Por Ernesto Londoño e Letícia Casado, do The New York Times
Em seus pouco mais de 100 dias no cargo, ele usou muito do seu capital político, com pouco progresso em questões cruciais para mostrar por isso. A impaciência dos brasileiros está crescendo.
O Presidente, um populista de direita, foi varrido para o cargo com um mandato expansivo por mudança, por eleitores fartos de notícias sobre corrupção política, violência e os duradouros efeitos de uma profunda recessão.
Mas o início de seu mandato foi agitado por guerras culturais, disputas entre facções que o apoiam (os militares, evangélicos e antiglobalistas) e desordem, com dois ministros despedidos. Seu partido também está sob investigação, em conexão com um possível esquema ilegal de financiamento de campanha, e um dos seus filhos, Flávio Bolsonaro, um Senador, está sob investigação por práticas corruptas.
Projetos de lei que poderiam ajudar a consertar as finanças do país e inspecionar o sistema de justiça criminal estão definhando no Congresso, onde o Presidente não foi capaz de construir alianças, e a economia continua a crepitar.
Suas maneiras impulsivas e briguentas – que o serviram bem na trilha da campanha – causaram consternação agora que ele é Presidente. Durante o Carnaval, ele causou um alvoroço quando postou um vídeo com sexo explícito no Twitter. Mais tarde ele invocou as forças armadas para comemorar o golpe de 1964, que começou um repressivo regime militar, que durou 21 anos.
Tudo isso o deixou com a classificação mais baixa de popularidade do que qualquer presidente nesse ponto de primeiro mandato, desde que a democracia foi restaurada, na metade dos anos de 1980, de acordo com uma pesquisa do Datafolha: trinta por cento dos pesquisados chamaram sua presidência de ruim ou terrível.
Kim Kataguiri, um deputado federal liberal, cuja influência do Movimento Brasil Livre apoiou a candidatura do senhor Bolsonaro entusiasticamente, já demonstrou desapontamento com a performance do presidente.
“Nós já estamos num período de estagnação,” ele disse. “Os mercados estão prevendo que o Brasil não vai ser capaz de cumprir suas obrigações, controlar seu débito público ou receber investimento.”
O porta-voz de Bolsonaro não respondeu a pedidos por entrevista para esse artigo, e o Vice-Presidente cancelou uma entrevista para discutir os primeiros cem dias da administração.
Muitos no Brasil – amigos e inimigos – acreditam que Bolsonaro foi seu próprio pior inimigo.
“Não é a oposição que está criando crises para eles,” Marcelo Freixo, um deputado federal de esquerda, disse da administração de Bolsonaro. “Eles estão criando suas próprias crises.”
Pegue a tentativa de Bolsonaro de se dirigir a um dos maiores desafios de sua presidência: reformar o falido sistema de aposentadorias, o qual os economistas veem como uma bomba de tique taque, que a nona maior economia do mundo deve desarmar para evitar uma crise.
Paulo Guedes, o ministro da economia de Bolsonaro, recentemente disse a legisladores que o Brasil gasta 10 vezes mais em pensões do que em educação, uma situação que equivale a “mandar um avião pelo oceano sem combustível.”
Bolsonaro levou crédito em por adiante um projeto de lei que podaria significantemente os generosos benefícios, que permitem a alguns brasileiros se aposentar antes de fazer 50 anos. Ele também quebrou com uma prática do passado que frequentemente dava combustível para a corrupção, na qual os presidentes distribuíam ministérios, cargos no governo de alta remuneração e discricionários fundos para partidos através do espectro político, para construir coalisões para passar projetos de lei no Congresso.
Mas, sem uma nova estratégia no lugar, Bolsonaro teve dificuldade até para manter os 58 legisladores do seu próprio partido na linha, colocando em questão sua habilidade para passar medidas politicamente impopulares na legislatura desobediente e multipartidária do Brasil, que conta com 594 representantes.
Audiências sobre mudanças nas pensões se desenvolveram em partidas gritantes, frustrando proponentes dentro e fora do governo, e levando até antigos aliados a falar sobre Bolsonaro com aberta desobediência.
Rodrigo Maia, o porta voz da Casa, havia inicialmente concordado em guiar a revisão das aposentadorias. Ele tem, desde então, lavado suas mãos em fazer o comando do governo, comparando sua posição com aquela de uma mulher agredida que já suportou abusos suficientes.
A perspectiva para o projeto de lei passar está ficando obscura. “Minha perspectiva para o futuro: nós não vamos aprovar a Reforma da Previdência, vamos cair numa recessão e o governo vai ser deixado em hemorragia,” Kataguiri, o deputado liberal, disse em uma entrevista. Altos funcionários do governo argumentaram em entrevistas que o tumultuoso relacionamento com o Congresso é um sinal de que o Brasil está passando por uma necessária, embora caótica, transformação sob a administração de Bolsonaro.
