Entre as principais razões para a queda do trânsito, em horário de pico, na cidade de São Paulo pelo terceiro ano seguido seria a crise.
O trânsito melhorou pelo terceiro ano consecutivo na cidade de São Paulo nos chamados horários de pico, a despeito do contínuo crescimento da frota de veículos.
A média dos congestionamentos no período da manhã caiu dos 81 km verificados em 2016 para 66 km no ano passado, de acordo com as medições da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego). Uma redução de 19%. À tarde, a queda no índice de lentidão foi ainda maior, de 21% (109 km para 86 km).
Os dados são ainda mais relevantes se comparados com o ano de 2014, quando a capital paulista teve, em média, 30 km a mais de engarrafamento das 7h às 10h, e 55 km a mais das 17h às 20h.
Mas o que explica essa redução grande no trânsito se, de dezembro de 2014 para cá, a frota de veículos aumentou em 715 mil veículos (9%)? “A crise econômica diminuiu os congestionamentos”, afirma o arquiteto e urbanista Flamínio Fichmann, consultor na área de transportes.
O país enfrentou nos últimos anos a maior recessão de sua história. O desemprego explodiu na região metropolitana de São Paulo, passando de 11% (em 2014) para os 18% verificados em dezembro do ano passado.
Fichmann explica que a principal motivação para as pessoas deixarem suas casas é justamente o trabalho —46% das viagens ocorrem por essa razão. A segunda é a educação, com 32% (segundo dados de pesquisa de mobilidade feita em 2012 pelo Metrô de SP). “Com menos gente empregada, houve uma queda acentuada na necessidade de deslocamento”, diz o consultor.
O engenheiro Ailton Brasiliense Pires, ex-comandante da CET e atual presidente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), tem a mesma opinião. “O que mais pesa, no final das contas, é a economia”, afirma.
OUTRAS ÉPOCAS
Já houve tempos na história paulistana, entretanto, em que, mesmo com a economia em alta, ocorreram melhoras nos índices de trânsito. O país estava crescendo bem nos anos 2010 e 2011, chegando a alcançar o posto de sexta maior economia do mundo —ultrapassara o Reino Unido. A taxa de desemprego em São Paulo diminuíra de 14% (2009) para 11% (2011).
Mesmo assim, contrariando a lógica, a lentidão no tráfego sofreu naquele período uma redução de 84 km (2009) para 80 km no pico da manhã (2011) e, respectivamente, de 131 km para 108 km à tarde. A explicação sugere que existe, sim, saída para a lentidão no trânsito, para além das oscilações econômicas.
Naquela época, houve a ampliação da rede do metrô e a reforma de diferentes estações de trens da CPTM, o que turbinou a utilização do transporte coletivo na cidade. Ocorreu ainda a implantação de uma política de restrição à circulação de caminhões na marginal Pinheiros.
O atual presidente da CET, João Octaviano, vinculado à gestão do prefeito João Doria (PSDB), diz que situação semelhante aconteceu no ano passado. “Fizemos grande investimento na fiscalização. O desemprego melhorou o trânsito em 2016, mas agora o maior responsável foi a reorganização do trabalho da CET.”
Octaviano diz que o aumento do efetivo da empresa, a recolocação das equipes em áreas críticas e a melhora no serviço de guincho provocaram impacto no trânsito. “Estamos inibindo as infrações e aumentando a fluidez.”
NOVAS TECNOLOGIAS
O consultor Fichmann não cita a mudança na CET, mas afirma que outros fatores estão influenciando a melhora do trânsito, além da crise.
“Com a disseminação das novas tecnologias, está caindo a demanda por viagens”, afirma, mencionando por exemplo a viabilidade de se realizar reuniões à distância e fazer compras pela internet.
Segundo ele, aplicativos que informam o melhor caminho ao motorista também ajudam, embora tenham um efeito colateral indesejado. “Despejam veículos nos chamados sistemas viários locais, que não foram capacitados para receber esse aumento do tráfego”, afirma.
Fichmann diz, por outro lado, não acreditar que modelos como o da Uber, por exemplo, estejam contribuindo de modo significativo para a melhoria do trânsito. “Não houve um aumento do índice de passageiro por automóvel.”
Brasiliense tem uma visão mais pessimista em relação ao impacto do uso das novas tecnologias na redução dos congestionamentos. Considera que o efeito é mínimo. “São Paulo precisa mesmo é ampliar muito o metrô e os corredores de ônibus e parar de fazer loteamentos na periferia, que obrigam a população a fazer deslocamentos enormes”, diz. “Do jeito que vai, com a retomada da economia, só rezando vai dar para enfrentar o trânsito.”
Hoje, em São Paulo, sob a gestão do governador Geraldo Alckmin (PSDB), que deve ser o candidato do partido à Presidência da República, todas obras de expansão de linhas do metrô estão com seus cronogramas atrasados.
Último exemplo disso é a linha 6-laranja, que ligará a Brasilândia, no extremo norte, ao centro da cidade. O consórcio responsável pela obra não conseguiu crédito no mercado, e o governo do estado agora trabalha para a quebra do contrato e uma nova licitação para o trecho.
Fonte: Folha SP