PUBLICADO EM 09 de ago de 2022
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Senadores decidem cobrar McDonald’s sobre denúncias de racismo e assédio sexual durante audiência pública

Sessão pública realizada nesta segunda-feira. Foto: GAY BLOG BR by SCRUFF

Na manhã dessa segunda-feira (08/08), a Comissão de Direitos Humanos do Senado realizou a audiência pública “O Impacto da Reforma Trabalhista no Cotidiano de Trabalhadoras e Trabalhadores de Fast-Food”, convocada pelo senador Humberto Costa e presidida pelo senador Paulo Paim, para discutir as situações de trabalho de jovens em redes de fast-food. Ex-trabalhadores do McDonald’s no Brasil e no Chile participaram da audiência e relataram casos de assédio sexual, assédio moral e racismo nas dependências da empresa. Paulo Paim ficou impressionado com os relatos e prometeu convocar novamente os representantes do McDonald’s no Brasil, que nesta segunda-feira limitaram-se a encaminhar uma carta aos senadores.

“Vamos encaminhar os relatos dos trabalhadores para o Ministério Público do Trabalho, a Defensoria Pública e fiscais do trabalho” afirmou o senador Paim. A sessão também contou com a participação da senadora Zenaide Maia e foi gravada na íntegra pela TV Senado, podendo ser acessada no YouTube.

Nos últimos anos, o McDonald’s tem convivido com uma série de denúncias de assédio sexual, assédio moral e racismo em suas unidades. O novo presidente da empresa, Rogério Barreira, foi convocado para explicar as péssimas condições de trabalho na rede, mas não compareceu. Em carta, Marlene Fernandez, vice-presidente de Relações Governamentais da Arcos Dorados, maior franquia do McDonald’s no Brasil e no mundo, declinou “respeitosamente” ao convite para participar da audiência. Para o senador Paim, “a carta justifica a não presença, mas não responde às perguntas que ficaram no ar”.

Rafael Guerra, coordenador da campanha Sem Direitos Não É Legal, movimento que faz parte de uma iniciativa global pelos direitos dos trabalhadores do McDonald’s, afirmou que há uma prática sistemática de assédio dentro das lojas em todo o Brasil. “Se você olhar para as denúncias de Curitiba, Manaus, Brasília ou Florianópolis, elas são todas muito parecidas. Parece que o McDonald’s é gerido no país inteiro por um mesmo gerente, mas sabemos que não é. Então tem algo errado aí, que precisa ser investigado”, declarou.

A advogada da SEIU (Service Employees International Union), Mary Joyce Carlson, entrou na audiência de forma remota, dos Estados Unidos, e apontou que o Brasil tem uma legislação importante no campo dos direitos humanos e trabalhistas, mas ainda é necessário intensificar esforços no país. “Há uma questão de necessidade, esses jovens precisam trabalhar para garantir o sustento de suas famílias. Muitos deles estão em seus primeiros empregos, mas será que essa é uma boa oportunidade de primeiro emprego? Os trabalhadores têm direito a um ambiente seguro e os consumidores têm o direito de serem atendidos por pessoas que estão em ambiente seguro. Conclamo os governos a darem um basta nessa situação”, afirmou.

Para o presidente da UGT (União Geral dos Trabalhadores), Ricardo Patah, é preciso conscientizar o trabalhador para impedir situações de assédio moral e sexual. “Os trabalhadores de fast food, além de serem a base da pirâmide, são os de maior vulnerabilidade. Muitas vezes, são assediados e, para manter o sustento da família, se submetem a situações absurdas. Temos que conscientizar o trabalhador, abrir diálogo com a empresa”, defendeu.

O presidente da Força Sindical, Miguel Tores, afirmou que “depois que esta reforma trabalhista foi aprovada, as negociações coletivas ficaram mais enfraquecidas, dificultando a garantia de direitos e condições dignas de trabalho para esta categoria dos trabalhadores do setor de fast-food e para todas as demais categorias”.

O Procurador do Trabalho Alberto Emiliano de Oliveira Neto, que acolheu as primeiras denúncias contra o McDonald’s em Curitiba, esteve presente e afirmou que as entidades sindicais têm cumprido uma função “importantíssima” nas últimas décadas, minimizando a “assimetria entre capital e trabalho”. E complementou: “não há que se falar em paz entre os povos sem a devida justiça social. É imprescindível que o estado brasileiro promova o diálogo social entre sindicato e trabalhadores. E é função do estado promover a liberdade sindical”.

