As conquistas e os avanços proporcionados pela Consolidação das Leis do Trabalho no Brasil estiveram em discussão nesta quinta-feira (4) no Seminário 80 anos da CLT – Dignidade e Justiça Social. Representantes de trabalhadores por aplicativo, rurais e empregadas domésticas apresentaram os desafios dos setores.
Trabalho “gasoso”
“O clima é de festa, estamos comemorando os 80 anos da CLT, mas poderia ser outro também: a gente está prestes a ver a CLT desaparecer”, afirmou Paulo Roberto da Silva Lima, ativista do Movimento Social de Trabalhadores em Aplicativos. Conhecido como Galo, ele se apresenta como representante da política de rua, que, segundo ele, deve estar alinhada com a política institucional, para conseguir organizar a luta de pessoas que vivem o trabalho em estado ”gasoso, precarizado com atuais formatos”.
Para Galo, a criação da CLT refletia o estado “sólido” do trabalho, com a força sindical tendo espaço para conversar e definir caminhos junto à categoria e aos empregadores. A terceirização marcou o trabalho “líquido”, e, atualmente, entramos no estado “gasoso”.
“Estamos vivendo o desdobramento da revolução industrial, que é a revolução digital, uma nova tecnologia de trabalho com aplicativos operados por empresas clandestinas, que estão fora da lei”, disse. Como exemplo, citou a atividade dos motoboys, que se consolidou em um momento frágil da CLT, em que “precarização é considerada empreendedorismo”.
Neste contexto, Galo entende ser possível que trabalhadores não queiram a carteira de trabalho, levando em consideração “o processo de alienação e a ofensiva dos patrões em diminuir os direitos”.
Exclusão
O sentimento de exclusão também foi compartilhado pela coordenadora-geral da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas, Luiza Batista Pereira. Ela citou que, apenas em 2013, com a Emenda Constitucional 72, e, depois com a Lei Complementar 150/2015, foram regulamentados direitos básicos da categoria, como o limite da jornada de trabalho e o pagamento de horas extras.
“É por isso que temos que estar nesses espaços, principalmente neste, da justiça social, e falarmos para os senhores, que são os operadores da lei e podem auxiliar para não sermos excluídas”, reforçou.
O ministro do TST Cláudio Brandão observou que, segundo dados da Organização Mundial do Trabalho (OIT), apenas 6% dos trabalhadores domésticos têm acesso à proteção social plena.
Resistência
No campo, a história vai além do reconhecimento das relações de trabalho. Para a presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Rondon do Pará, Maria Joel da Costa, ela envolve a luta e a resistência pela terra. Os números, segundo ela, devem abranger não só as mortes no Pará, mas a produção de alimentos a partir da reforma agrária, moradia, educação, emprego e renda. Maria Joel ressaltou que, após o assassinato de seu marido, passou a contar com proteção policial.
O ministro Brandão acrescentou que 21% da classe trabalhadora brasileira é do segmento rural, responsável pelos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros. Para ele, a participação dessas pessoas demonstra o protagonismo dos que, “de seu modo e a seu tempo, derramaram sangue, suor e lágrimas” por um direito mais inclusivo.
Consensos legaias
Na abertura do encontro, o ministro do TST Vieira de Mello Filho destacou o significado social do trabalho para além da ideia formalista. “Trago no meu coração e na minha mente a ideia de um país mais justo, em que as pessoas tenham um futuro. A CLT rompeu, em 1943, com o positivismo legalista. Ela criou a possibilidade de os juízes do trabalho para acompanharem as transformações sociais com eticidade das relações.
Para o secretário-executivo do Ministério do Trabalho e Emprego, Francisco Macena da Silva, a discussão deve ser integrada para conferir segurança jurídica a todas as partes, estabelecendo conceitos apropriados e consensos legais para ações efetivas e políticas perenes diante de um mundo globalizado.
“Temos a melhor legislação da América Latina e do mundo, com uma base sólida e experimentada, e temos que partir dela para atualizá-la e não perder o que já há garantido. E, ao mesmo tempo que estamos enfrentando novos desafios, também temos coisas a serem resolvidas que há décadas não conseguimos superar”, declarou, citando o exemplo dos 2 mil trabalhadores resgatados em condições análogas à escravidão este ano.
Comprometimento
Ao final das apresentações da manhã, o presidente do TST, ministro Lelio Bentes, questionou integrantes da magistratura e do Ministério Público e servidores da Justiça do Trabalho o que pretendem fazer diante dessas informações. “Temos a oportunidade histórica de ouvir a sabedoria de quem lida no dia a dia com as matérias que conhecemos pela tela fria dos computadores”, frisou, convidando todos ao profundo comprometimento com a Justiça Social.