A invasão do Capitólio trouxe à tona diversas constatações, ainda à guisa de análise e conclusão, mas nem por isso menos válidas ou desimportantes. Tirada as galhofas e troças viralizadas em tuítes, memes e charges, o fato é que o episódio expressa inequivocadamente a falência do sistema político norte-americano, as consequências da profunda crise econômica que desde 2008 empobrece os pobres e enriquece os ricos e também ilustra a disruptura do contrato social que desde a Guerra da Secessão mantém a Sociedade e os Estados, unidos.
Das constatações referidas, por mais óbvia que pareça, a primeira não pode deixar de ser feita: e se no lugar de supremacistas brancos, embandeirados com os símbolos dos Confederados, movidos por teorias da conspiração, fake news, fundamentalismo cristão e nazismo, o Capitólio tivesse sido invadido pelos ativistas do movimento Black Lives Matters, qual teria sido a reação? Longe de negar os elementos classistas, ao contrário, confirmando-os, inegável é o recorte racial e racista na atual conjuntura estadunidense e isso, por si só, diz muita coisa para nosotros acá.
Aliás, aqui da outra ponta do hemisfério, noves fora a infeliz observação de um analista político de que tudo não passou de uma chanchada, a incitação de Trump do recurso ao golpe de força (alguém duvida que a expectativa era que atos similares pipocassem pelos EUA?) é combustível altamente inflamável para uma horda crescente e fanática que vê predicados míticos no seu líder supremo – um desqualificado de discurso espertalhão, hipócrita e, não raro, mentiroso. Não custa lembrar que além das massas pró-Bolsonaro (menos mobilizadas do que se espera), existem vastos setores ligados às armas (oficial, paraestatal e mesmo criminal) que lhe dão apoio.
A luz amarela que vem acompanhando a política nacional desde que o consórcio golpista teve suas relações esgarçadas com as pretensões explícitas de Bolsonaro em favor do autogolpe e ditadura em meados de março/abril do ano passado acendeu agora o laranja: não bastasse o exemplo insurrecional vindo do centro nervoso do fascismo contemporâneo, qualquer sujeito atento às sutilezas da política reconhece que Bolsonaro vem elevando o tom da sua retórica e em seus atos. A possibilidade de derrota nas eleições para a Câmara dos Deputados – mesmo que essa derrota signifique menos do que aparenta – é mote para repisar o discurso da ingovernabilidade do país por “culpa” do excesso de leis, do Congresso, do STF, da Democracia.
Sem pretensão de concluir, mas antes de abrir debates e reflexões, é importante sublinhar que não podemos baixar a guarda frente ao fascismo. Seus caracteres mais exóticos são mero diversionismo, não convém substituir a vigilância pelo deboche ou ridicularização. A necessidade de dar combate, freios e derrota ao Bolsonarismo – uma das principais referências mundiais para a Extrema-Direita internacional – continua sendo a ordem do dia. Como muitos comentaram – sem entrar no mérito da democracia norte-americana – “se lá chegou a esse ponto, imagine por aqui”.
Alex Saratt é professor de História nas redes públicas municipal e estadual em Taquara/RS, vice-diretor do 32º núcleo do Cpers-Sindicato
Magda
Observemos os desdobramentos tupiniquins.