
Adonis Guerra/SMABC
Por Miguel Torres e Ricardo Patah
O acordo firmado entre a Volkswagen e o Ministério Público Federal em São Paulo, no qual a empresa irá doar R$ 36 milhões para projetos referentes à defesa de direitos humanos e à história em troca do encerramento de três inquéritos civis que a acusa de participação e conivência com a repressão da ditadura militar, é uma vitória dos trabalhadores.
É certo que algumas reivindicações pleiteadas ao longo destes quase cinco anos de tramitação do acordo não foram contempladas. Mas sua conclusão é um inegável passo positivo que abrirá precedentes para que outras empresas assumam relações com o regime nocivas aos trabalhadores e para que se possa vislumbrar um novo tempo de revisionismo e ajustes históricos.
Esta é mais uma ação que, nestes tempos sombrios de violação dos direitos sociais, humanos e trabalhistas, confirma a importância da ação sindical. Isso porque o Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo foi o verdadeiro fiador do acordo, com sua capacidade de diálogo e de negociação entre as partes. Tanto que a assinatura se deu na sede do Sindicato, com aprovação em assembleia, corroborando a presença e o apoio da entidade em todo o processo.
Os inquéritos acerca das relações entre a Volks e a ditadura baseiam-se em pesquisas realizadas pela Comissão Nacional da Verdade. Segundo as informações levantadas, pelo menos seis trabalhadores foram presos e um foi torturado na montadora de São Bernardo entre 1969 e 1979.
Foi o caso do nosso companheiro Lúcio Bellentani, falecido em 2019. Bellentani, um dos sindicalistas mais engajados na luta por justiça e reparação, foi uma das vítimas desta parceria velada entre empresa e governo ditador.
Hoje, passados mais de trinta e cinco anos do fim do regime militar, a Volks é a primeira empresa estrangeira a aceitar um acordo com base no reconhecimento deste tipo de situação. Que seja a primeira de muitas! Segundo o jornal El País, a CNV apontou 53 empresas com tais práticas.
No atual momento político, de retirada de direitos, o acordo se torna ainda mais relevante. Ele é a prova do quanto os trabalhadores sofreram nas mãos do Estado ditador, sob as dependências de empresas privadas nos vinte anos após o golpe de 1964. O acordo celebrado entre a Volkswagen e o Ministério Público Federal em São Paulo é, neste sentido, um grande aprendizado para a sociedade e serve de alerta sobre o risco de regimes autoritários e repressivos.
Mais do que isso, mostra que ainda vale a pena lutar não apenas pelos direitos sociais e trabalhistas, mas também para que a verdade histórica seja revelada e reparada.
Miguel Torres é presidente da Força Sindical e presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo
Ricardo Patah é presidente da UGT e presidente do Sindicato dos Comerciários de São Paulo