política às instituições, às pessoas de perfil divergente daquele pregado pelos militares e impuseram uma nova Constituição, pautada pela Constituição fascista de 1937, foram decretados entre abril de 1964 e dezembro de 1966 – em 31 meses –, e os outros treze Atos Institucionais foram decretados entre dezembro de 1968 e outubro de 1969 – em dez meses.

Como estopim para a promulgação do AI-5 surge a presença do deputado Márcio Moreira Alves, do MDB. Em seu pronunciamento na Câmara dos Deputados, no dia 2 de setembro de 1968, ele lançou um apelo para que o povo não participasse dos desfiles militares de 7 de Setembro, chamou os quartéis militares de “covis de torturadores”. Sua manifestação de repúdio foi endossada por outro deputado do MDB, Hermano Alves, que, naquele mesmo período, escreveu uma série de artigos considerados provocadores no jornal Correio da Manhã.

Considerando tais demonstrações ofensivas o governo de Costa e Silva iniciou um processo para cassar os dois deputados. Entretanto, eles não haviam infringido a lei, e a possibilidade da cassação gerou uma tensão política que se desenrolou até o dia 12 de dezembro, quando a Câmara recusou (com a colaboração de políticos da própria Arena) o pedido de licença para processar Márcio Moreira Alves.

A recusa deixou a cúpula do governo de mãos atadas. Mas no dia seguinte eles dariam o xeque-mate promulgando o AI-5, que autorizava o presidente da República, em caráter excepcional e, portanto, sem a necessidade de decisão judicial, a uma série de ações arbitrárias como cassar mandatos parlamentares, suspender direitos políticos de qualquer cidadão, decretar o confisco de bens considerados ilícitos e suspender a garantia do habeas-corpus.

Naquele mesmo dia 13 de dezembro de 1968, foi decretado o recesso do Congresso Nacional, que só seria reaberto em outubro de 1969, para referendar a escolha do general Emílio Garrastazu Médici para a Presidência da República.

Logo após o AI-5, onze deputados federais foram cassados, entre eles Márcio Moreira Alves e Hermano Alves. A lista de cassações aumentou em janeiro de 1969, atingindo não só parlamentares, mas também ministros do Supremo Tribunal Federal.

As maiores atrocidades cometidas pelo governo militar ocorreram sob a vigência do AI-5. Hoje se sabe que foram mortos pela ditadura, de forma arbitrária, pessoas como o estudante Stuart Edgart Angel Jones, em 1971, o ativista Rubens Paiva, em 1971, a ativista Helenira Resende, em 1972, o estudante Alexandre Vannucchi Leme, em 1973,  o estudante Fernando Santa Cruz, em 1974, o jornalista Vladimir Herzog, a ativista Zuzu Angel, em 1976, o sindicalista Manoel Fiel Filho, em 1976, entre tantos outros.

O relatório da Comissão Nacional da Verdade, apresentado em dezembro de 2014, mostrou que os militares disseminavam o terror como forma de intimidação, uma vez que se sabia que a tortura não produziria informação significativa. Tal prática resultou em detenções ilegais e arbitrárias, tortura em larga escala, execuções, desaparecimentos forçados e ocultação de cadáveres por agentes do Estado brasileiro. No relatório são apontados 434 mortes e desaparecimentos de vítimas no país, e mais de 300 pessoas, entre militares, agentes do Estado e até mesmo ex-presidentes da República, foram responsabilizadas.

Em 2018 foi revelado um memorando secreto da CIA que mostra que o general Ernesto Geisel, presidente do Brasil entre 1974 e 1979, durante o AI-5, sabia e autorizou a execução de opositores durante a ditadura militar.

No fim da década de 1970, pouco a pouco, e de forma fragmentada, alguns de seus crimes vinham à tona e o desgaste sócio-político desestabilizava o regime. Sob sinais de esgotamento, em 13 de outubro de 1978 foi promulgada a emenda constitucional nº 11, cujo artigo 3º revogava todos os atos institucionais e complementares que fossem contrários à Constituição Federal. A emenda, que pôs fim ao o AI-5, entrou em vigor no dia 1º de janeiro de 1979, como parte da abertura política iniciada em 1974.

Sequelas daquele período sombrio, entretanto, ficarão para sempre em nossa história. Perdemos pessoas, ideias, cultura na medida em que elevamos, no bojo da sociedade, uma cultura de violência, de medo e atraso.

