Primeiro, cientistas infectaram cobaias com dengue; depois, camundongos foram alvo do zika; ao final, o grupo com dengue desenvolveu forma amena da infecção por zika; testes feitos em camundongos apontam que as cobaias imunes à dengue também desenvolveram proteção cruzada contra o zika
Estudo publicado na “Nature Communications” na segunda-feira (13) mostra que a imunidade adquirida após uma infecção pelo vírus da dengue pode ajudar a proteger contra o vírus da zika.
Em testes em camundongos, o estudo identificou que cobaias imunes à dengue também desenvolveram proteção cruzada contra o zika. Depois, pesquisadores identificaram também que tipos especificos de células de defesa — os linfócitos T CD8 — têm ação combinada contra os dois vírus.
O trabalho teve como primeiro autor Jinsheng Wen, do Instituto de Arboviroses da Universidade de Wenzhou, na China. Wen também é colaborador no Instituto La Jolla de Alergia e Imunologia, na Califórnia (EUA).
Os achados são particularmente importantes para a tentativa do desenvolvimento de uma vacina contra o zika e a dengue em todo o mundo.
Uma segunda importância do estudo é que ele indica preliminarmente que a dengue não aumenta a gravidade de infecções por zika — uma possível interação entre infecções cruzadas foi uma das muitas hipóteses levantadas durante o início da epidemia por zika no Brasil.
Agora, após o avanço do conhecimento científico, a ideia é outra: talvez seja justamente uma infecção prévia da dengue que impede o zika de ter consequências mais graves, como as anomalias em bebês.
“Em países endêmicos para a dengue, isso pode explicar a razão pela qual algumas pessoas infectadas com zika não desenvolvem a doença “, diz Sujan Shresta, da Universidade de Wenzhou, e autor do estudo, em nota.
“Esse fator também pode ser parte do porquê não é toda a mulher com zika que transmite a infecção para o bebê.”
Cérebro apresentava menos cópias do vírus
Pesquisadores fizeram um estudo do tipo controle para testar a possível imunidade “cruzada” entre os dois vírus.
Primeiro, infectaram camundongos com o vírus da dengue. As cobaias ficaram doentes, mas se recuperaram da infecção — o que demonstra que adquiriram imunidade.
Após a recuperação, animais foram infectados novamente com o vírus da zika. Também um outro grupo, não infectado anteriormente com o vírus da dengue, foi alvo da infecção pelo zika.
Nos resultados, o grupo anteriormente infectado com dengue apresentou carga reduzida de zika no sangue, nos tecidos e no cérebro.
A descoberta dos testes indica preliminarmente, assim, que a defesa adquirida contra a dengue pode ajudar a mitificar os efeitos neurológicos advindos do zika — já que menos cópias do vírus foram identificadas no cérebro.
Vacina deve ter por alvo dois tipos de célula de defesa
Um outro resultado importante da pesquisa é a descoberta da ação dos linfócitos T CD8 na imunidade contra os dois vírus. Isso porque a maioria das vacinas em andamento tem atuação somente contra os linfócitos B.
As células de defesa do tipo B são as que produzem anticorpos após o contato com uma infecção. Essa ação tem por vistas o sistema imune adaptativo: aquele que desenvolve imunidade com vistas a um ataque futuro.
Já as células do tipo T, além de focar infecções futuras, têm uma ação direta sobre o invasor — sem necessariamente o envolvimento de um anticorpo.
No caso do estudo, cientistas demonstraram que é o linfócito T CD8 que tem ação conjunta. O CD8 é um tipo de proteína que aparece na superfície da célula. Ele tem a função de se ligar a outras proteínas que estão na superfícies de vírus — num mecanismo chave-fechadura que facilita a destruição dos patógenos.
Jinsheng Wen, primeiro autor do estudo, pontua que foi observada a ação dos dois tipos de célula na proteção. Segundo ele, as vacinas em andamento devem ter por alvo uma ação conjunta entre linfócitos B e T.
Fonte: EBC