Por José Aparecido Pereira
Na minha infância era comum falarmos do saci. Fez parte das nossa cultura popular e hoje abandonada.
Tive um amigo que aos sete anos a coisa que ele mais desejava era uma calça comprida. O Gugu. Mas ele não tinha idade e implora daqui e implora dali conseguiu que a mãe comprasse um corte de tecido (vai vendo) e depois de levar na costureira a Dona Amélia fez a tão sonhada calça comprida para o Gugu. Pronto. Agora faltava pouco para ser homem feito. Domingo iria na missa.
A mãe do Gugu lavou a calça sem mesmo ele te-la usado pois tinha a questão de encolhe não encolhe o tecido. Pronto. Lavou, estendeu no varal e foi descansar a tarde. 18 horas o saci, que já estava na espreita, foi até o varal e num pulo só pegou a calça. Deu um nó. Mas um nó bem dado nas duas pernas. Um nó cego. Um nó que ninguém conseguiu desatar.
Chamaram a vizinhança: nada. Chamaram o Sete Boia. Sete Boia não apresentei para vocês. Sete Boia era o único policial militar no bairro. Gente fina. Prestativo. Andava de lambreta para baixo e para cima. Sete Boia era gordinho. Acho que por isso chamavam-no de Sete Boia. E ele atendia. Não ligava. Tanto que atendeu o pedido: – Sete Boia, pelo amor de Deus, veja se você consegue desatar os nós dessa calça do Gugu.
Sete Boia não entendeu porque tanta marvadeza fizeram com a calça e quando soube que era do Gugu aí então fez de tudo. Puxa daqui, tenta de lá fez tanta força que acabou até peidando. Ninguém ligou. E Sete Boia também não conseguiu.
Lembraram da Vó Catarina. Sim a vó de Zezé. Se ela não conseguir podem esquecer. A vó veio. Vieram minhas primaradas todas como testemunhas. Mas que nada. Vó rezou, benzeu. Com dois eu te vejo mas com tres eu te espanto: Em nome do Pai do Filho e do Espírito Santo. E nada.
Tava feito a tristeza geral. O Saci, quem sabe pelas bandas, ria que só. Gugu desesperado chorava feito homem mesmo ainda não ter experimentado a tão sonhada calça comprida. A vizinhança fez o pelo sinal. Sete Boia abraçou o Gugu como que num conforto e depois montou na sua Lambreta verde e branca e saiu suavemente. Vó Catarina, brava não se conformava de ter perdido a parada. Minhas primas riam baixinho.
Gugu chamou-me num canto e com voz chorosa mas firme prometeu:
– Zezé. Escuta o que estou te dizendo: vou pegar esse Saci e passar uma rasteira tão bem dada que ele vai se arrepender de ter nascido.
Quem sabe o Saci estava por ali como eu imaginava. E, quem sabe ouviu as ameaças de Gugu.
Vai daqui vai de lá uma bela tarde eu e Gugu cruzamos com o Saci. Só vi uma boina vermelha cair de lado no pó da terra. Gugu tinha cumprido a promessa. Nem Pastinha sabia aplicar pernada tão bem como Gugu. Vocês sabem quem foi Pastinha num é mesmo? Não ? Pastinha foi um dos maiores capoeiristas que o Brasil conheceu. Mas aí a história encomprida demais. Importante é que Gugu virou homem de verdade. E o saci continua solto por aí.
P.S Para Edvaldo com carinho. Para Suassuna com quem aprendi um pouco mais da nossa cultura. Para minha vó.( quem tem vó não sofre).
Rita De c v gava
…as histórias que faziam parte da infância
Saci estava em muitas delas..Como nos medos infantis