Em artigo publicado neste domingo (29) no jornal Folha de S.Paulo, cujo título é “Intervenção armada: crime inafiançável e imprescritível”, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski, manda um recado claro ao presidente Jair Bolsonaro, que sinaliza que pretende ir às últimas consequências em suas ameaças de romper com as instituições democráticas no dia 7 de setembro. “No Brasil, como reação ao regime autoritário instalado no passado ainda próximo, a Constituição de 1988 estabeleceu, no capítulo relativo aos direitos e garantias fundamentais, que ‘constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis e militares, contra a ordem constitucional e o Estado democrático’”, escreve o ministro.
No artigo, o magistrado lembra a história do imperador romano Júlio Cesar e contextualiza o termo “atravessar o Rubicão”, rio que demarcava a fronteira de Roma com a província de Gália. Em 49 a.C., Júlio Cesar transpôs o rio pronunciando a frase: “a sorte está lançada”. “A ousadia do gesto pegou seus concidadãos de surpresa, permitindo que Júlio César empalmasse o poder político, instaurando uma ditadura. Cerca de cinco anos depois, foi assassinado a punhaladas por adversários políticos, dentre os quais seu filho adotivo Marco Júnio Brutus (…)”. Lewandowski usa a citação para explicar a origem do termo usado no meio jurídico sobre “usurpação do poder legítimo pela força, apontando para as severas consequências às quais se sujeitam os transgressores”.
Vários delitos
O ministro lista normas jurídicas brasileiras – como a que revogou a Lei de Segurança Nacional – e tratados internacionais que criminalizam o golpe de estado, quando alguém atravessa o “rubicão” da democracia, e dispõe da interpretação do Supremo sobre o artigo 142 da Constituição. “O projeto de lei há pouco aprovado pelo Parlamento brasileiro, que revogou a Lei de Segurança Nacional, desdobrou esse crime em vários delitos autônomos, inserindo-os no Código Penal, com destaque para a conduta de subverter as instituições vigentes, ‘impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais’. Outro comportamento delituoso corresponde ao golpe de Estado, caracterizado como ‘tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído’. Ambos os ilícitos são sancionados com penas severas, agravadas se houver o emprego da violência”, alerta ao presidente.
No artigo, Lewandowski ainda cita o artigo 38, parágrafo 2º, do Código Penal Militar, que pune subalternos caso obedeçam “ato manifestamente criminoso” determinado por ordem superior. “Aqui cumpre registrar que não constitui excludente de culpabilidade a eventual convocação das Forças Armadas e tropas auxiliares, com fundamento no artigo 142 da Lei Maior, para a ‘defesa da lei e da ordem’, quando realizada fora das hipóteses legais, cuja configuração, aliás, pode ser apreciada em momento posterior pelos órgãos competentes”. Assim, Lewandowski deixa claro que processos futuros Bolsonaro pode responder por incitar intervenção militar no dia 7 de setembro usando o preceito constitucional.
“Esse mesmo entendimento foi incorporado ao direito internacional, a partir dos julgamentos realizados pelo tribunal de Nuremberg, instituído em 1945, para julgar criminosos de guerra. Como se vê, pode ser alto o preço a pagar por aqueles que se dispõem a transpassar o Rubicão”, finaliza o ministro do Supremo, lembrando a corte responsável pelo julgamento de nazistas na Alemanha de Adolph Hitler.
Fonte: Rede Brasil Atual