PUBLICADO EM 30 de ago de 2021
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A oposição não deve aceitar a agenda de Bolsonaro; opinião de Gilberto Maringoni

Por Gilberto Maringoni

Bolsonaro está criando um clima de terror para o 7 de setembro. Mobiliza suas bases, recomenda a compra de fuzis e insufla de forma nada velada as Polícias Militares estaduais a tomarem posição por um motim generalizado. Membros dessas corporações repercutem em suas redes a ideia de que ali começa o enfrentamento armado com o STF e o Congresso.

Ou seja, diante do isolamento crescente e – tudo indica – irreversível, Bolsonaro busca dar a volta por cima tentando embaralhar novamente a agenda nacional.

Disputa de agenda – ou agenda setting – é um termo criado por dois pesquisadores da área de Comunicação, nos Estados Unidos, Maxwell McCombs e Donald Shaw. Ao analisarem a campanha vitoriosa do republicano Richard Nixon, em 1968, eles perceberam que mais importante do que convencer o eleitor de uma ideia era arrastar o debate para um terreno favorável a uma das partes. A disputa se tornaria muito mais eficiente com esse deslocamento.

Bolsonaro – provavelmente instruído pelos bate-paus de Steve Bannon nas redes – age exatamente assim. Diante da hecatombe social e econômica e da derrota quase certa ano que vem, ele literalmente muda de assunto. Ao fazer isso, busca definir as prioridades do país.

Assim, a morte de 570 mil brasileiros, a majoração de 50% em um ano nos preços médios da carne, do arroz e do feijão, o botijão de gás a R$ 130, a gasolina a R$ 7, o fato de mais de 30 milhões de brasileiros estarem sem emprego, a fome e a fila do osso se alastrarem são coisas corriqueiras. O que atrapalha a vida é a falta de voto impresso, a CPI do genocídio e a suprema corte. Esse é o tabuleiro de disputa que busca impor. Entrar nessa vibe pode ser fatal aos setores progressistas e democráticos.

A agenda bolsonarista é alardeada como “demonstração de força” a ser exibida no Dia da Pátria, em tom de desafio. Aceitar esse pretenso repto não significa assumir a ofensiva diante de Bolsonaro, mas se render à sua agenda. Significa aceitar seus termos e o seu terreno de combate. Subordinar-se à lógica do inimigo, qualquer manual bélico ensina, coloca de saída o oponente em desvantagem.

Bolsonaro lotará ruas e praças de São Paulo e Brasília? Não se sabe. Pode ser. Tem grana, tem caneta e conta com a escória do agronegócio, pastores picaretas e o lumpesinato do grande capital para isso. Pode dar certo, como pode dar chabú. Ele montará ali sua provocação armada, sequioso de sangue e caos. Ou seja, o cenário ideal para embaralhar o jogo democrático.

Se as principais organizações, partidos, agrupamentos e entidades de oposição mantiverem seus protestos no mesmo dia em que o genocida planeja sua mazorca, o preço pode ser alto. Não se trata de demonstrar medo do enfrentamento e bater em retirada. Trata-se de evitar servir de alvo fácil aos assassinos que arregimenta e tentar passar à ofensiva, com a pauta que importa às maiorias.

É algo fácil de se fazer? Claro que não. Demanda ousadia e capacidade de negociação com a miríade de organizações que – de forma competente e solidária – faz um exemplar trabalho de base para resistir à situação terrível em que nos encontramos. Não se trata de abandonar as ruas, mas seu oposto. Fazer um recuo para avançar e conquistar os espaços públicos de forma consistente, nos dias seguintes. Significa não dar ao miliciano o que ele quer e desinflar o sentido de sua ação.

Bolsonaro é um mau militar. Não conhece tática e estratégia. Assim agem também os desocupados fantasiados de generais que compõem sua pandilha. Não avança, provoca. Não conquista terreno, grita e faz espalhafato para ocultar o beco em que se meteu.

A decisão de recuar no dia 7 deve ser uma operação casada com o planejamento de fortes mobilizações logo em seguida.

Gilberto Maringoni de Oliveira é um jornalista, cartunista e professor universitário brasileiro.

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