Carlos Alberto dos Santos Cruz, um general aposentado, que serve como secretário de governo de Bolsonaro, uma posição em nível de ministério, disse que o Congresso deve se adaptar a essa nova realidade.
“O Brasil não tinha um princípio chave de lidar com a democracia,” Santos Cruz disse em uma entrevista. “Por um longo tempo, nós vivemos sem poderes independentes, porque o Executivo estava comprando o Legislativo”.
Eduardo Bolsonaro, deputado federal e um dos filhos do presidente, disse que seu pai estava fazendo o bem em prometer em virar de cabeça para baixo um sistema político que fomentou a corrupção e o nepotismo, através das décadas. “Nós estamos quebrando um paradigma que sempre criou um Estado ineficiente, e às vezes autorizou a corrupção,” ele disse.
A desilusão no Congresso não impediu Bolsonaro de fazer bem em outra promessa de campanha, seu filho argumentou, citando o alinhamento mais de perto com os Estados Unidos, leilões de entidades pertencentes ao Estado e medidas para reduzir a burocracia, como sucessos do início. Bolsonaro também facilitou para os civis adquirirem armas, e para as indústrias terem maior acesso a áreas protegidas da Floresta Amazônica.
Sérgio Moro, um ex-juiz federal que serve como Ministro da Justiça, disse em uma entrevista que o governo deu passos largos para lutar contra a epidemia de violência no país – uma das principais promessas de campanha de Bolsonaro.
Moro apresentou ao Congresso uma proposta de revisão do Código Criminal, que inclui medidas anticorrupção mais fortes. E o Estado começou a transferir altos traficantes de drogas de prisões com segurança frouxa, para instalações onde eles não podem mais liderar seus negócios por trás das grades.
Ainda assim, essas medidas frequentemente são ofuscadas por lutas internas, intrigas e declarações controversas pelos altos membros da administração.
Talvez ninguém fez mais para colocar combustível no tumulto do que Olavo de Carvalho, um escritor brasileiro conservador, que vende de lugar a lugar comentários políticos e teorias da conspiração, enviando vídeos e tweets de sua casa na Virgínia. Bolsonaro creditou a Carvalho impulsionar “a revolução” que o trouxe a presidência, quando se sentou ao lado dele em recente jantar em Washington.
Mas a alta consideração de Bolsonaro por Carvalho não é universalmente compartilhada na administração – em grande parte por causa das visões não convencionais de Carvalho.
Carvalho clamou que a Pepsi é adoçada com as células de fetos de abortos; que legalizar o casamento do mesmo sexo leva a legalizar a pedofilia; e que desastres naturais calamitosos, como o furacão Katrina e o terremoto de 2011 no Haiti, podem ser punições divinas por praticar tradições religiosas africanas.
Dois dos ministros que se juntaram ao governo por sugestão de Carvalho geraram controvérsias similares, as quais críticos dentro do governo veem como autodestrutivo.
Logo depois de pegar o cargo como Ministro da Educação, Ricardo Vélez, um pouco conhecido acadêmico ultraconservador, disse em uma entrevista em um semanário, que brasileiros que viajam para o exterior se comportam como “canibais”, que roubam coisas de hotéis e coletes salva-vidas de aviões.
Ele também entrou sob fogo por mandar uma carta para as escolas exigindo que os estudantes lessem um grito de guerra político de Bolsonaro, depois de cantar o hino nacional. Ele foi despedido depois.
Outro discípulo de Carvalho, o Ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, também foi criticado, por dizer que o Nazismo foi um movimento de esquerda – uma reivindicação que Bolsonaro repetiu, quando visitou o Museu do Holocausto, em Israel, recentemente. O website do museu diz que o Partido Nazista foi um desenvolvimento de “grupos radicais de direita.” (Bolsonaro disse que “nós podemos perdoar, mas não podemos esquecer” o Holocausto, despertando mais controvérsias.)
Carvalho pegou como alvo os oito ex-generais no gabinete de Bolsonaro, incluindo o Vice-Presidente Hamilton Mourão, chamando-os de inimigos dentro do Estado.
Os ex-generais, enquanto isso, buscaram ficar acima da briga e chegaram a ser considerados como moderados, estabilizando a força em um time incontrolável.
Augusto Heleno Ribeiro, um ex-general que supervisiona as políticas de segurança no gabinete, diz que a reputação é bem merecida. “Nosso estilo é sermos conciliatórios, não incendiários,” ele disse em uma entrevista. “Isso porque nós conhecemos muito bem os perigos do extremismo.”
Fonte: The New York Times
Tradução: Luciana Cristina Ruy
Uma versão desse artigo aparece impressa em 15 de abril de 2019, na página A10 da edição de Nova York, com a manchete: “Bolsonaro, um ‘soldado’ combativo, sai para um começo turbulento no Brasil.” Order Reprints – Today’s Paper – Subscribe
rita de cassia vianna gava
Ele está governando para quem votou nele esqueceu que é presidente tá governando para 20% da população atualmente é que podem ser os 20% que vão sobrevive