As mulheres foram as principais atingidas pelo corte de vagas; 42 mil postos em 2017; dados do Caged apontam que 6 de 8 setores cortaram vagas; no ano, a criação de vagas ficou concentrada no gênero masculino; indústria, comércio e serviços apresentaram a maior discrepância na abertura de postos de trabalho entre homens e mulheres; construção civil, que tem cerca de 90% das vagas ocupadas por homens, houve fechamento de 5,3 mil vagas ente mulheres
A recuperação ainda lenta da economia brasileira e a posição mais vulnerável da mulher no mercado de trabalho acentuaram as desigualdades de gênero em 2017.
Dos 8 setores econômicos analisados pelo Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), do Ministério do Trabalho, 6 demitiram mais mulheres do que contrataram no ano passado.
O processo resultou em números expressivos no mercado formal. No ano, a criação de vagas ficou concentrada no gênero masculino:
entre os homens, o saldo ficou positivo: 21,6 mil contratações a mais do que demissões;
entre as mulheres, o saldo ficou negativo: 42,5 mil demissões a mais do que contratações.
O resultado foi de fechamento de 20,8 mil vagas em 2017.
Apesar de quase todos os setores terem privilegiado a mão de obra masculina, a discrepância é maior em 3 deles:
indústria de transformação: abertura de 7,2 mil vagas para homens e fechamento de 27,1 mil para mulheres;
comércio: abertura de 42,4 mil postos para homens e fechamento de 2,3 mil para mulheres;
serviços: abertura de 45,8 mil vagas para homens e fechamento de 8,8 mil para mulheres.
Juntos, eles representam 90% do saldo de vagas fechadas entre mulheres em 2017. A indústria de transformação, sozinha, concentra mais de 60% do total.
Na construção civil, onde cerca de 90% das vagas ofertadas são ocupadas por homens, houve fechamento de 5,3 mil vagas ente mulheres. O corte, entretanto, foi muito mais profundo entre o gênero masculino (-98,6 mil). Apenas no setor de administração pública os sinais foram inversos: foi registrado saldo positivo entre as mulheres e negativo entre os homens.
CRISE E PRECARIEDADE DO TRABALHO
Na visão dos especialistas, tanto fatores econômicos quanto sociais contribuíram para esse cenário. “Nas últimas décadas, houve crescimento da participação da mulher no mercado de trabalho. Essa inserção, entretanto, se deu de maneira precária. Em 1 momento de crise econômica não é de se estranhar que aqueles que estão em posição mais vulnerável sejam mais atingidos”, explicou Patrícia Bertolin Tuma, professora de Direito do Mackenzie e especialista em Sociologia do Trabalho.
Segundo informações da Rais (Relação Anual de Informações Sociais), em 2016, 20,2 milhões de mulheres estavam empregadas, o que representa 44% da força de trabalho do país. Há 10 anos, a participação era de 40%. Na década de 80, era de cerca de 25%. “Todas as formas de inserção precária encontram mais espaço entre mulheres pelo fato de elas terem entrado no mercado de trabalho sem deixar as tarefas domésticas”, defende.
Mauro Rochlin, professor dos MBAs da FGV, acrescenta que, no ano, foi observada uma recuperação mais lenta de setores que tradicionalmente contratam mais mulheres do que homens. “O setor de serviços é 1 ótimo exemplo da influência do desempenho econômico. No setor, há grande peso da mão de obra feminina e houve 1 fechamento expressivo de vagas.”
Ao apresentar os dados oficiais, o coordenador de Estatísticas do Trabalho do Ministério do Trabalho, Mário Magalhães, destacou que o cenário é explicado pela recuperação de atividades que tradicionalmente empregam mais homens. Nos últimos anos, foi observado fechamento generalizado de vagas (saldo de -1,3 milhão em 2016 e -1,5 milhão em 2017), mas com queda mais acentuada entre os homens.
“Se você olha os últimos anos, o emprego feminino caiu, mas caiu menos que o masculino. Agora, estamos vendo a recuperação de algumas atividades tipicamente masculinas”, afirmou.
“Há também a visão de que os homens ainda são os principais provedores da família. Isso leva as empresas a manterem mais esses profissionais. Além disso, pode haver uma escolha pessoal das famílias de as mulheres deixarem o mercado conforme a economia se recupera e os homens são reinseridos“, disse Sérgio Firpo, professor de Economia do Insper. Hoje, entretanto, 40% dos domicílios brasileiros são mantidos exclusivamente por mulheres, segundo dados de IBGE.
RAIO-X DOS SETORES
Na indústria de transformação, observou-se 1 fechamento mais intenso de vagas para mulheres em atividades relacionadas a vestuário, calçados e alimentos. Segundo o Ministério do Trabalho, essas são necessariamente as áreas onde há maior concentração de trabalho feminino.
“A participação das mulheres nesse setor tem aumentado nos últimos anos, mas observa-se que existe uma concentração da mão de obra feminina em algumas atividades específicas“, afirmou o ministério em nota. Hoje, elas representam cerca de 30% da mão de obra do setor.
Nos serviços, são observadas baixas intensas, por exemplo, nos subsetores de limpeza, teleatendimento e cabeleireiros. “O peso da questão econômica fica claro nessa análise“, diz Rochlin. “Há cortes grandes em atividades nas quais há concentração de mão de obra feminina.”
A representatividade feminina nos serviços é considerável. Dos 8 setores classificados, é o único em que a participação na força de trabalho se aproxima dos 50%.
Já no comércio, as maiores quedas são vistas nas atividades de venda de móveis, supermercados, artigos de vestuário e acessórios. A participação feminina nas vagas do setor é de 43%.
Fonte: Poder 360