A crise sanitária trouxe grandes impactos para o mercado de trabalho no país, com aumento do desemprego e da informalidade e, para uma parcela expressiva de trabalhadores, queda da renda.
Para agravar a situação, a partir de meados de 2020, os brasileiros começaram a sentir no bolso a alta de preços dos alimentos básicos, devido a problemas na oferta, provocados pelo crescimento da exportação e/ou pelo desmonte de políticas agrícolas. O fato é que o trabalhador passou a pagar mais para comprar comida e também viu a conta de energia elétrica ficar mais cara e o preço do botijão de gás subir. Se, de um lado, os preços aumentam, de outro, a renda do trabalho não acompanha. O rendimento compra, a cada mês, menos produtos.
Para aqueles que estão no mercado de trabalho formal, a possibilidade de manter o poder de compra dos salários vem pela negociação coletiva. A análise dos reajustes, a partir dos acordos inseridos no Sistema Mediador, do Ministério da Economia, mostrou que, do início de 2021 até a primeira semana de julho, aproximadamente mais da metade dos reajustes (52%) resultaram em perdas salariais nas datas-bases, sempre na comparação com o INPC-IBGE (Índice Nacional de Preços ao Consumidor/Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), ou seja, o valor negociado ficou abaixo do índice de inflação. E quase um terço dos reajustes (31,2%) teve correção igual ao índice inflacionário. Apenas 16,5% alcançaram ganhos reais.
Por setor de atividade, na indústria, os reajustes acima do INPC alcançaram 24,9% do total do segmento. No comércio e nos serviços, ganhos reais ocorreram em apenas 12% dos casos. Já as perdas reais foram mais frequentes nos serviços (em 65,3% dos casos), enquanto os reajustes em percentuais iguais ao INPC-IBGE foram mais constantes no comércio (54,5% dos casos).
Por região geográfica, o Sul apresentou o maior percentual (32,7%) de reajustes acima da inflação, 40,3% dos resultados iguais ao INPC e 27,0% abaixo do índice do IBGE.
No Centro-Oeste, a proporção de reajustes salariais abaixo do INPC foi de 70,0%, a maior entre as regiões. Apenas 12,3% das negociações garantiram ganhos reais aos salários nessa região.
O quadro de reajustes salarias de 2021 superou em 130% o observado no mesmo período do ano passado e em 40% o do mesmo intervalo de 2019, mostrando a volta das negociações depois de longo período de isolamento social. Porém, os resultados obtidos nos primeiros meses de 2021 indicam que os sindicatos encontraram dificuldades para manter o poder de compra do trabalhador, já corroído pela inflação, uma vez que mais da metade das negociações não conseguiu recompor o valor real dos salários nas datas-bases, efeito do desemprego maior e da elevação geral do nível de preços.
O crescimento da inflação, acima do esperado, coloca dificuldades para se negociar ganhos reais, uma vez que a maior parte das empresas, nos planejamentos, já provisiona percentual com base nas expectativas do mercado. Diante do atual cenário, de baixo crescimento e inflação crescente, a possibilidade de ganhos reais tende a ser cada vez menor.
No entanto, muitos já falam em retomada da economia em 2021 e que o nível de atividade econômica tem dado sinais de recuperação, com os resultados positivos do PIB conseguidos pela comparação com uma base deprimida, que foi a de 2020.
Se há ligeira melhora econômica, o trabalhador ainda não está sendo beneficiado. Além de o desemprego não diminuir, para os que estão trabalhando, o salário está cada vez menor, em termos reais, e comprando, a cada mês, menos itens básicos.
Patricia Pelatieri, economista, diretora técnica adjunta do Dieese
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