Interessante estudo do economista Leonardo Monasterio, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), liga origem do sobrenome a tamanho do salário no Brasil.
O estudo mostrou que, entre os 46,8 milhões de trabalhadores do setor privado, os que tem sobrenome de ancestralidade germânica, por exemplo, recebe, em média, um salário 8% maior que uma pessoa branca com sobrenome ibérico. Os de origem japonesa, por sua vez, recebem 16,8% mais que os indivíduos brancos com sobrenomes portugueses e espanhóis. Pardos, negros e índios, conforme a já conhecida desigualdade racial que persiste no país, ganham quase três vezes menos que os descendentes de japoneses. Além de ganharem mais, trabalhadores brasileiros que têm ao menos um sobrenome japonês, italiano, alemão ou do Leste Europeu, apresentam escolaridade ligeiramente maior do que os portadores de nomes de famílias ibéricas, originárias de Portugal ou da Espanha.
Sobrenome luso não implica necessariamente ser filho, neto ou bisneto de portugueses
Determinar a ancestralidade de um indivíduo não é tão simples, nem pode se resumir ao sobrenome. O maior desafio do estudo foi associar os sobrenomes ibéricos ao fluxo migratório de portugueses ou espanhóis para o Brasil. Além de abarcar indivíduos brancos que realmente descendem de imigrantes portugueses e espanhóis, essa classificação também inclui negros, pardos e indígenas cujas famílias foram provavelmente obrigadas a adotar um sobrenome ibérico no passado. Portanto, no Brasil, ser dono de um sobrenome tipicamente luso, como Silva ou Oliveira, não implica necessariamente ser filho, neto ou bisneto de portugueses. Para separar os donos de sobrenomes ibéricos que são brancos, e descendem de europeus, dos que são negros e pardos, cujos ancestrais africanos foram trazidos à força e escravizados no Brasil, o economista teve de adicionar o critério da cor/raça na Rais.
Mais de 21,0 milhões de Silvas, Santos, Oliveiras, Souzas e Pereiras
A maior concentração de sobrenomes não ibéricos ocorre na região Sul do país. Já os nomes de origem portuguesa e espanhola aparecem mais no Nordeste e no Norte. São Paulo, onde, em média, se paga os maiores salários do país, tem uma grande concentração de descendentes de japoneses.
Os 46,8 milhões de trabalhadores registrados na Rais carregam 531.009 sobrenomes distintos. A imensa maioria tem nomes de família oriundos da Península Ibérica, portuguesa ou espanhola. Como o Brasil não recebe grandes fluxos migratórios há mais de um século, a presença atual de sobrenomes de outros países é modesta.
Os cinco sobrenomes mais frequentes no Brasil, Silva, Santos, Oliveira, Souza e Pereira, somam mais de 21,0 milhões dos 46,8 milhões de registros da Rais. Por outro lado existem mais de 204 mil sobrenomes registrados apenas uma vez.
Disparidade histórica
Filho de boliviano a questão levantada por Monasterio é se os descendentes atuais dos imigrantes europeus e japoneses que aqui chegaram entre as últimas décadas do século XIX e as primeiras do XX usufruem ainda hoje de vantagens econômicas e educacionais associadas à sua ancestralidade. Entre o final do século XIX e o início do XX, a chegada ao Brasil de imigrantes europeus e japoneses fez parte de uma política de Estado que visou substituir a antiga mão de obra negra e escrava, ou que tinha sido libertada havia pouco tempo, por trabalhadores brancos. Isso pode ter contribuído significativamente para a desigualdade constatada. Segundo o economista “Na época, os imigrantes eram mais alfabetizados do que os brasileiros e uma parte deles recebeu subsídios”.
As principais fontes históricas de ancestralidade dos migrantes pesquisadas foram os registros do Museu da Imigração do Estado de São Paulo e os microdados dos censos históricos norte-americanos.
O estudo aponta que pesquisas censitárias oficiais no Brasil não cobrem informações sobre a ancestralidade da população e conclui: “No futuro, a combinação desta literatura e de tais informações com a análise da ancestralidade dos sobrenomes dos brasileiros tem o potencial de iluminar questões sociais, econômicas e de saúde pública”.
Fonte: IPEA