A vitória parcial do FUNDEB – ainda depende de aprovação no Senado Federal – tem múltiplos significados e traz diversas ponderações. Mais do que a fixação constitucional definitiva quanto a um mecanismo legal que trata de forma sistêmica o financiamento e desenvolvimento da Educação Básica, a interpretação do fato permite desdobrar a análise em outros aspectos, indo além da própria Educação, Ciência e Cultura, relacionando-se desde a afirmação dos marcos e preceitos civilizatórios, democráticos e cidadãos até a lição de que é possível com habilidade, amplitude e justeza vencer pautas e causas progressistas em meio a um ambiente desfavorável, retrógrado e niilista.
Representa a superação das lógicas da voucherização, terceirização, uberização, privatização e automação da atividade pedagógica e educacional. A postura assumida pelos governadores que se recusaram a apoiar o FUNDEB é um exemplo dessas más intenções. Pretendiam desfigurar o fundo com o objetivo de acelerar a desconstrução da Educação Pública, sua mercantilização comercial e ideológica e tornar o acesso ao conhecimento e a formação intelectual da população precário e desqualificado. Ignoraram que sem os recursos do FUNDEB, Estados e Municípios não teriam suporte para bancar a estrutura e funcionamento da Educação, o que levaria a deterioração e ao caos administrativo e financeiro dos entes públicos.
O próprio Presidente, fragorosamente derrotado, tentou se desvencilhar do revés atribuindo a nova legislação a uma iniciativa sua. Ainda que cause náuseas, um porém: ficou na obrigação de apoiar o FUNDEB permanente para não ser desmascarado por si mesmo.
O resultado também mostra duas facetas importantes: a de que a Educação é um campo de resistência sui generis e por excelência. Em 2019 foi o Tsunami da Educação o movimento que aplicou a maior derrota às pretensões do Governo Bolsonaro. Agora em 2020, sob um quadro excepcional de pandemia, novamente os setores e atores militantes da luta educativa bisam o feito, contrariando os prognósticos pessimistas e negativos quanto ao desfecho da disputa. Armados de convicção, argumentos e estatísticas, com capacidade de diálogo e convencimento, passando sobre as restrições partidárias, entidades sindicais, estudantis e científicas construíram um feito extraordinário.
E mais: mostraram por A+B que o movimento social não está morto ou inerte. Articulando-se e indo ao embate, reestabeleceram e ressignificaram a luta, mesmo sob condições contrárias e desvantajosas. Seu êxito é carregado de simbologia, afinal Educação é sinônimo de Liberdade, Conhecimento, Autonomia e Progresso e os adversários sintetizavam seu oposto: ignorância, obscurantismo, submissão e retrocesso.
Em resumo: a bem sucedida ofensiva política dos educadores, estudantes, intelectuais e demais atores democráticos na busca pelos Direitos Humanos, Sociais e Políticos do povo e da sociedade serve de medida e exemplo para novos enfrentamentos, seja no terreno institucional, seja no campo societário. Sem festejar antes da confirmação final, é lícito projetar que não existem saídas políticas que impeçam a consagração do FUNDEB tal e qual foi tratado na Câmara dos Deputados. Não baixemos a vigilância, nem desmobilizemos as tropas, mas tenhamos força redobrada para fazer dessa jornada heróica um mote de esperança e superação.
Alex Saratt é professor de História nas redes públicas municipal e estadual em Taquara/RS, vice-diretor do 32º núcleo do Cpers-Sindicato