
Descubra como a fome no Brasil é uma resposta política e social, revelando a luta contra a necropolítica no século XXI. E como o Brasil saiu do Mapa da Fome pela segunda vez
Por Diógenes Sandim
A narrativa do Brasil no século XXI não é linear; é um movimento de sístole e diástole histórica. A vitória eleitoral que trouxe de volta o retirante ao poder não é apenas uma alternância burocrática, mas uma resposta imunológica do organismo social contra a necropolítica que tentou reimplantar o destino “Severino” como norma.
A maior expressão dessa luta é a relação do país com o Mapa da Fome da ONU.
A Biologia do Amor como Política de Estado
Humberto Maturana nos ensina que o amor é o domínio comportamental onde o outro surge como legítimo. Na política, a fome é a negação absoluta dessa legitimidade. A fome é a mensagem do Estado dizendo ao indivíduo: “Sua existência não me importa; você não é um ‘outro’ legítimo para mim”.
O ato de retirar o Brasil do Mapa da Fome pela primeira vez (nos governos Lula/Dilma) foi o primeiro grande rompimento ontológico com a herança escravocrata. Pela primeira vez, a “nêsga de terra” e o “prato de comida” deixaram de ser favores da elite (clientelismo) para se tornarem direitos inalienáveis (cidadania).
Contudo, a interrupção democrática e a ascensão de governos reacionários ao progresso social representaram uma tentativa de involução ontológica. O retorno do Brasil ao Mapa da Fome não foi incompetência técnica; foi um projeto. Foi a reafirmação de uma cosmogonia excludente, onde a “sobra” humana deveria perecer. O “macunaíma” criativo foi sufocado, e o “severino” da morte foi ressuscitado.
A Segunda Redenção: A Resiliência do Sistema
É aqui que a vitória eleitoral recente e a segunda retirada do Brasil do Mapa da Fome ganham contornos épicos e filosóficos.
Se na primeira vez poderia ter parecido sorte ou apenas o “boom das commodities”, na segunda vez prova-se que é Método e Essência. Ao retornar ao poder e priorizar novamente o combate à fome, o líder transmutado demonstra que a Biologia do Amor é a única via possível para a sustentabilidade da nação.
A prática política aqui se torna uma auto organização curativa:
- O Reconhecimento: O Estado olha para o faminto e diz “Eu te vejo”.
- Acolhimento: O Estado reorganiza o orçamento (a energia do sistema) para garantir a homeostase (o equilíbrio) de todos os seus tecidos sociais.
- Complexidade: Entende-se que a economia não prospera em um cemitério. Seguindo Marx, resolve-se a base material (o estômago) para libertar a superestrutura (a criatividade, a arte, a ciência).
- Conclusão Terminativa: O Brasil do Futuro é Aquele que Come.
“Portanto, a trajetória deste líder — saindo da seca para a presidência, sendo preso e retornando para libertar o povo da fome novamente — encarna a vitória definitiva do Macunaíma Transmutado sobre o destino Severino.
A ‘malandragem’ suprema deste projeto político não está em enganar, mas em insistir na vida quando a morte era o projeto de poder vigente. Tirar o Brasil do Mapa da Fome pela segunda vez é a prova empírica da Biologia do Amor aplicada: é a institucionalização do afeto.
O Brasil deixa de ser o país do futuro abstrato de Stefan Zweig para ser o país do presente concreto. E neste presente, a exigência hegemônica é clara: não há pátria, não há ordem e não há progresso enquanto houver um prato vazio. A verdadeira revolução brasileira não foi feita com armas, mas com feijão e dignidade. O ‘ser macunaíma’ finalmente encontrou seu caráter: ele é, antes de tudo, um alimentador de esperanças e corpos.”
Diógenes Sandim Martins é médico, diretor do Sindnapi e secretário-geral do CMI/SP


