Saiba quais foram os Atos Institucionais da ditadura militar:

AI–1, de 9/4/64: Dava ao governo militar o poder de burlar a Constituição, suspender direitos políticos por dez anos e demitir, colocar em disponibilidade ou aposentar compulsoriamente qualquer pessoa que, pelo entendimento do governo, tivesse atentado contra a segurança do país. Determinava eleições indiretas para a presidência da República

AI–2, de 27/7/65: Instituiu eleição indireta para presidente da República, dissolveu todos os partidos políticos existentes desde 1945, aumentou o número de ministros do Supremo Tribunal Federal de 11 para 16, reabriu o processo de punição aos adversários do regime e estabeleceu que o presidente poderia decretar estado de sítio por 180 dias sem consultar o Congresso. Também poderia o presidente intervir nos estados, decretar o recesso no Congresso, demitir funcionários por incompatibilidade com o regime e baixar decretos-lei e atos complementares sobre assuntos de segurança nacional.

AI–3, de 5/2/66: Definiu que governadores e vices seriam eleitos indiretamente por um colégio eleitoral e prefeitos das capitais seriam indicados pelos governadores.

AI–4, de 7/12/66: Promulgou nova Constituição.

AI–5, de 13/12/68: Concedeu plenos poderes ao Presidente da República, dentre outros, os de cassar mandatos, intervir em estados e municípios, suspender direitos políticos de qualquer pessoa e, o mais importante, decretar recesso do Congresso e assumir suas funções legislativas no ínterim. O AI-5 também suspendeu o Habeas Corpus para crimes políticos. Por consequência, jornais oposicionistas ao regime militar foram censurados, livros e obras “subversivas” foram retiradas de circulação e vários artistas e intelectuais quiseram se exilar no estrangeiro.

AI–6, de 1/2/69: Reduziu de 16 para 11 o número de ministros do STF.

AI–7, de 26/2/69: Suspendeu todas as eleições até novembro de 1970.

AI–8, de 2/4/69: Definiu que Estados, Distrito Federal e municípios com mais de 200.000 habitantes poderiam fazer reformas administrativas por decreto

AI–9, de 25/4/69: Estabeleceu regras para a reforma agrária cuja doutrinação tinha cunho estritamente conservador. Dava poder ao presidente para delegar as atribuições para a desapropriação de imóveis rurais por interesse social, sendo-lhe privativa a declaração de zonas prioritárias.

AI–10, de 16/5/69: Determinava que as cassações e suspensões de direitos políticos com base nos atos institucionais anteriores acarretariam a perda de qualquer cargo da administração direta, ou indireta, instituições de ensino e organizações consideradas de interesse nacional.

AI–11, de 14/8/69: Estabeleceu novo calendário eleitoral, fixando a data das eleições gerais para prefeitos, vice-prefeitos e vereadores – as quais estavam suspensas.

AI–12, de 26/8/69: Estabeleceu que uma junta militar composta pelos ministros militares assumiria o poder e não o vice-presidente Pedro Aleixo, como mandava a constituição.

AI–13, de 5/9/69: Estabeleceu o banimento do território nacional de pessoas perigosas para a segurança nacional.

AI–14, de 5/9/69: Estabeleceu a modificação do artigo 150 da constituição, com a aplicação da pena de morte nos casos de comprovada participação em atos de “terrorismo” que resultasse em morte e também em “guerra externa, revolucionária ou subversiva”.

AI–15, de 9/9/69: Fixou as eleições nos municípios sob intervenção federal para 15 de novembro de 1970.

AI–16, de 14/10/69: Declarou vagos os cargos de presidente e vice-presidente da República, marcando para o dia 25 seguinte a eleição presidencial indireta pelo Congresso Nacional, em sessão pública e por votação nominal.

AI–17, de 14/10/69: Autorizava a junta militar a colocar na reserva os militares que “tivessem atentado ou viessem a atentar, comprovadamente, contra a coesão das forças armadas”.

Fonte: Portal da Legislação/Legislação Histórica

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  • João Nery Campanario

    Logo após a edição do AI5, em dezembro de 68, meu Tio Nicanor Campanario, Deputado Estadual do Estadol do Rio de Janeiro, pelo MDB, foi preso e teve seu mandato cassado.

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