A médica imunologista Nise Yamaguchi, em depoimento à CPI da Covid nesta terça-feira (1º), contradisse a versão apresentada pelo presidente da Agência de Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antonio Barra Torres. Segundo ela, não houve tentativa de alterar a bula da cloroquina por meio de decreto presidencial. Ela afirmou que se tratava apenas de um documento para garantir a “dispensação” (fornecimento) da dita medicação, para utilização de acordo com recomendação médica e “livre consentimento” do paciente.
Tal versão entra em contradição com depoimento prestado por Barra Torres. À CPI, ele afirmou que, em uma reunião realizada no Palácio do Planalto, Nise estaria “mobilizada” para alterar a bula do medicamento. Ele relatou ainda resposta “ríspida” à investida da médica. “Minha reação foi imediata em dizer que aquilo não poderia ser”, disse o presidente da Anvisa, na ocasião.
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Antes, o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta também havia se referido ao episódio da tentativa de mudança da bula da cloroquina. Ainda assim, Nise negou. “Não fiz nenhuma minuta. Não conhecia esse papel”, declarou. “Depois da reunião, descobri que eles estavam se referindo a uma minuta, que jamais falava de bula. Falava da possibilidade de haver uma disponibilização de medicamento”, acrescentou.
Acareação
Nise chegou a oferecer à CPI cópia do suposto documento, que trataria, segundo ela, sobre a disponibilização da medicação. O senador Omar Aziz (PSD-AM), presidente da Comissão, contestou a médica novamente, afirmando que não haveria cópia do alegado documento, e que o original teria sido rasgado pelo então ministro da Casa Civil, general Braga Netto. “O certo é trazer o presidente da Anvisa, para fazer acareação”, sugeriu, então, o presidente da Comissão.
Contradições
Anteriormente, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) chegou a sugerir que o depoimento fosse encerrado, diante das contradições apresentadas pela médica. Ele sugeriu que Nise fosse reconvocada, desta vez na condição de testemunha. Hoje, sua participação se deu como convidada. Ainda assim, ela prestou juramento se comprometendo a dizer a verdade.
“A senhora está omitindo muita coisa”, frisou Aziz, apoiando a reconvocação. “O senador Renan Calheiros (relator) deve ter feito umas dez perguntas para ela, mostrando vídeos. E a doutora Nise cria uma versão para cada vídeo desse”, reclamou. A sessão chegou a ser interrompida, mas os trabalhos continuaram. Os senadores preferiram aproveitar a oportunidade para continuar a inquirição.
Nise disse, por exemplo, desconhecer a existência do chamado “gabinete paralelo” que orientava o presidente Jair Bolsonaro. No entanto, a CPI tem documentos que comprovam que pelo menos 24 reuniões foram realizadas pelo grupo. Em pelo menos uma, contou com a participação da médica. Além disso, listaram inúmeras visitas da médica ao Ministério da Saúde.
A médica também relativizou sua opinião passada sobre a tese da imunidade de rebanho. Disse que, por conta das novas variantes do vírus, esse objetivo dificilmente seria alcançado. Chegou a negar, inclusive, a importância do isolamento social, apresentando supostos dados de que 85% dos internados em Nova York, nos Estados Unidos, em meados do ano passado, tinham se contaminado em casa.
Além disso, reafirmou que o alegado tratamento precoce “salva vidas”. Mas não soube responder por quais motivos o Brasil figura na liderança do ranking mundial de mortes pela covid-19, diante da alegada eficácia do tratamento. Ela também evitou opinar sobre as posturas adotadas por Bolsonaro contra o isolamento, bem como sobre as consequências do atraso na compra de vacinas.
Fonte: Rede Brasil Atual