PUBLICADO EM 27 de jul de 2018
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Defasagem entre idade e série é quatro vezes maior em escolas públicas

O indicador de taxa de distorção idade/série utilizado no Censo Escolar indica o percentual de alunos que tem dois ou mais anos de idade acima do recomendado em determinada série, tendo como base a idade de seis anos estabelecida para ingresso no ensino fundamental.

Alunos em sala de aula. Foto: Hedeson Alves

O número de alunos com idade acima do recomendado para a série de ensino na rede pública é quatro vezes maior em relação às escolas privadas no Brasil. As turmas das escolas públicas têm um maior número de alunos e passam menos tempo na escola em relação aos alunos da rede privada. Os dados são do Censo Escolar 2017, divulgado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).

Enquanto a rede privada apresenta uma taxa de 5,1% alunos com idade acima do recomendado no ensino fundamental e 7,4% no ensino médio, a rede pública tem 20,7% de seus alunos com idade acima da série no ensino fundamental e 31,1% no ensino médio.

Apesar de ainda apresentar disparidade em relação à taxa da rede privada, os índices do ensino público apresentaram queda nos últimos 10 anos. Em 2007, a taxa de distorção idade/série era de 30,1% no ensino fundamental e 46,5% no ensino médio da rede pública.

O indicador de taxa de distorção idade/série utilizado no Censo Escolar indica o percentual de alunos que tem dois ou mais anos de idade acima do recomendado em determinada série, tendo como base a idade de seis anos estabelecida para ingresso no ensino fundamental.

“É um retrato muito importante. Se você pensar que a cada quatro alunos da educação básica no Brasil um aluno está mais de dois anos defasado é um sintoma claro da crise de aprendizagem que o país vive”, explica o gerente de políticas educacionais da organização não governamental Todos Pela Educação, Gabriel Corrêa.

Para a coordenadora de políticas educacionais da Campanha Nacional Pelo Direito à Educação, Andressa Pellanda, o indicador não pode ser analisado apenas do ponto de vista educacional. “A taxa de distorção passa pela exclusão escolar. Muitas vezes, o aluno saiu da escola e voltou depois para uma série anterior. Esse jovem sai da escola ou tem dificuldade de aprendizagem quando está dentro da escola. Tem diversos fatores que vão além da educação, que passam muitas vezes pelo próprio arcabouço de direitos sociais em que esse jovem está inserido. A distorção fica maior em regiões do país que têm maiores índices de pobreza e de vulnerabilidade social”, aponta.

As maiores porcentagens de alunos acima da idade recomendada nas escolas estão no Norte (com 26,4% no ensino fundamental e 41,4% no ensino médio) e no Nordeste (com 24,5% no ensino fundamental e 36,2% no ensino médio). Os estados que apresentam as maiores taxas de distorção são Sergipe com 30,6% no ensino fundamental e 47,5% no ensino médio, Pará com 30,5% no fundamental e 47,5% no médio e Bahia com 29,9% no fundamental e 43,6% no médio.

Para o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), as taxas de distorção na rede pública expressam fatores como o volume de estudantes com entrada tardia na escola, as dificuldades na trajetória escolar, a heterogeneidade nas condições de aprendizagem dos alunos, e as dificuldades da escola em fazer face a essas diferenciações nas características dos alunos.

“O esforço das redes estaduais no cumprimento das metas do Plano Nacional de Educação, relativas a essa temática, tem se concentrado na melhoria do fluxo escolar, no atendimento complementar aos estudantes com dificuldades de rendimento escolar, na formação continuada de professores, no estímulo à adoção de tecnologias educacionais que favoreçam a aprendizagem e, sobretudo, no desenvolvimento de providências para a implantação do Novo Ensino Médio”, diz o Consed.

Tempo de permanência na escola
Em 2017, a média nacional de horas-aula diária nas escolas, tanto públicas quanto privadas, foi de 5 horas no ensino médio; de 4,6 horas no ensino fundamental; e de 6 horas na educação infantil.

Na rede privada, a média foi de 5,5 horas no ensino médio; 4,6 horas no ensino fundamental e 6,2 horas na educação infantil. Já na rede pública, a média de horas-aula foi de 4,9 horas no ensino médio; 4,6 horas no ensino fundamental e 6 horas na educação infantil.

“Hoje a gente está com 8,30% das matrículas em tempo integral, a gente tá muito distante de atingir o que é previsto pelo Plano Nacional de Educação”, considera Pellanda. O Plano Nacional de Educação coloca como meta para o ensino público brasileiro a meta de atingir 25% das matrículas até 2024 em ensino integral.

A coordenadora de políticas educacionais da Campanha Nacional Pelo Direito à Educação ressalta que, além dos cortes orçamentários sofridos pelo setor nos últimos anos, a educação pública brasileira tem seus índices de qualidade afetados pela lentidão na implementação do Plano Nacional de Educação. Após quatro anos de sua vigência, 30% da política foram colocadas em vigor, de acordo com balanço da entidade.

“Quando a gente vê que o Plano Nacional de Educação está colocado completamente de escanteio na política educacional, é obvio que a gente vai chegar em resultados como esses de comparação entre a rede pública e a rede privada”, avalia.

