PUBLICADO EM 25 de ago de 2020
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O que é fake news, afinal?

A expressão “fake news” passou a fazer parte do vocabulário do brasileiro comum, mas todos sabem qual é o seu real significado? Com o objetivo de esclarecer esta questão, fui buscar na tese de doutoramento da professora Tatiana Maria Dourado, que analisou a produção e a disseminação nas redes sociais de notícias falsas no período pré-eleitoral, a descrição desse fenômeno emergente do campo da comunicação, mais especificamente do campo da comunicação política. Outra fonte consultada foi o artigo “Fake news, um fenômeno de comunicação política entre jornalismo, política e democracia” , de autoria do professor Wilson da Silva Gomes e da própria autora da tese.

A professora define fake news como um “tipo específico de informação inverídica apresentado como histórias presumidamente factuais, porém comprovadamente falsas, produzidas com a intenção de serem distribuídas como notícias de última hora nos ambientes digitais”. Ou seja, é uma manipulação que pretende apresentar como verdadeiro algo claramente falso, criando um contexto para legitimá-la e validá-la, geralmente mediante associação com uma fonte confiável. No artigo citado, Gomes e Dourado as definem como “relatos pretensamente factuais que inventam ou alteram os fatos que narram e que são disseminados, em larga escala, nas mídias sociais, por pessoas interessadas nos efeitos que eles poderiam produzir”, e se referem, principalmente, aos relatos inventados ou alterados e difundidos com propósitos políticos.

O fenômeno das fake news está associado à ascensão mundial do movimento conservador de direita, que questiona a credibilidade da ciência, da universidade e do jornalismo em seu próprio proveito. Esse tipo de fenômeno foi largamente utilizado nos Estados Unidos, na eleição de Donald Trump, no plebiscito que decidiu pela saída do Reino Unido da União Europeia, e no Brasil, na eleição de Jair Bolsonaro. Na lógica das fake news, um relato é verdadeiro ou falso não em função dos fatos a que se referem, mas em razão dos valores que reforçam ou dos princípios que sustentam.

Trata-se de um fenômeno que geralmente surge e se expande em ambiente de polarização política, de disputas acirradas em torno de crenças, ideologias e valores, com elevado grau de fundamentalismo. Vários episódios no Brasil – como as manifestações de junho de 2013, as denúncias de corrupção da Operação Lava Jato, o impeachment da ex-presidente Dilma, a prisão de Lula, o assassinato da vereadora Marielle, a greve dos caminhoneiros, etc – contribuíram para criar um ambiente propício às fake news.

As características mais presentes nas fake news são: o sentido de novidade à falsa notícia; uma suposta linguagem jornalística; a vinculação da notícia falsa a uma instituição de credibilidade ou a um veículo de comunicação; a associação da falsa narrativa a um suposto interesse público ou de grupos; a busca de evidência para dar aparência de verdadeira à notícia falsa; criar a impressão de que o fato ou evento narrado foi visto ou testemunhado por alguém.

A produção e a disseminação de fake news é um sistema complexo, que emprega múltiplas versões (fontes variadas), múltiplas formas (não existe um padrão) e multiplataformas (Facebook, Twitter, Instagram, WhatsApp¸ páginas “noticiosas” na Internet). Para combater e denunciar essa prática nociva à democracia, é preciso compreender a magnitude desse fenômeno em todas as suas dimensões: o alcance, os emissores, as plataformas e as redes políticas envolvidas.

Dada a intensidade e facilidade com que são produzidas e disseminadas, vêm surgindo em portais na Internet, notadamente ligados a veículos de imprensa, locais onde as fake news podem ser checadas e desmentidas, como o Projeto Comprova (https://projetocomprova.com.br/), o G1 Fato ou Fake (https://g1.globo.com/fato-ou-fake/) e outros. Além disso, tramita no Congresso o Projeto de Lei n° 2630, de 2020, que “Institui a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet”, conhecido como “Lei Fake News”, proposto pelo senador Alessandro Vieira (CIDADANIA/SE), e que tenta estabelecer limites à divulgação de notícias falsas e responsabilizar os provedores de Internet pela sua disseminação. Uma das críticas feitas a essa proposta é que ela estaria, a pretexto de combater fake news, infringindo a vedação de censura e cerceando a liberdade de expressão.

A título de conclusão, pode-se afirmar que se trata de um fenômeno que manipula conteúdo, com postulação factual; que utiliza informação inverídica, cuja falsificação pode ser verificada; que pretende dar sentido de notícia às narrativas, dando roupagem de novidade e evidência; e que emprega várias formas e meios para sua disseminação. Como se viu, é um fenômeno difícil de controlar e combater, tanto por suas características, quanto pelos meios empregados.

Antônio Augusto de Queiroz é jornalista, consultor e analista político, diretor licenciado do Diap e sócio-diretor das empresas “Queiroz Assessoria em Relações Institucionais e Governamentais” e “Diálogo Institucional Assessoria e Análise de Políticas Públicas”

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