A CPI da Covid entra na “segunda temporada” – como tem dito o o vice-presidente Randolfe Rodrigues (Rede-AP) –, nesta terça-feira (3). Em seu primeiro episódio após o recesso parlamentar, a comissão ouve o depoimento do denominado “reverendo” Amilton Gomes de Paula, personagem “obscuro”, presidente de uma entidade chamada Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários (Senah), da qual ninguém tinha ouvido falar até aparecer na comissão. Na quarta (4), deve ser ouvido o coronel Marcelo Blanco, da estrutura do Ministério da Saúde (MS) na gestão do general Eduardo Pazuello. Na quinta (5), o depoimento previsto é do empresário Airton Antonio Soligo, conhecido como Airton Cascavel, que seria ex-assessor especial da pasta e “braço direito” do ex-ministro.
Acompanhe a sessão desta terça
De acordo com reportagem da Agência Pública, a Senah presidida por Amilton de Paula “articulou a aquisição de vacinas (da AstraZeneca e da Johnson) com o Ministério da Saúde” e as doses seriam oferecidas a prefeituras e governos estaduais. O “reverendo” esteve no ministério em 4 de março de 2021, segundo fotos postadas por ele mesmo, que o mostram ao lado do policial militar Luiz Paulo Dominguetti Pereira no MS. Este último se diz representante da empresa Davati e afirma que o MS pediu propina de US$ 1 por dose para firmar a compra da vacina Astrazeneca.
Em outra imagem, o suposto religioso aparece ao lado do filho “Zero 1” do presidente da República, o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), que se tornou membro da CPI com a vaga aberta pela saída de Ciro Nogueira (PP-PI), ex-titular da comissão e agora nomeado ministro da Casa Civil por Jair Bolsonaro.
Durante oitiva no dia 15 de julho, Cristiano Carvalho, também autointitulado representante da Davati Medical Supply, disse que Amilton de Paula teria usado o Instituto Força Brasil (IFB) – uma entidade de extrema direita – como “intermediária” para chegar ao alto escalão do Ministério da Saúde. Segundo Carvalho, o IFB “foi o braço que a Senah utilizou para chegar frente a frente com o coronel Élcio Franco”, então secretário-executivo da pasta.
O vice-presidente do instituto, o empresário Otávio Fakhoury, é investigado em dois inquéritos no Supremo Tribunal Federal: sobre atos antidemocráticos e das fake news . Após a fala de Carvalho, Randolfe Rodrigues, afirmou que a comissão havia encontrado a ligação “entre o papel das fake news no agravamento da pandemia e a atuação de alguns destes personagens no apoiamento ao governo”.
Happy hour e vacina
Depoente de quarta-feira, o ex-assessor no Departamento de Logística do Ministério da Saúde Marcelo Blanco foi apontado pelo cabo da PM de Alfenas (MG) Luiz Paulo Dominguetti como participante de suposto esquema envolvendo propina. Dominguetti é outro improvável vendedor de vacinas como representante da Davati. Blanco participou da reunião informal em um restaurante de Brasília, onde teria encontrado o ex-diretor do departamento, Roberto Dias – que fora ao local tomar um chopp de fim de tarde – por acaso. Nesse encontro teria se dado o pedido de propina por 400 milhões de doses da vacina AstraZeneca que nunca existiram. A própria farmacêutica informou que não negocia com intermediários, mas só com governos.
E na quinta-feira a CPI ouve o ex-assessor especial de Eduardo Pazuello Airton Antônio Soligo, o “Cascavel”, apontado por integrantes da CPI como suposto lobbista de empresas farmacêuticas e de fornecedoras de equipamentos médicos. Os senadores consideram grave que uma figura com essas características, um assessor informal do ministro, fizesse parte da estrutura da pasta e querem saber quais suas reais funções.
De Rancho Queimado à Índia
A quebra do sigilo telefônico da diretora da Precisa Medicamentos, Emanuela Medrades, determinada pela CPI da Covid, revelou oito ligações de um telefone usado por um oficial da Marinha, um capitão de -mar e guerra com cargo de gerência no Ministério da Defesa e quatro ligações do senador Luis Carlos Heinze (PP-RS), segundo a Folha de S. Paulo.
Heinze, membro da tropa de choque bolsonarista na CPI, se tornou conhecido por seu fanatismo na defesa da cloroquina e do “kit covid”, e também por citar a cidade Rancho Queimado (SC), de cerca de 2,8 mil habitantes, como um exemplo de sucesso no uso desse tratamento, o que é falso. Emanuela foi procurada antes do escândalo da Covaxin. O contrato entre a fabricante da vacina, a farmacêutica indiana Bharat Biotech, envolvia R$ 1,61 bilhão para a compra de 20 milhões de doses. O entendimento previa pagamento adiantado de 45 milhões de dólares a uma empresa sediada em Singapura, a Madison Biotech, classificada pela CPI como uma empresa de fachada.
Fonte: Rede Brasil Atual