Para Gabriel Corrêa, do Todos pela Educação, o tempo de permanência do aluno na escola é fundamental para a qualidade da educação, mas ele ressalta que é necessário garantir também a qualidade do ensino ofertado durante esse período. “Simplesmente expandir o tempo sem melhorar a qualidade desse tempo não vai mudar em nada. É um processo que tem que acontecer de expansão da exposição dos alunos à aprendizagem, mas com o tempo de aula cada vez mais efetivo, com professores bem preparados e a prática pedagógica aprimorada”, afirma.

O Consed reconhece a necessidade de ampliar a jornada diária de aulas e considera que isso está sendo feito gradativamente com a implementação das escolas de tempo integral e da ampliação da carga horária total no ensino público.

Média de alunos por turma
As turmas da rede pública são maiores que as da rede privada para todas as etapas de ensino. No ensino privado, a média é de 27,8 alunos por turma no ensino médio, 19,9 no ensino fundamental e 13 na educação infantil. Já na rede pública, a média de alunos por sala é de 30,8 no ensino médio, 23,7 no ensino fundamental e 18,1 na educação infantil.

Apesar de ainda apresentar turmas maiores, a rede pública teve uma redução na quantidade de alunos por turma nos últimos 10 anos em relação à rede privada: 12% no ensino médio, 9,55% no ensino fundamental e 11% na educação infantil.

Corrêa considera que essa variável não é central para explicar a aprendizagem no Brasil e considera que os índices de médias de aluno por turma são razoáveis.

“A média de alunos por turma no Brasil vem caindo levemente ao longo do tempo. É claro que não podemos ter salas superlotadas, mas os indicadores como estão hoje, em torno de 25, 30 alunos por turma, não chegam a interferir na aprendizagem. As pesquisas mostram que o que impacta na aprendizagem vai ser a prática pedagógica, a qualidade do professor”, considera.

Com relação ao número de estudantes em sala de aula, o Consed ressalta que tanto a iniciativa privada quanto a pública atendem normativas estabelecidas pelos Conselhos Estaduais de Educação, que normalmente definem o número de estudantes por metro quadrado e não por sala, “pois as salas de aula possuem tamanhos variados e, normalmente, escolas privadas dispõem de espaços menores”.

Corpo docente
Em comparação aos outros índices, a rede pública brasileira apresenta um número maior de docentes com formação no ensino superior, segundo o Censo Escolar.

No ensino médio da rede pública, 94,7% dos professores têm curso superior, no ensino fundamental são 84,1% e na educação infantil, 73,9 %. Já na rede privada o percentual de professores com curso superior é de 90,3% no ensino médio, 74% no ensino fundamental e 53,2% no ensino infantil.

Segundo Corrêa, uma das hipóteses para explicar esses números é o fato de que antes era possível a contratação de profissionais formados no que chamava-se de magistério. “Os professores que já tem mais tempo de carreira, alguns deles não têm ensino superior e muitos, por sua experiência em sala de aula são contratados por escolas particulares. Os concursos públicos de professor atualmente demandam ensino superior, então essa taxa no ensino público é mais elevada”, aponta.

Corrêa considera que o percentual de docentes com ensino superior é um parâmetro importante para ser acompanhado, assim como a qualidade dos cursos universitários que formam os professores no país, ainda muito aquém dos desafios encontrados na sala de aula, na visão do especialista. Ele destaca que a valorização do corpo docente brasileiro é fundamental para a melhoria dos índices brasileiros de educação.

“Quando eu falo de valorização, estou falando também de formação, de melhoria nos planos de carreira, de desenvolvimento profissional ao longo da carreira. O Brasil precisa pensar na profissão do professor de forma sistêmica. Se a gente continuar elaborando propostas e políticas públicas que apenas tangenciem a sala de aula e não entrem realmente para qualificar o professor, a gente dificilmente vai conseguir avançar nos índices de qualidade educacional do país”, avalia.

Andressa Pellanda aponta que a média do investimento público no ensino médio é de três a quatro vezes menor em relação à escola privada e considera que a diminuição dessa disparidade é fundamental para a melhoria dos índices de qualidade do ensino público. “Quando você olha só para esses parâmetros, você já vê o quanto maior é o fator de ponderação de custo para que a gente tenha insumo de qualidade para a educação, que é o gasto com os profissionais da educação. O que se investe hoje no Brasil não é suficiente para gente ter esse patamar de algumas escolas privadas da classe média e classe média alta”, afirma.

Ministério da Educação
Procurado pela reportagem, o ministério da Educação respondeu por meio de nota, em que afirma que a gestão da educação básica no país é dos estados e dos municípios, segundo a legislação brasileira. “O MEC tem papel suplementar, de apoio, por meio de programas como alimentação escolar, transporte e livro didático, por exemplo. Além de iniciativas próprias que podem ajudar aos estados e municípios. No entanto, qualquer programa do ministério precisa de adesão dos estados e municípios, uma vez que eles são autônomos e o MEC não está acima das secretarias de educação locais”, acrescentando que cabe aos estados e municípios a contratação de professores, por exemplo.

Para o MEC, o Censo do Inep é um estudo transparente que mostra, ano a ano, um raio X da educação do Brasil em forma de dados. O texto ressalta ainda que a LDO aprovada no Congresso Nacional prevê aumento de orçamento para o MEC no ano de 2019.

Fonte: Agência Brasil

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