
Chico Cesar, cantor e compositor brasileiro
A canção “Inumeráveis”, interpretada por Chico César e escrita a partir de um poema de Bráulio Bessa, é um tributo comovente às vítimas da pandemia de Covid-19 no Brasil. Mais do que uma enumeração de perdas, a letra nos lembra, com poesia e respeito, que cada pessoa que se foi tinha um nome, uma história, afetos, sonhos interrompidos.
Ao longo da música, Chico César canta vidas singulares: um professor querido, uma paratleta vencedora, uma avó que fazia sorvete de manga no quintal. Cada estrofe é um ato de memória, um esforço para romper a frieza dos dados estatísticos que desumanizaram o luto coletivo. Em vez de números, rostos e nomes. Em vez do silêncio imposto pela indiferença, a arte como denúncia e homenagem.
A repetição do verso “Se números frios não tocam a gente, espero que nomes consigam tocar” é um chamado à empatia em tempos de brutalização da vida. É também um grito contra o esquecimento. A música não deixa que essas histórias desapareçam no vácuo das planilhas oficiais. Ela devolve humanidade aos que partiram — e um espelho incômodo aos que ficaram.
Inumeráveis
(Composição: Chico Cesar, a partir de poema de Bráulio Bessa:/2020)
Intérprete: Chico Cesar
André Cavalcante era professor
amigo de todos e pai de Pedrinho
O Bruno Campelo seguiu se caminho
Tornou-se enfermeiro por puro amor
Já Carlos Antônio, era cobrador
Estava ansioso pra se aposentar
A Diva Thereza amava tocar
Seu belo piano de forma eloquente
Se números frios não tocam a gente
Espero que nomes consigam tocar
Elaine Cristina, grande paratleta
fez três faculdades e ganhou medalhas
Felipe Pedrosa vencia as batalhas
Dirigindo über em busca da meta
Gastão Dias Junior, pessoa discreta
na pediatria escolheu se doar
Horácia Coutinho e seu dom de cuidar
De cada amigo e de cada parente
Se números frios não tocam a gente
Espero que nomes consigam tocar
Iramar Carneiro, herói da estrada
foi caminhoneiro, ajudou o Brasil
Joana Maria, bisavó gentil.
E Katia Cilene uma mãe dedicada
Lenita Maria, era muito animada
baiana de escola de samba a sambar
Margarida Veras amava ensinar
era professora bondosa e presente.
Se números frios não tocam a gente
Espero que nomes consigam tocar
Norberto Eugênio era jogador
piloto, artista, multifuncional
Olinda Menezes amava o natal.
Pasqual Stefano dentista, pintor
Curtia cinema, mais um sonhador
Que na pandemia parou de sonhar
A vó da Camily não vai lhe abraçar
com Quitéria Melo não foi diferente
Se números frios não tocam a gente
Espero que nomes consigam tocar
Raimundo dos Santos, um homem guerreiro
O senhor dos rios, dos peixes também
Salvador José, baiano do bem
Bebia cerveja e era roqueiro
Terezinha Maia sorria ligeiro
cuidava das plantas, cuidava do lar
Vanessa dos Santos era luz solar
mulher colorida e irreverente
Se números frios não tocam a gente
Espero que nomes consigam tocar
Wilma Bassetti vó especial
pra netos e filhos fazia banquete
Yvonne Martins fazia um sorvete
Das mangas tiradas do pé no quintal
Zulmira de Sousa, esposa leal
falava com Deus, vivia a rezar.
O X da questão talvez seja amar
por isso não seja tão indiferente
Se números frios não tocam a gente
Espero que nomes consigam tocar
Fonte: Centro de Memória Sindical