PUBLICADO EM 06 de jun de 2025

FARM Rio enfrenta protesto por parceria com Starbucks: exploração na cadeia do café

A nova coleção de copos da FARM Rio e Starbucks levanta discussões sobre sustentabilidade e violações trabalhistas. Sindicatos e ativistas protestam.

Ricardo Patah (centro) assina carta denunciando a parceria entre FARM e Starbucks

Ricardo Patah (centro) assina carta denunciando a parceria entre FARM e Starbucks

A marca de roupas brasileira FARM Rio, reconhecida por seu discurso sustentável e estampas que celebram a cultura nacional, tornou-se alvo de uma campanha internacional após lançar uma coleção exclusiva de copos em parceria com a Starbucks.

A parceria entre as marcas foi iniciada em 13 de maio nos EUA e Canadá e expandida para o Brasil no último dia 20. Ela ocorre em meio a acusações contra a rede de cafeterias por violações trabalhistas em fazendas fornecedoras de café e repressão a sindicatos nos Estados Unidos. É substancial o volume de provas de sérias violações de direitos humanos nas cadeias de fornecimento da Starbucks no Brasil e em outros países — incluindo denúncias de escravidão, trabalho infantil e repressão à organização sindical.

A campanha #RompaComAStarbucks, liderada pela Coffee Watch, organização não governamental que monitora e denuncia más práticas no setor cafeeiro no mundo, classificou o ato como “lavagem de imagem” de uma empresa envolvida em exploração e exige o fim imediato da parceria.

Uma coalizão de organizações da sociedade civil do Brasil, dos Estados Unidos e de diversos outros países enviou uma carta aberta a Fabio Barreto, CEO da Farm Rio, pedindo que a marca encerre sua parceria ou condicione essa colaboração a reformas significativas.

No Brasil, a campanha é apoiada pela União Geral dos Trabalhadores (UGT), Central Unica dos Trabalhadores (CUT), ONG ADERE, Conecta Direitos Humanos, Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio e Serviços (CONTRAC/CUT) e Sindicato dos Comerciários de SP.

Ricardo Patah, presidente da UGT, reforçou o apoio à mobilização. “Não podemos permitir que marcas que se dizem éticas emprestem sua imagem para empresas que violam direitos humanos. A FARM Rio precisa escolher se está do lado da ética ou da exploração”, argumentou.

A carta também é assinada por uma série de organizações internacionais, que inclui Coffee Watch, China Labor Watch, International Rights Advocates.

Leia aqui a carta completa.

Além da campanha, um abaixo assinado pede o fim da parceria, alegando que a gigante da moda brasileira está ferindo seus princípios sustentáveis.

Ativistas estiveram em lojas da FARM na última terça-feira (03), para entregar o conteúdo do documento e alertar gerentes e trabalhadores da empresa.

Veja a entrega da carta no vídeo

Práticas irregulares e trabalho análogo à escravidão

Há anos, a Starbucks enfrenta denúncias de práticas irregulares. No Brasil, investigações do Repórter Brasil e do Ministério do Trabalho revelaram que fazendas certificadas pelo programa de “fornecimento ético” da empresa, como a Fazenda Piedade (MG), foram flagradas com trabalho infantil, descontos ilegais em salários e falta de equipamentos de proteção.

Em 2022, um adolescente de 15 anos foi resgatado de condições análogas à escravidão em propriedades vinculadas à rede. Nos EUA, a Starbucks Workers United denuncia a resistência da empresa em negociar contratos coletivos e a demissão de mais de 120 baristas após greves.

“A Starbucks lucra com a opressão. Enquanto vende café a preços premium, trabalhadores brasileiros colhem os grãos sem direitos básicos, como água potável ou banheiros”, afirma Etelle Higonnet, fundadora da Coffee Watch.

Ela destaca que a parceria com a FARM Rio, que estampa copos da rede com motivos tropicais, “dá um verniz de responsabilidade social a uma empresa que ignora crimes trabalhistas”.

A coleção, com modelos como “Banana Mix” e “Lenço Azulejo” (preços entre R$ 69 e R$ 149), é vista como contraditória ao posicionamento da grife, certificada como B Corp e associada a práticas sustentáveis.

Em 2025, a Coffee Watch, organização que monitora e denuncia más práticas no setor cafeeiro, pediu ao governo dos EUA que bloqueasse a importação de café brasileiro ligado a trabalho escravo — lista que inclui fornecedores da Starbucks.

A Starbucks nega as acusações, afirmando em nota que seu programa C.A.F.E. Practices garante “transparência e padrões éticos” e que corta relações com fornecedores envolvidos em irregularidades. No entanto, auditores independentes e sindicalistas apontam falhas crônicas no sistema. “O modelo é frágil. Todos os anos encontramos fazendas certificadas com trabalhadores sem registro ou direitos básicos”, critica Jorge Ferreira dos Santos Filho, da Articulação dos Empregados Rurais de Minas Gerais.

Procurada, a FARM Rio não se manifestou sobre as acusações. A empresa já foi denunciada em outras ocasiões. Em 2019, uma operação de fiscalização encontrou trabalhadores em condições análogas à escravidão em oficinas que prestavam serviços ao grupo Soma, que também detém a marca. A coleção, apresentada como “fusão de arte e cultura cafeeira”, permanece à venda em lojas e no e-commerce da marca, enquanto a campanha #RompaComAStarbucks deve iniciar nesta semana uma coleta de assinaturas em petição online. “O caso expõe o dilema ético de parcerias entre marcas de lifestyle e corporações multinacionais, em um cenário onde consumidores exigem coerência entre discurso e prática”, avalia Etelle Higonnet.

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