Com seus gestos fascistas e dementes – como participar neste domingo (15) de um ato em frente ao Palácio do Planalto pelo fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal (STF) em plena pandemia do coronavírus –, o “capetão” Jair Bolsonaro vai despertando forças mais amplas de oposição. Aos poucos, após certa letargia, vários setores se articulam para deter a cavalgada autoritária no País. Na semana passada, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e a Comissão Arns divulgaram um manifesto “em defesa da democracia”.
O texto unitário é um alerta sobre a urgência de “neutralizar as ameaças às instituições” democráticas. Ele volta a unir entidades da sociedade civil que tiveram um peso decisivo na luta contra a ditadura militar e na campanha pelas Diretas-Já nos anos 1980. O manifesto é assinado por Dom Walmor Oliveira de Azevedo, presidente da CNBB, Felipe Santa Cruz, presidente da OAB, Paulo Jeronimo, presidente da ABI, e José Carlos Dias, presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns – Comissão Arns.
Governadores se articulam contra Bolsonaro
Com caráter distinto, outro manifesto já havia evidenciado o crescente isolamento político do “capetão”. Em meados de fevereiro, governadores de 20 estados divulgaram um texto cobrando “equilíbrio, sensatez e diálogo” do presidente da República. O documento foi uma reação conjunta às provocações de Jair Bolsonaro contra o governador da Bahia, Rui Costa (PT), quando da morte do miliciano Adriano da Nóbrega – conhecido amigo do clã Bolsonaro. Por motivações diferentes, o manifesto teve adesão dos governadores progressistas do Nordeste e até de direitistas como João Doria (PSDB-SP) e Wilson Witzel (PSC-RJ).
O manifesto expressou as relações tensas entre o presidente e os governadores desde o início dos seus mandatos – como no episódio em que o fascista tentou jogar a culpa pelo preço da gasolina no ICMS cobrado pelos Estados ou quando chamou preconceituosamente os governadores nordestinos de “paraíbas”. Nestas duas ocasiões, também foram produzidos documentos com críticas ao “capetão”. No manifesto de fevereiro, porém, a oposição se ampliou – só os governadores do PSL e o “vaiado” Ronaldo Caiado (DEM-GO) ficaram de fora. Isso evidencia o isolamento do fascista – o que talvez ajude a explicar a sua insana radicalização.
Reproduzo abaixo os dois manifestos:
Manifesto da CNBB, OAB, ABI e Comissão Arns
Em defesa da democracia – É urgente neutralizar as ameaças às instituições
Constitui objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, entre outros, “construir uma sociedade livre, justa e solidária, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
Isto está escrito com todas as letras na nossa Constituição Federal de 1988 e é aspiração do povo brasileiro.
É preciso reafirmar, no momento atual do país, com todas as nossas forças, que a democracia é o único regime político capaz de implementar a sociedade prevista na Carta Cidadã.
A democracia, considerados seus próprios limites, é um dom a ser desdobrado em valores e dinâmicas que garantam a participação, a liberdade e o incondicional respeito aos princípios de defesa da vida e da dignidade de toda pessoa humana.
Por isso, é incontestável e merece defesa a democracia no Brasil, fruto sofrido e amadurecido da redemocratização inspirada na ação de destacados atores políticos, aos quais reverenciamos; entre eles, um povo que soube reconquistar a liberdade e os direitos confiscados.
Foi esse povo que também legitimou, por lutas sociais, os direitos cidadãos registrados na Carta Magna de 1988, comprometendo a todos na sua obediência irrestrita e práticas transformadoras, pelo dever cidadão da edificação de nossa sociedade sobre os alicerces da igualdade e da solidariedade, garantindo o tratamento de todos como iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza.
