
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Por Sebastião Moura (Jornal da USP)
Um levantamento do Laboratório Espaço Público e Direito à Cidade (LabCidade) – grupo da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP que trabalha com monitoramento de políticas públicas e pesquisas urbanas – verificou que, mesmo com o avanço da vacinação em mais faixas etárias e a adição de outras categorias profissionais nas prioridades, o número de pessoas imunizadas em alguns lugares da metrópole, como nas periferias, continua muito baixo. Situações similares de desigualdade também foram encontradas em alguns municípios da Região Metropolitana, como Mauá e Santo André.
Os pesquisadores cruzaram dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), da Central de Dados do Estado de São Paulo e do DataSUS para descobrir a porcentagem de pessoas já vacinadas de cada região com idades entre 40 e 59 anos (faixa que passou a poder se vacinar no período desde a ampliação das idades em 9 de junho até 12 de julho).
Os resultados mostraram que algumas áreas, mais especificamente territórios centrais ao norte do centro da cidade de São Paulo, região de Paraisópolis e bairros periféricos, como Capão Redondo, Cidade Tiradentes e Jardim Helena, têm um porcentual de vacinação baixo ou muito baixo, chegando a só 10%, em alguns casos, enquanto há bairros ricos do centro onde mais de 70% da população nessa faixa etária já se vacinou.
De acordo com Paula Freire Santoro, professora de Arquitetura e Urbanismo da FAU e co-coordenadora do LabCidade, são várias as possíveis razões para explicar a baixa adesão à vacina nessas regiões, que vão desde dificuldades de acesso aos postos de saúde e de comprovação de residência, obstáculos criados pela rotina de trabalho, desinformação e até negacionismo e falta de confiança na vacina.
Apesar de dados recentes do Datafolha terem apontado que a adesão à vacina no Brasil chegou a 94% no começo de julho, a pesquisa mostra que esta adesão não ocorre de forma homogênea no território.
Quaisquer que sejam os obstáculos, eles podem e devem ser enfrentados através da própria política municipal de vacinação, por meio de campanhas de conscientização (não só sobre a segurança e necessidade da vacina, mas combatendo percepções populares como a de que quem já teve a doença está imune ou de que a segunda dose é desnecessária); ampliação de postos de vacinação volantes, postos de vacinação em terminais de ônibus e estações do Metrô com grande circulação de pessoas; vacinação porta a porta em determinados locais, voltada às pessoas cadastradas pela estratégia de Saúde da Família e que ainda não foram se vacinar, entre outras medidas que garantam uma vacinação mais homogênea.
Desde o começo da crise da covid-19, o LabCidade tem feito diversas pesquisas, realizando o que a pesquisadora descreve como “cartografia da pandemia”, mostrando sua complexidade e a necessidade de um enfrentamento a partir de várias políticas territorializadas. Já em maio, o laboratório publicou um relatório alertando para o fato de que a ordem de vacinação por idade, com poucos critérios adicionais de priorização, reproduziu desigualdades: foi beneficiado principalmente o centro expandido, majoritariamente ocupado por população com maior expectativa de vida, e negligenciadas as periferias, mais jovens, onde mora a maior parte da população negra da cidade, e grande parte da força de trabalho, inclusive dos serviços essenciais, que não pararam durante a pandemia e, logo, ficaram mais vulneráveis ao vírus.
Esse novo levantamento publicado agora – além de acompanhar o desenrolar da vacinação e averiguar que a expectativa de que a ampliação das idades e adição de novas categorias prioritárias na imunização levaria à cobertura desses territórios negligenciados e que, a princípio, ainda não se cumpriu – expandiu a análise para a região metropolitana de São Paulo, incluindo mais municípios, além da capital.
Algumas cidades, como Mauá e Santo André, acompanharam a tendência desigual da capital. Por outro lado, municípios como Osasco e Diadema parecem ter conseguido uma vacinação bem mais homogênea. Estes, por exemplo, incorporaram em suas prioridades categorias ainda não vacinadas na capital, como garis e funcionários de limpeza pública.
Tais resultados apontam mais uma vez para a necessidade de que as respostas à covid-19 sejam territorializadas, reconhecendo que a pandemia não afetou todas as regiões igualmente e que cada lugar precisa de uma política de saúde específica.
Fonte: Jornal da USP
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