Quatro questões marcaram as eleições municipais: a volta da política ao centro do jogo, a derrota de Bolsonaro, o triunfo da centro-direita e a novo recuo da esquerda.
O espaço para os candidatos da chamada “antipolítica” foi reduzido. Com a pandemia dando sinais de recrudescimento e o desemprego subindo, o eleitor optou por políticos com trajetórias consolidadas. Um bom sinal.
Outra marca foi a derrota de Bolsonaro. Seus candidatos naufragaram nas principais cidades. O povo continua polarizado pelo ideário liberal, mas não está satisfeito com a condução da extrema-direita.
Importante registrar também a vitória da centro-direita, que ganhou nos principais colégios eleitorais. PP (685), PSD (654) e DEM (464) foram os partidos que mais cresceram em número de prefeituras. O MDB (784), apesar do recuo importante, continua sendo o partido a governar mais cidades. O PSDB (520) registrou o maior recuo neste campo (-33%).
Na esquerda, o PDT (314) se manteve praticamente estável, perdendo apenas 17 prefeituras. O PT (183) sofreu novo recuo e, pela primeira vez, não governará nenhuma capital. O PSOL teve um belo desempenho com Boulos, ganhou em Belém com o apoio dos Barbalhos, mas governará apenas cinco cidades em todo o Brasil.
PSB (252) e PCdoB (46) sofreram as piores derrotas. Os socialistas perderam 151 prefeituras (-37%). O PCdoB perdeu 34 (-42%). O campo progressista governará cerca de 10 milhões de pessoas a menos a partir de janeiro de 2021. Um resultado duro, que promoveu a volta do negacionismo e vem semeando novas ilusões.
O PDT resolveu dar uma de Botafogo. Ninguém lembra qual foi seu último título nacional importante, mas está comemorando a ameaça de queda do Flamengo (PT) para a segunda divisão como se estivesse conquistando o mundial de clubes.
As ilusões trabalhistas vão mais longe. Acreditam que Rodrigo Maia, representante do mercado financeiro no Congresso, vai apoiar o programa de Ciro que, corretamente, mira justamente na… Faria Lima.
Ou ainda que o DEM vai abrir mão do governo de São Paulo e da chance de reeleição com o apoio tucano – o vice de Doria é Rodrigo Garcia, do DEM – para apoiá-los. O PIB de São Paulo, sozinho, é quase duas vezes o PIB da Argentina.
Rodrigo Maia namora Ciro com dois objetivos: receber o apoio para sua tentativa de continuar presidindo a Câmara e valorizar seu passe no jogo com Doria e Huck.
Frente Ampla sem unidade da esquerda é ilusão. Buscar a centro-direita isolado é submeter-se ao liberalismo.
Se nada mudar, MDB, PSDB, DEM, PP, PSD, Republicanos e outros irão se dividir. Uma parte vai marchar com a sempre potente máquina do governo federal. A outra vai apoiar uma candidatura de centro-direita, um liberalismo educado, polido e identitário.
A boa notícia é que, enquanto alguns decolam, outros parecem estar pisando firme no chão. Lula recebeu um recado forte das urnas: não existe mais “o dono do jogo”. Não há mais ambiente para a ilusão hegemonista.
É unidade ou o risco do campo progressista não ir ao segundo turno. A esquerda não está morta, mas precisa, com urgência, calçar as sandálias da realidade.
Ricardo Cappelli é secretário da representação do governo do Maranhão em Brasília e foi presidente da União Nacional dos Estudantes