Mencionado constantemente como nome de destaque na campanha eleitoral do então candidato Jair Bolsonaro (ex-PSL e hoje PL) em 2018, em que ficou conhecido pelo apelido de “Posto Ipiranga”, o ministro da Economia, Paulo Guedes, tem sido apagado das menções do chefe do Executivo em meio aos discursos e agendas que miram o pleito de outubro deste ano.
Chamou a atenção nesse cenário, por exemplo, a ausência de Guedes do palanque de Bolsonaro quando a chapa foi oficialmente lançada pelo PL, no último dia 24, no Rio de Janeiro (RJ). O ministro não compareceu ao evento, cujo palco foi marcado inclusive pela presença de lideranças do centrão.
Um levantamento feito pelo portal Poder 360 comparou o discurso do presidente no evento do PL deste ano com a retórica adotada quando Bolsonaro se lançou candidato ao Planalto em 2018. Guedes esteve entre os nomes mais citados há quatro anos, mas, em 2022, a predominância foi para figuras políticas como a deputada e ex-ministra da Agricultura de seu governo, Tereza Cristina (PP-MS), figura de peso na bancada ruralista, e para o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), um dos principais líderes do centrão.
Para a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), não é possível separar o fracasso e o sumiço de Guedes da ascensão do centrão, grupo de direita liberal que é maioria no Congresso e controla o chamado “orçamento secreto”. A parlamentar entende que a musculatura política que o segmento adquiriu nos últimos anos ajudou a reduzir o poder e a influência do ministro da Economia junto ao presidente da República.
“É um governo que está terceirizado nas mãos de um setor fisiológico que tenta manter o governo para continuar mandando, mas, objetivamente, a tendência é um processo de demonstração que se faz com políticas de pequeno fôlego, que não resolvem o problema da população, e o governo se desmoralizou.
O ministro perdeu prestígio em meio ao conjunto de problemas que hoje marcam o cenário socioeconômico nacional. Destacam-se principalmente os índices históricos de desemprego, o descontrole inflacionário, o crescimento da miséria entre as faixas de renda menos favorecidas e a volta do país ao chamado “Mapa da Fome”, elaborado pela Organização das Nações Unidas para Alimentação da Agricultura (FAO). Diante de uma crise socioeconômica galopante, restou a Guedes a antipatia de distintos setores da economia.
Agenda
O ministro passou a incomodar também grupos neoliberais que esperavam uma agenda mais aprofundada do ponto de vista desse modelo econômico. Isso foi ampliando, aos poucos, o descrédito do mandatário junto a segmentos como o mercado financeiro, por exemplo.
Entre outras coisas, o então “Posto Ipiranga” de 2018 havia se comprometido a aprovar reformas de caráter estrutural, como a tributária, mas a pauta ainda não teve oxigênio suficiente para ir até o fim do trâmite legislativo e empacou no Congresso.
“Guedes não é um ministro habilidoso politicamente. Ele não sabe lidar com aquele jogo do centrão, do Congresso Nacional. Ele não é um economista tecnicamente competente, mesmo admitidas as premissas neoliberais”, observa professor Francisco Tavares, da Universidade Federal de Goiás (UFG), que se dedica a temas como sociologia fiscal, entre outros.
O ministro também havia dito, em 2018, que venderia todas as estatais do país. No entanto, para a felicidade de opositores e segmentos da sociedade civil do campo progressista, o governo não conseguiu avançar na cartilha para além da privatização da Eletrobras, que foi finalizada em junho deste ano a uma bagatela de R$ 33,7 bilhões.
“Em que pese o fato de não terem ocorrido privatizações significativas, o Estado tampouco investiu. A taxa de investimento público no Brasil é uma das menores de todos os tempos da nossa República”, acrescenta Tavares.
O professor Frederico Gonzaga Jayme, da Faculdade de Economia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), também avalia o mau desempenho do governo em outros aspectos: “Do ponto de vista econômico, o Paulo Guedes não conseguiu entregar absolutamente nada em termos minimamente sociais. Do ponto de vista dos interesses do grande capital, teve a reforma da Previdência, por exemplo, mas não foi ele que entregou, e sim o Congresso”, lembra.
Francisco Tavares pontua que o ministro da Economia também não conseguiu entregar para o próprio Bolsonaro resultados provisórios eleitoralmente vantajosos e medidas de curto prazo que pudessem impulsionar o governo mesmo sob a manutenção do receituário neoliberal.
“Nesse sentido, já não há mais nenhuma vantagem pro Bolsonaro em se utilizar desse nome. Ele [o presidente] consegue conquistar o latifúndio improdutivo por si só, por exemplo, e não precisa de uma figura que é politicamente desastrada e tecnicamente incompetente”, avalia o professor da UFG.
A jornada de Guedes no governo também foi marcada por episódios como a debandada ocorrida no ministério em outubro do ano passado, quando Bruno Funchal e Jeferson Bittencourt, então secretário especial do Tesouro e Orçamento e secretário do Tesouro Nacional, respectivamente, pediram exoneração dos cargos.
Pegaram o mesmo bonde a secretária-adjunta do Tesouro e Orçamento, Gildenora Dantas, e ainda o secretário-adjunto do Tesouro Nacional, Rafael Araújo, que também se demitiram. Apesar de os quatro terem alegado oficialmente motivações pessoais, a iniciativa foi associada à insatisfação do grupo com a má gestão fiscal do país. A questão já vinha sendo apontada nos bastidores como um dos principais pontos de descontentamento da equipe com a gestão.
O professor Frederico Gonzaga Jayme destaca o peso negativo que as políticas de Guedes tiveram no cenário nacional nos últimos tempos e qualifica a gestão como “desastrosa” em aspectos como inflação, políticas públicas e crescimento do Produto Interno Bruto (PIB).
“Nada deu certo do ponto de vista econômico, então, nada mais razoável também do que o Bolsonaro deixar um pouco de lado nesta eleição o Paulo Guedes, que não deu o retorno esperado, porque, obviamente, um governo de extrema direita precisaria de algum retorno que desse um verniz de razoabilidade ao governo, mas nada disso aconteceu”.
Jayme faz ainda uma ligação entre o ofuscamento de Guedes e as políticas apontadas como eleitoreiras das quais a gestão tem lançado mão neste momento que antecede o pleito de outubro. É o caso do aumento das parcelas do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600, da ampliação do valor do vale-gás e da criação de um benefício específico pra taxistas, todas elas válidas até o fim do ano.
“Com a popularidade muito baixa, é o momento de ele tentar fazer algum tipo de política de aumento do gasto público de uma maneira pouco comum na estrutura das regras vigentes, inclusive da Lei de Responsabilidade Fiscal, pra tentar reverter essa situação. Isso vai totalmente contra tudo o que propõe o Guedes, então, estrategicamente, é melhor que ele tente mantê-lo mais distante mesmo.”
Fonte: Brasil de Fato | Brasília (DF)