Escrevo este artigo no aniversário do suicídio do presidente Vargas, vítima de um golpe militar abortado pelo povo trabalhador que ocupou as ruas de todo Brasil para prantear seu presidente. A reação de fúria e a revolta dos manifestantes impediu a consumação golpista, garantiu o calendário eleitoral e a posse de JK vitorioso nas urnas com Jango eleito vice-presidente. Essa posse também esteve ameaçada por um golpe que fracassou graças ao contragolpe do general Lott, então ministro da Guerra.
Hoje, continuamos vivendo a escalada golpista promovida pelo próprio presidente da República e seus apoiadores. Bolsonaro está acuado e isolado pelo fracasso de seu governo e pela a ação criminosa na pandemia. A política econômica de Bolsonaro e de Guedes levou a um desastre econômico que agora cobra seu preço: inflação, carestia, dólar nas alturas, juros e miséria acelerada. O que assistimos é a fuga de investidores e capitais, a desconfiança generalizada e o medo de uma aventura golpista.
Já precificado, sobe o juro a longo prazo, com sua consequência imediata: o aumento do serviço da dívida pública que impede qualquer veleidade de superávit ou déficits menores. O próximo ano já é considerado um ano perdido com um crescimento pífio previsto de 1%.
O isolamento do presidente cresce em espiral. 7 partidos de centro-esquerda –PDT, PSB, Cidadania, PCdoB, PV, Rede e PT– assinaram nota em defesa da democracia e em solidariedade ao STF. Também PSDB, DEM e MDB, de centro-direita, firmaram nota de repúdio e apoio ao STF. Os governadores exigem respeito à Constituição e protestam contra o apoio de Bolsonaro à indisciplina nas polícias militares e às manifestações contra o STF convocadas por seus apoiadores. Em São Paulo, o governador João Doria afastou um coronel da PM que convocava para manifestações de 7 de setembro. Os mais importantes empresários, intelectuais e acadêmicos também prestam seu apoio ao STF e repudiam as ameaças e provocações.
As pesquisas refletem esse isolamento político e social: 58% dos cidadãos querem o impeachment de Bolsonaro; 64% desaprovam o governo; caem o prestígio, a reputação e a imagem das Forças Armadas, com as respostas “ótimo” e “bom” já empatando com as que assinalam “ruim” e “péssimo“.
Raiz da radicalização
A radicalização de Bolsonaro é fruto da certeza da derrota nas próximas eleições presidenciais, o que pode acontecer até no 1º turno, e do risco real de responder na Justiça por sua gestão na pandemia e no governo. Este risco se estende à sua família, particularmente ao seu filho senador Flávio Bolsonaro que, ultimamente, vem perdendo todos recursos na Justiça. As investigações sobre fake news e ameaças à ordem democrática podem atingir outro filho, o vereador Carlos Bolsonaro. A prisão de Roberto Jefferson espalhou o pânico na família Bolsonaro.
Abandonado pelos seus aliados do golpe de 2016 e da campanha de 2018, da Lava Jato, das reformas ultraliberais, e pelo seu próprio vice-presidente Hamilton Mourão, resta a Bolsonaro o recurso às suas bases armadas e radicalizadas, violentas, ao incitamento à insubordinação das PMs e, no limite, de setores das Forças Armadas que poderiam lhe apoiar. O que, a cada dia, parece mais improvável ainda que não impossível pela experiência histórica recente.
No fundo, o presidente está na defensiva e sua última trincheira é a tentativa de impor o medo à sociedade e pressionar as instituições para conseguir um salvo-conduto no futuro. O risco é os bolsonaristas transformarem as manifestações de 7 de setembro –convocadas por eles para defender o governo e pelas frentes populares e partidos de oposição para pedir o impeachment de Bolsonaro e defender a democracia– em um dia de violência e vandalismo. O que pretendem é criar condições para alegar motivos legais e factuais para acionar o artigo 142 da Constituição Federal e pedir intervenção militar para garantir a lei e a ordem. Lei e ordem que estão ameaçadas apenas pelo próprio Bolsonaro e sua horda de milicianos e apoiadores armados.
A resposta que a sociedade deve dar é ocupar as ruas dia 7 de setembro em defesa da democracia e da Constituição de 1988, sem abrir mão do Fora Bolsonaro. Nunca houveram tantas razões legais e políticas para o afastamento do presidente. Os manifestantes de oposição precisam ir à luta sem medo, mas conscientes dos riscos de provocações e infiltrações. Precisam estar organizados para afastar estes riscos e garantir o caráter pacifico e democrático de nossas manifestações.
É hora de resistir a toda tentativa de golpismo e não vacilar em punir aqueles que atentam contra a Constituição. Não podemos, em hipótese alguma, aceitar qualquer manobra diversionista que se dobre às pressões dos golpistas e trilhe caminhos fora da legalidade, seja a instituição de um semi-presidencialismo ou vetos a candidaturas legítimas. Só aceitaremos o resultado da manifestação popular por meio do voto em eleições livres e democráticas. Como reza nossa Constituição, o poder emana do povo e só ele poderá decidir quem nos governará e o futuro que quer para o país.
Fonte: Poder 360º