Sindicalistas chilenas também compareceram à audiência para falar sobre melhores condições de trabalho para os funcionários de fast-food. Claudia Bustamante, presidente do sindicato interempresas “Sem Mais Precarização Laboral”, que representa trabalhadores do McDonald’s, Starbucks e Burger King, afirmou que o grupo está focado na elaboração de um protocolo que faça com que empresas multinacionais se comprometam a respeitar direitos fundamentais. “Parte do nosso plano é também sensibilizar a juventude trabalhadora”, complementa.

Depoimentos de ex-funcionários

Hildayane Saraiva Aragão, ex-trabalhadora do McDonald’s em Brasília, contou que sofreu discriminação pela aparência por parte dos gestores. “Eu tinha o sonho de me tornar anfitriã do restaurante, dava o máximo de mim para isso. Eu ia ser responsável por receber o presidente do Mc em uma visita, mas o gestor disse que eu não era apta para assumir o cargo por ser gorda demais. Ele falou que a anfitriã é o cartão postal da loja. Também ouvia que não era bonita o suficiente para ficar no balcão”, contou.

Outra ex-funcionária, Adriana Ribeiro, de apenas 22 anos, teve seu primeiro emprego no McDonald’s de Curitiba. Lá, sofreu abuso sexual quando um gerente tentou beijá-la, além de passar a mão no seu corpo e cabelo repetidas vezes. “Ele não me deixava passar batom porque falava que ficava com ereção. Dizia que eu era ‘muito gostosa’”, lamentou.

A drag queen Brityney Galanty trabalhou no McDonald’s em São Paulo durante pouco mais de um ano, onde sofreu discriminação em diversos momentos. “Nós temos o direito de trabalhar do jeito que a gente é. Erguer a cabeça e quebrar o armário, sem isso a gente não cresce”, destacou. Também acusa o McDonald’s de fazer com que seus funcionários trabalhassem mesmo com Covid-19 – denúncia comum a grande parte dos depoimentos da audiência.

Manifestação

Após a audiência, o movimento Sem Direitos Não É Legal organizou um ato em frente ao McDonald’s localizado no Eixo Monumental, em Brasília. A manifestação contou com a participação da Contracs/CUT (Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio e Serviços), SEIU, Força Sindical e Nova Central Sindical, além de ex-trabalhadores do McDonald’s de várias partes do Brasil e da delegação sindical chilena.

Casos no Brasil

No mês passado, um inquérito civil foi aberto na Procuradoria Regional do Trabalho da 12ª Região, em Florianópolis, Santa Catarina, após determinação do Procurador do Trabalho Dr. Luiz Carlos R. Ferreira. A denúncia aponta que gerentes ameaçavam seus subordinados de demissão caso fossem pegos em contato com seu sindicato e/ou movimentos de conscientização e combate ao assédio em prol dos trabalhadores de fast food, como a campanha Sem Direitos Não é Legal.  Uma audiência foi marcada para 18 de agosto.

No final de junho do ano passado, o Ministério Público do Trabalho também determinou abertura de inquérito civil para apurar denúncias de racismo e assédio moral e sexual contra a empresa no país. A decisão foi tomada pela Procuradoria Regional do Trabalho da 2ª Região, em São Paulo, que em despacho apontou a requisição de documentos e informações, depoimentos, certidões, perícias e demais diligências para análise e posterior apresentação de uma ação civil pública para apurar as responsabilidades da empresa.

Sobre a campanha Sem Direitos Não É Legal

A campanha “Sem Direitos Não É Legal” faz parte de uma iniciativa global pelos direitos dos trabalhadores do McDonald’s, que se concentra nas violações às leis brasileiras, práticas anticoncorrenciais de “social dumping” e desrespeito contínuo aos direitos trabalhistas básicos. A campanha luta por mais segurança no trabalho, no caso específico, as redes de fast-food; fim do acúmulo de funções, pagamento de insalubridade e combate ao assédio sexual e moral, ao racismo e à LGBTQIA+fobia. A iniciativa conta com o apoio das centrais sindicais UGT, CUT e apoio e conexão global com a União Internacional dos Trabalhadores da Alimentação (UITA) e com o sindicato norte-americano SEIU (Service Employees International Union).

Saiba mais sobre a campanha: Facebook | Instagram | Twitter

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