O Brasil, por seus Três Poderes, segmentos e cidadãos todos, no horizonte e nos parâmetros sacramentados pela Constituição Federal, sobre os alicerces do Estado democrático de Direito, não pode permitir o enfraquecimento de suas instituições democráticas de poder-serviço, garantindo equilíbrio entre os Poderes da República, considerados, especialmente, o papel institucional do Poder Executivo, do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal, sem os quais a democracia mergulhará na escuridão e se pagará um preço ainda mais alto. Os Poderes exercem funções diferentes, mas nenhum é maior que outro.
Sem eles, não há democracia.
É necessário e urgente, por uma lúcida compreensão e práticas democráticas, neutralizar e vencer as ameaças a essas instituições, pela obrigação moral de todos de defendê-las e fortalecê-las.
Não se pode, absolutamente, fomentar o risco de levar os brasileiros ao caos do enfraquecimento e até à destruição da nossa democracia.
É no Estado democrático de Direito que se vai avançar na urgente busca do indispensável equilíbrio para a sociedade brasileira, detentora de todos os recursos para a superação dos vergonhosos cenários de misérias, com tanta pobreza, corrupção, privilégios, milhões de desempregados, com situações de crises humanitárias, exigindo velocidade e lucidez em respostas novas na economia, na educação e na saúde; avançar por meio de posturas adequadas no tratamento do meio ambiente, já tão pressionado pelos interesses econômicos; e avançar no cuidado prioritário dos pobres e pela exemplaridade responsável no exercício da política.
Por isso, preocupados com os riscos do clima de afrontas e de fomento à intolerância, juntamos forças em nossas entidades para levar esta mensagem ao povo brasileiro.
Marcados pelo sentido da solidariedade, sintam-se todos convocados a gestos e compromissos com a vida, superando bravamente as crises humanitárias, efetivando ações que façam o conjunto da sociedade brasileira trilhar os caminhos da Justiça, com lógicas e dinâmicas novas, na verdade e pela paz!
– Dom Walmor Oliveira de Azevedo – Arcebispo de Belo Horizonte e presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil);
– Felipe Santa Cruz – Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB);
– José Carlos Dias – Presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns – Comissão Arns;
– Paulo Jeronimo de Souza – Presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI)
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Manifesto dos governadores
Recentes declarações do presidente da República, Jair Bolsonaro, confrontando governadores, ora envolvendo a necessidade de reforma tributária, sem expressamente abordar o tema, mas apenas desafiando Governadores a reduzir impostos vitais para a sobrevivência dos Estados, ora se antecipando a investigações policiais para atribuir fatos graves à conduta das polícias e de seus Governadores, não contribuem para a evolução da democracia no Brasil.
É preciso observar os limites institucionais com a responsabilidade que nossos mandatos exigem. Equilíbrio, sensatez e diálogo para entendimentos na pauta de interesse do povo é o que a sociedade espera de nós.
Trabalhando unidos conseguiremos contribuir para melhorar a qualidade de vida dos brasileiros, pela redução da desigualdade social e pela busca por prosperidade econômica. Juntos podemos atuar pelo bem do Brasil e dos brasileiros.
Nesse sentido, convidamos o Senhor Presidente da República para o próximo Fórum Nacional de Governadores, a ser realizado em 14 de abril do ano em curso
– A carta é assinada por Gladson Cameli (PP-AC), Renan Filho (MDB-AL), Waldez Góes (PDT-AP), Wilson Lima (PR-AM), Rui Costa (PT-BA), Camilo Santana (PT-CE), Ibaneis Rocha (MDB-DF), Renato Casagrande (PSB-ES), Flávio Dino (PCdoB-MA), Reinaldo Azambuja (PSDB-MS), Romeu Zema (Novo-MG), Helder Barbalho (MDB-PA), João Azevêdo (Cidadania-PB), Paulo Câmara (PSB-PE), Wellington Dias (PT-PI), Wilson Witzel (PSC-RJ), Fátima Bezerra (PT-RN), Eduardo Leite (PSDB-RS), João Doria (PSDB-SP) e Belivaldo Chagas (PSD-SE).
Altamiro Borges é jornalista e presidente do Centro de Estudos de Mídia Alternativa Barão de Itararé