Quanto menos se conhece ou se tem compromisso com a Educação, mais esdrúxulos e bizarros são os diagnósticos e soluções apontadas pelos infames. É como se o dito popular “quanto mais rezo, mais assombração me aparece” ganhasse vida e forma nas personalidades públicas ou nos sujeitos anônimos que vociferam todo tipo de impropérios intelectuais e pedagógicos, ostentando conhecimentos e autoridade dignas de um ‘aspone’.
Não deixa de ser uma confluência dos malditos ‘ismos’ que proliferam no seio da sociedade: o fundamentalismo, o obscurantismo, o negacionismo. Já tivemos a ridícula – mas não menos perigosa – Escola Sem Partido, duramente derrotada graças à afirmação política e constitucional dos princípios da Democracia, pluralidade e liberdade.
Também foram rechaçadas as propostas histéricas que denunciavam a existência de uma “ideologia de gênero” no interior das escolas e aquelas que preconizavam a “educação domiciliar” como meio para livrar as pobres criancinhas da manipulação e doutrinação esquerdistas (sic)!
Sei que é chover no molhado, mas reparemos: num caso se defendia o direito a que as outras pessoas não tivessem direitos, tampouco respeito ou dignidade; no outro, a suposta suficiência em educar os filhos desde o próprio lar caiu por terra com a suspensão das aulas presencias em decorrência da pandemia e do necessário fechamento físico das escolas.
Entretanto, o mote desse texto é outro: a proliferação das Escolas Cívico-Militares, fartamente financiadas e divulgadas, representa um grave ataque e retrocesso à Educação, à Gestão Democrática, à Profissionalização do Trabalho Educativo e à Cidadania. Mais do que uma peça de propaganda ou instrumento de controle, vigilância e doutrinação baseados na repressão e no medo, tais iniciativas rompem com a lógica da formação e profissionalização da Educação e seus agentes educadores.
Pedagogia é ciência social e humana por excelência, se vale de estudos estatísticos para fundamentar suas perspectivas e diretrizes, se conecta a projetos de desenvolvimento econômico e tecnológico, envolve a consolidação dos avanços científicos e civilizatórios mais generosos, promissores e justos.
Transformar escolas em versões miniaturizadas de empresas (ideário neoliberal), prisões (repertório punitivo) ou quarteis (visão militaresca) ofende a inteligência coletiva e destroça o valor da profissão educador e da própria ciência pedagógica – com suas didáticas e metodologias amplamente discutidas e experimentadas.
Além de servir como verdadeiro cabide de empregos – a “mamata” tão comum no discurso do inominável presidente – há uma série de distorções a serem denunciadas e combatidas. Uma delas é a contradição do pensamento conservador que diz que “a educação vem de casa”, o que faz supor que crianças e adolescentes estão prontos e plenos e a exigência de esses mesmos sujeitos sejam postos a ferros para aprender “disciplina e respeito”!
Outra vaga no argumento “militarista” é acreditar que o simples contato com conteúdos e procedimentos que evoquem o “amor à Pátria”, “o respeito aos pavilhões nacionais”, o “conhecimento da letra do hino” ou a “obediência às normas e leis” mudará substancialmente a percepção dos educandos. Afirmamos, sem medo de errar, que Civismo e Cidadania são mentalidade e atitude conscientes, resultado da condição real em que Democracia, Direitos e Deveres Humanos, Liberdade, Justiça e Inclusão se fazem presentes concretamente na vida dos indivíduos, grupos e comunidades.
Por fim, “the last but not the least”, as ECMs erram feio ao sugerir uma pretensa superioridade da vida e prática militar sobre a civil, dado que isso não tem lastro algum fora da vontade, do subjetivismo e da narrativa. Aliás, pela origem histórica “civismo” e “cidadania” não se opõem, se completam e se fortalecem na medida em que ambos são tratados de modo verdadeiro, não pela aparência e superficialidade das situações.
Defendemos a Escola que contemple e acolha a Democracia, a participação, a cidadania plena, o senso crítico, a autonomia, o protagonismo, o empoderamento, a inclusão, o comprometimento com as causas da Justiça, Igualdade e Bem-estar. Enfim, “a nossa escola não tem personagem, a nossa escola tem gente de verdade”, ela é sim cívica, ela é também cidadã.
Alex Saratt é Professor das redes públicas municipal e estadual em Taquara (RS), 1° vice-presidente estadual do Cpers, Secretário de Comunicação da CTB RS e Secretário Adjunto da CNTE
Paulo leonel
No caso de Taquara,mesmo tendo grande admiração pela pessoa da prefeita,penso que está sendo ingênua e tentando agradar ao vice prefeito.Sou próximo de sua familia e gostaria que ela mudasse de opinião para que eu não precise mudar minha opinião em relação á ela.
Cacau Nicolau
Parabéns pelo texto tão potente, o mesmo contribuiu muito nas minhas discussões dentro da escola. Jogou luz na cara dos conservadores.
André Beck
Parabéns… excelente reflexão. Observações pertinentes no sentido de trazer luz para uma discussão que ilumine as trevas nas quais se encontra a educação em nosso país. É preciso clareza a respeito dos reais motivos da criação das Escolas Cívico Militares.